Presidente mantém indultos, mesmo depois de declaração de inconstitucionalidade pelo Tribunal

Presidente informou que não recebeu qualquer notificação do Tribunal de Recurso, apesar de a decisão judicial envolver questões relacionadas com a sua função enquanto chefe de Estado/Foto: Presidência da República

Em comunicado, Ramos-Horta desconfia da decisão do Tribunal de Recurso, diz-se “desiludido” e sugere que o Parlamento Nacional faça eventuais correções à Lei nº 20/2023.

O presidente da República, José Ramos-Horta, não considera revogar a sua decisão de, no final de 2023, ter concedido indulto a duas ex-governantes condenadas por participação económica em negócio, mesmo depois de o Tribunal de Recurso (TR), em determinação judicial na última segunda-feira (19.02), declarar as normas que fundamentaram a medida como inconstitucionais. Como a sentença não tem efeitos retroativos, cabe apenas ao chefe de Estado uma possível revisão ao benefício dado a Emília Pires e Madalena Hanjam – o que não é mencionado no comunicado divulgado por Ramos-Horta à imprensa na sexta-feira (23.02).

No documento, o presidente lança desconfianças sobre a decisão do TR e avalia que é papel dos deputados reformar a Lei nº 20/2023 (sobre Procedimento de Concessão do Indulto e Comutação de Pena). “Embora existam sérias dúvidas sobre o raciocínio jurídico do Tribunal – dúvidas que suscitam preocupações quanto à legitimidade da decisão e à administração da justiça – cabe agora ao Parlamento corrigir a Lei como entender”, sublinha.

O chefe de Estado cita, no comunicado, que a aprovação da referida legislação no ano passado pretendia corrigir distorções de uma outra lei, de 2016, que “restringia inconstitucionalmente” os poderes exclusivos do presidente para conceder perdões.

Ramos-Horta informa que tomou conhecimento da sentença do TR através da imprensa e que não recebeu qualquer notificação da instituição, apesar de a decisão judicial envolver questões relacionadas com a sua função enquanto presidente. O chefe de Estado, no documento, destaca que “ficou desiludido com o facto de o Tribunal não lhe ter dado, em momento algum, conhecimento do processo e oportunidade de apresentar observações sobre as suas competências exclusivas ao abrigo da Constituição”.

Assinada por um plenário de juízes composto por Deolindo dos Santos (presidente), Duarte Tilman Soares (relator), Jacinta Correia da Costa e António José Fonseca de Jesus, a determinação judicial classifica como inconstitucionais as normas contidas no artigo 6º; nos números 1, 4 e 5 do artigo 7º e no número 1 do artigo 9º da Lei nº 20/2023.

O artigo 6º permite iniciar “oficiosamente” o processo de concessão do indulto, por decisão do chefe de Estado ou por requerimento dos interessados. De acordo com o TR, isto “confere ao Presidente da República margem de manobra suficiente para, por sua exclusiva vontade, modificar a ‘esfera de eficácia’ das sentenças judiciais condenatórias”.

Já o artigo 7º estipula que quando o presidente quiser dar um indulto, ele é que inicia o processo, dirige a si próprio o requerimento e autua o despacho. Enquanto que no artigo 9º consta que com ou sem ouvir o Governo, o presidente da República pode tomar a sua decisão.

O TR avalia que as normas violam o artigo 85º da Constituição da República Democrática de Timor-Leste (CRDTL), que condicionam ao chefe de Estado o poder de indultar e comutar penas “ouvido o Governo” – ou seja, após uma audição ao Governo, antes de as decisões serem tomadas.

“O indulto é um ato ilimitado, mas não significa um poder caprichoso ou arbitrário”, lê-se no acórdão judicial”. Por isso, o Tribunal declarou que os artigos em questão “não só não têm suporte do artigo 85º da CRDTL, mas também contrariam o artigo 69º da CRDTL que defende a separação e interdependência de poderes”.

O benefício concedido por Ramos-Horta a Emília Pires e Madalena Hanjam aconteceu em dezembro, dois dias após o Parlamento Nacional aprovar a Lei nº 20/2023.

Repercussão política e jurídica

A decisão do TR teve como base uma ação movida pela FRETILIN e pelo Partido Libertação Popular (PLP), que contestou os benefícios concedidos por Ramos-Horta no final do ano passado. Para a bancada da FRETILIN, a sentença representa uma “vitória do povo e do Estado para travar as más intenções dos líderes que põem em perigo o sistema judiciário timorense, alterando a lei para proveito próprio”, consta num comunicado divulgado esta semana.

Já a presidente do Parlamento Nacional, Maria Fernanda Lay, do CNRT, informou que ainda vai verificar os artigos que o TR declarou inconstitucionais e que, “se for verdade que contrariam a Constituição, o Parlamento Nacional vai alterar a lei”.

O jurista Armindo Moniz Amaral lamentou que não foi tenha sido feita uma fiscalização a toda a legislação e à decisão do indulto concedido pelo chefe de Estado, e teceu críticas aos autores da ação no TR.

“Os requerentes da fiscalização abstrata não querem realmente acabar com a máquina de lavagem de crimes, porque não pediram a reintegração de critérios, o que é a atual preocupação pública”, enfatizou.

Para Armindo Amaral, “a felicidade que os requerentes de fiscalização abstrata ofereceram ao povo é uma ilusão”, porque qualquer pessoa pode receber indulto, independentemente do crime cometido e se cumpriu ou não a pena. Destacou ainda a falta de transparência da ação dos partidos no TR, que limitou a participação pública, neste caso, da sociedade civil, que poderia ter contribuído com ideias para a elaboração do requerimento.

Por sua vez, o jurista Júlio Crispim considera que a Lei nº 20/2023 é “uma lei simplificada e legalmente incompleta”, referindo-se ao facto de terem sido retirados os critérios que regulam o processo de concessão do indulto. Questionou ainda o porquê de não ter sido feita uma fiscalização preventiva por parte do Presidente da República, que “tinha 30 dias para estudar a Lei antes de ser promulgada”.

Para o jurista, com a promulgação sem uma fiscalização preventiva, a legislação que deveria ser do Estado tornou-se numa “lei de natureza individual, neste caso, para dar o indulto a alguém que o líder queira”, uma vez que até a iniciativa do processo de concessão do indulto tinha de vir do presidente. “Nesta particular situação, o presidente Ramos-Horta falhou por não ter sentido de Estado para com a nação e para com o povo”, concluiu Júlio Crispim.

Array

Ver os comentários para o artigo

  1. Rdtl precisa urgente peritos constituicao/lei inan, atu bele interpreta lolos lei inan/constituicao; selae TR bele interpreta tuir sira nia gosto, i fo prejuizo ba Governo constitucional;

  2. 12 Milhoes!

    Para mal dos nossos botoes
    Saneamento dos coiloes
    Crescimento dos anoes
    Higiene dos borroes
    Pieguices e contradicoes
    Ma lingua dos cagoes
    Rosinhas dos limoes
    Utilizadores de formoes
    Aguias e leoes
    Choramingas e mamoes
    Para todos os peoes
    12 milhoes sao apenas uns tostoes
    Para a maior das religioes
    Contra os canhoes, contra os canhoes
    Mataborroes, mataborroes

    Ze Luis Vais de Camioes
    Poeta de TL

Comente ou sugira uma correção

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

Open chat
Precisa de ajuda?
Olá 👋
Podemos ajudar?