Habitantes lamentam a ausência de políticas públicas para reaproveitar o bem essencial nos vales. As autoridades prometem concluir no próximo ano a construção de infraestruturas nos sucos para garantir o abastecimento.
A comunidade do posto administrativo Letefoho, em Ermera, enfrenta uma crise de falta de água há mais de 15 anos. O problema, agravado no período da seca, tem um impacto direto na vida de milhares de pessoas daquela área. A inexistência de infraestruturas adequadas e a ausência de políticas públicas eficazes obrigam a população a aceder a fontes inseguras do bem essencial.
Lúcia de Deus Maia, 40 anos, residente em Letefoho Vila, descreveu a dificuldade de acesso à água durante a estação seca, principalmente de junho a setembro.
“Infelizmente a nossa preocupação é em encontrar água. Se é ou não segura, é algo secundário. Todos os dias, das 5h às 7h e das 16h às 20h, as pessoas vêm buscar água a esta fonte, chamada Sarbore, que fica a 100 metros da minha casa. Muita gente, no entanto, tem de caminhar grandes distâncias. Eu costumo vir às 11h, quando está mais vazia. Lidamos com esta situação há muitos anos. Precisamos de um sistema que seja capaz de distribuir água limpa para todos”, afirmou.
A moradora informou ainda que, de manhã e à tarde, os seus filhos também vão buscar água, levando perto de 20 garrafões de cinco litros numa carroça.
O mesmo problema afeta a população do suco de Ducurai. Paulo de Deus, 60 anos, habitante da aldeia Sabelo, partilhou que, na região, os moradores não têm água em casa e têm de ir a um pequeno rio, nas proximidades, para usufruir desse bem essencial.
“Algumas pessoas aproveitam para lavar a roupa na parte de cima, enquanto que outras buscam água em baixo e levam-na para casa, para cozinhar e beber. É muito arriscado para a nossa saúde. Sabemos de gente que já teve diarreia, ou foi contaminada por bactérias, como a salmonela. Infelizmente é o que temos à disposição. Ou é isso ou viver sem água”, lamenta Paulo de Deus.
A escassez do bem essencial também prejudica os negócios do café, a principal fonte de rendimento da população de Ermera. Como não é possível lavar os grãos com facilidade, uma das etapas do processo para a venda de café de alta qualidade, comercializado a um preço superior (3,50 dólares americanos por quilograma), o produto acaba por ser vendido por um valor muito menor.
O produtor Jovito de Deus, 29 anos, explica porque é que perde dinheiro entre junho e setembro: “para vender o café a 3,50 dólares por quilograma, primeiro, temos de selecionar os melhores grãos e depois precisamos de remover a casca vermelha numa máquina. Posteriormente, temos de os limpar [os grãos]. Nesta época do ano, levamos 20 quilos de café ao ombro ao longo de quase 200 metros, para o lavar na nascente, depois trazemo-lo de volta. E assim sucessivamente. Como não conseguimos dar resposta a toda a demanda, acabamos por vender o café a outra companhia, que o compra com a casca vermelha, mas a um preço muito baixo: 50 centavos por quilo”, contou o empresário.
A falta de infraestruturas para tratamento e distribuição de água na região é um problema que o administrador do posto administrativo de Letefoho, Vicente Maria de Deus, espera resolver a partir do próximo ano. “O IX Governo, através do Programa Nacional do Desenvolvimento do Suco, incluiu este problema nas suas prioridades. Já usamos bombas para levar água aos habitantes de algumas aldeias, como Duhoho, que vivem no alto das montanhas, já que as fontes de água estão em baixo”, informou.
Segundo o administrador, em 57 das 67 aldeias de Letefoho já há obras de abastecimento de água em andamento. “Esperamos concluir os trabalhos até 2025. Anteriormente, a má gestão e os interesses políticos atrasaram o processo. No meu mandato, trabalhamos com o Programa e com a Eletricidade de Timor-Leste (EDTL), de modo a garantir água e eletricidade para todos”, argumentou.
Uma das causas para algumas comunidades não terem água, conforme Angelino da Silva de Deus, técnico de apoio do Serviço Municipal de Água, Saneamento e Ambiente (SMASA), em Ermera, é a falta de consciência da comunidade. “Algumas pessoas querem aproveitar-se da água disponibilizada e acabam por danificar as instalações. Por isso, é necessário sensibilizar os cidadãos, para que cuidem das estruturas e evitem atitudes egoístas, de quererem ficar com a água apenas para si e ignorarem as necessidades dos outros”, observou.
Atualmente, Letefoho tem 28.568 habitantes. De acordo com os dados da SMASA, em Ermera, cerca de 2.452 chefes de família, em quatro sucos, dependem das fontes ou de riachos nos vales para aceder a água.
Dados do censo de 2022 revelam que, em Timor-Leste, mais da metade das famílias ainda recorre às fontes desprotegidas ou desconhecidas e depende da proximidade de ribeiros e lagos para terem acesso ao bem essencial.
Os politicos “metem tanta agua”, deveria haver agua com fartura.