Seminário Menor, sem esclarecer se investigou denúncias, nega alegações de maus-tratos

Jornalistas não puderam fazer perguntas na conferência de imprensa organizada pelo Seminário Menor/Foto: Diligente

No seu discurso, o reitor da instituição considera acusações como “fictícias” e não comenta ameaças feitas por padres aos jornalistas do Diligente.

O Seminário Menor Nossa Senhora de Fátima (SENOFA), em Balide, Díli, nega os casos de maus-tratos levantados por ex-seminaristas da instituição e divulgados pelo Diligente, na reportagem publicada no dia 11 de junho. Nesta quinta-feira (22/06), em conferência de imprensa na sede do SENOFA, o reitor, o padre Natalino da Costa Soares, considerou as denúncias “falsas”, sem, no entanto, esclarecer se houve ou não uma investigação interna para averiguar as alegações. Acusou ainda o Diligente de espalhar “informações difamatórias sobre a Igreja Católica em Timor-Leste”.

No evento, os jornalistas não puderam fazer quaisquer perguntas ao reitor, que se retirou do recinto logo depois de terminar a leitura do “direito de resposta”. A instituição também não fez qualquer menção às ameaças – algumas de morte – proferidas por padres e ex-seminaristas à equipa do Diligente, alvo, nos últimos dias, de comentários ofensivos nas redes sociais.

O reitor, que se negara antes, de forma ríspida, a conversar com o Diligente sobre as alegações dos ex-seminaristas, afirmou que lhe foi feito um “pedido de entrevista genérica”.

Porém, o Diligente, no dia 27 de março, entregou uma carta no Seminário Menor, recebida pelo próprio reitor, em que constava uma solicitação de entrevista sobre “o dia a dia dos seminaristas”. No dia seguinte, os jornalistas voltaram ao local para tentar entrevistar o padre Natalino, mas o mesmo não estava presente. A 1 de junho, dez dias antes da publicação da reportagem e ainda sem resposta às solicitações, o Diligente ligou para o reitor, reforçando que gostaria de ouvir o sacerdote sobre o conteúdo de que ele já tinha conhecimento. Aos jornalistas, o padre respondeu de forma rude.

“Não tenho tempo para vocês do Diligente. Da parte do seminário, eu tenho direito de querer ou não falar”. Informado de que a publicação teria assim de ser feita sem o contraditório a que o Seminário Menor tem direito, respondeu: “Os jornalistas não podem ser estúpidos e sem ética, quando não têm licença para publicar. Eu tenho o direito de dizer que não”.

O reitor, na leitura do direito de resposta, relatou que o SENOFA deveria ter um prazo mínimo de 24 horas para responder, no entanto teve mais de dois meses para apresentar a versão da instituição e não o fez. O sacerdote, além de se negar a falar com os jornalistas, tratou-os de forma desrespeitosa.

No documento, entregue à imprensa na conferência, o reitor também acusa o Diligente de produzir informações inverídicas por, segundo ele, ter divulgado um artigo no dia 26 de março mencionando que a Conferência Episcopal Timorense (CET) “não apresenta contas dos gastos ligados à subvenção do Governo”.

A notícia, na ocasião, destacou que neste ano foram alocados 15 milhões do Orçamento Geral do Estado (OGE) para a CET, quantia superior aos 13,5 milhões atribuídos ao Hospital Nacional Guido Valadares (HNGV), de acordo com dados do Portal de Transparência do Orçamento de Timor-Leste.

O Diligente, a 24 março, solicitou ao secretário-executivo da CET e atual Bispo de Baucau, Leandro Maria Alves, acesso ao relatório, mas não teve retorno. Já a 27 de março, o Diligente encontrou-se com o representante do Vaticano em Timor-Leste, o monsenhor Marco Sprizzi, que informou, na altura, que pediria ao padre Leandro para enviar o material a este órgão de comunicação social – o que não aconteceu até à presente data.

A 16 de junho, os jornalistas, através de uma carta formal, reforçaram, junto da CET, o pedido de acesso ao relatório, não tendo obtido resposta até hoje.

Na conferência de imprensa, o reitor afirmou também que as informações divulgadas pelo Diligente na reportagem de 11 de junho são “fictícias, uma vez que não indicam quaisquer fontes de informação”. No material jornalístico em questão, os três ex-seminaristas que contam detalhadamente uma série de violações aos direitos humanos sofridas no Seminário Menor têm a identidade preservada, por receio de represálias.

O sigilo da fonte é garantido aos jornalistas pela Lei n.º 5/2014 (Lei da Comunicação Social de Timor-Leste), que, no seu artigo 19.º prevê: “O jornalista tem o direito ao sigilo profissional, não podendo ser obrigado a revelar as suas fontes de informação, excetuando quando assim ordenado pelo tribunal, nos termos da lei processual penal”.

Na descrição da lei, também consta que a legislação, “a primeira de Timor-Leste, livre e independente, sobre a defesa da liberdade de imprensa e a regulação dos media, (…) permite ao profissional de informação a garantia do sigilo profissional e a salvaguardar da sua independência”.

Ex-seminarista do SENOFA identifica-se e confirma maus-tratos

No seguimento da conferência, o ex-seminarista Salvador da Costa Pinto, 34 anos, que frequentou o SENOFA entre 2005 e 2008, diz ter, no período, presenciado casos de agressões físicas (murros, pontapés e bofetadas) por parte da equipa formadora contra os colegas – “feridos até sangrar”.

Salvador lamenta que a instituição “não tenha admitido que atos de violência são reais na formação”.

“Os responsáveis do SENOFA deveriam ter pedido desculpas às vítimas e tomado providências para melhorar o funcionamento da instituição. Isso é necessário, se Timor-Leste quiser ter bons sacerdotes, intelectual e emocionalmente”.

Para o jovem, negar os acontecimentos é uma forma de perpetuar a violência, pois, caso os problemas não sejam encarados de maneira honesta, mais pessoas poderão vir a ser vítimas de maus-tratos. “Não admitir a verdade pode pôr em causa a credibilidade dos padres e seminaristas”, observou.

Salvador condenou ainda as ameaças proferidas por padres, seminaristas e ex-seminaristas contra a equipa do Diligente nas redes sociais, considerando-as “anómalas”.

O Diligente ressalta que não tem qualquer interesse em prejudicar a imagem da Igreja Católica de Timor-Leste, instituição que, durante a ocupação indonésia, esteve sempre ao lado do povo timorense, prestando assistência e serviços essenciais e denunciando todas as violações cometidas contra a população.

A equipa do Diligente reconhece a importância da Igreja para o país e enfatiza que atua de forma profissional, divulgando assuntos de interesse público com responsabilidade e em conformidade com os códigos da profissão de jornalista.

Ver os comentários para o artigo

  1. Aqui uma das vítimas que os formadores devem conhecer:
    O ex-seminarista Salvador da Costa Pinto de 34 anos,
    Frequentou a SENOFA entre 2005 e 2008.

    O que tem para dizer?

  2. O Seminário podia dizer que a instituição ia investigar as denúncias. Era o mínimo que podia fazer. Mas não. O reitor preferiu negar e atacar o Diligente, com aqueles adolescentes atrás. Aquela imagem dos jovens atrás do reitor entristece. Quem são estas pessoas que formam jovens? Que valores transmitem? Que formação de carácter é esta?
    Diligente, muitos parabéns! É a primeira vez que se faz jornalismo a sério em TL. Com a vossa coragem, ganharam a admiração de muita gente. A Igreja não tem qualquer hipótese em Tribunal e vai sujar ainda mais a sua imagem.
    A luta pela verdade, liberdade, direitos humanos e um país melhor continua!

  3. Forsa Diligente! Eu admira a corajem. O seminario continua fingir. Porque não reconhece erros e tenta mudar? Mentir não pode. O amo não pode mentir. Os catolicos de Timor questionam este atitude.

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