Paulo Cafôfo: “Comunidade portuguesa em Timor-Leste tem um papel fundamental na luta pela construção da dignidade do povo timorense”

Paulo Cafôfo, Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas/ Foto: Diligente

O Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, Paulo Cafôfo, visitou esta semana Timor-Leste, no âmbito da sua primeira deslocação junto das comunidades portuguesas e lusodescendentes na Austrália e em Timor-Leste.  A deslocação de três dias integra um conjunto de iniciativas com a diáspora sob o tema: ‘Portugal no Mundo: Caminhos para a Valorização das Comunidades Portuguesas’.

Ao longo da visita, teve um encontro com o Vice-ministro dos Negócios Estrangeiros e Cooperação, Julião da Silva, e com o Presidente da República, José Ramos-Horta. Visitou o Centro de Aprendizagem e Formação Escolar (CAFE) em Liquiçá e encontrou-se com a comunidade portuguesa e luso-timorense, na Fundação Oriente, em Díli.

No último dia da sua visita, em entrevista ao Diligente, depois de visitar o Arquivo e Museu da Resistência timorense, destacou a importância da comunidade portuguesa em Timor-Leste na educação. Fez um balanço positivo da curta visita a Timor-Leste e espera poder voltar.

Esta é a sua primeira deslocação à Austrália e a Timor-Leste. Qual a razão para se realizar agora?

Visitei a comunidade portuguesa que reside na Austrália, uma comunidade vasta e que está muito bem enraizada e que, apesar disso, continua ligada a Portugal. Nesta visita a esta parte do mundo, não podia deixar de vir a Timor-Leste. Portugal e Timor têm um passado comum, mas, no presente, o povo timorense também tem uma forte ligação de amizade com o povo português. Esta amizade continua a ser construída para o futuro. Tive oportunidade, nesta minha visita, de cumprir alguns objetivos.

Quais foram os objetivos da visita a Timor-Leste?

O primeiro objetivo era o de verificar que Portugal acaba por ter um papel importante e determinante para as opções do Estado timorense, porque são os timorenses que definem o seu futuro, mas Portugal, como país amigo, acompanha esse futuro. Estamos lado a lado, seguindo as pisadas que o povo timorense escolheu para construir o país. E aqui, no Museu da Resistência, está bem patente a memória de um povo, de uma luta pela sua independência, mas esta luta continua pelo desenvolvimento de Timor-Leste. Portugal tem um papel importante a desempenhar. Tive oportunidade de visitar uma escola em Liquiçá, do projeto CAFE, que é muito importante, porque temos mais de 10 mil alunos nestas escolas, onde professores portugueses e timorenses desempenham um papel fundamental nessa luta pelo desenvolvimento timorense, que é a luta pela qualificação, pela formação, porque o futuro está nos jovens qualificados, bem formados e profissionais. Só assim, a luta dos homens e mulheres, durante o período de resistência, faz sentido.
Além da questão da educação, que é o ponto fundamental desta nossa participação e cooperação com Timor, temos também ajudado a construir a dignidade do povo timorense. É uma construção da dignidade na educação, na segurança social e na justiça. São matérias que foram abordadas no encontro com o presidente Ramos-Horta, em que tivemos oportunidade de partilhar este desejo de fortalecer as relações entre Portugal e Timor-Leste. E esse reforço faz-se com base na língua portuguesa, com base nos projetos de cooperação, de modo a que o futuro de Timor possa ser auspicioso e risonho. A minha mensagem aqui é reforçar o empenho de Portugal em acompanhar as estratégias e opções de desenvolvimento de Timor-Leste.

A comunidade portuguesa em Timor-Leste transmitiu-lhe alguma preocupação, dificuldade?

A comunidade portuguesa aqui é uma comunidade importante. Ontem, tive oportunidade de ter um encontro com diversos elementos da comunidade portuguesa. Temos pessoas que têm negócios e empresas aqui em Timor-Leste, mas temos também uma forte componente na administração do Estado timorense. Essa comunidade colabora para poder ser parte ser parte integrante deste desenvolvimento. São pessoas que estão aqui e que gostam muito deste país. Estão aqui numa missão feita com sentimento e já fazem parte de Timor-Leste.
Esta comunidade portuguesa não tem problemas. Felizmente, está perfeitamente integrada na sociedade timorense. A única preocupação é podermos ter capacidade de, em Portugal, dar a conhecer não só o esforço que Timor faz para o desenvolvimento que está a encetar mas também o contributo da comunidade portuguesa para esse desenvolvimento.

No fim desta visita, o que destaca do trabalho da comunidade portuguesa em Timor-Leste?

Destaco um grande empenho. São pessoas de trabalho, pessoas que têm objetivos muito concretos. É um orgulho poder ver que, neste país, com o qual temos uma relação histórica, a comunidade portuguesa continua a fazer com que Portugal e Timor tenham relações muito próximas.

“A educação nunca é despesa. Investir na educação é investir no futuro”

Enquanto professor, e daquilo que teve oportunidade de conhecer de TL, como avalia o sistema de ensino timorense e a presença da língua portuguesa?

Não sou avaliador nem inspetor do ensino, mas avalio de forma muito positiva. Como professor, senti uma emoção muito grande ao visitar a escola dos CAFE em Liquiçá, porque assisti ao trabalho feito pela comunidade educativa, pelos professores, pela coordenação da escola, tanto da parte portuguesa como da timorense. É um projeto em que Portugal participa, mas que é definido pelas autoridades timorenses. Foi uma emoção muito grande. É um projeto de sucesso e deve ser estendido a mais escolas, a mais municípios, porque a avaliação é claramente positiva. Estamos a qualificar jovens e crianças para que, no futuro, contribuam para uma economia robusta e possam ter empregos bem remunerados e uma vida digna, como merecem e como este país também merece.

Visitou mais alguma escola CAFE?

O tempo é curto e não podia visitar todas as escolas. Têm vindo aqui outros membros do Governo português e aquela escola, não tendo sido visitada, achei que a deveria visitar. Mas nós não olhamos só para uma escola. Aquela escola serviu para realçar o papel do ensino e da educação dos CAFE, que é extensível a diversas escolas e a diversos municípios. Foi importante ir àquela escola para realçar todo o trabalho que é feito na globalidade. Foi emocionante ver que aquelas crianças e jovens, devido ao empenho de Timor e com a colaboração de Portugal, vão ter futuro.

“Há oportunidades de emprego e de negócios. Saber a língua pode abrir portas para que essas oportunidades aconteçam”

Como vê o desenvolvimento da língua portuguesa em Timor-Leste?

Há uma evolução muito grande da língua portuguesa. Investir na educação é investir no futuro, nos jovens. E digo investimento, porque a educação nunca é despesa. A verdade é que encontramos, cada vez mais, na população, um maior número de pessoas que fala fluentemente português e isso é muito importante. O português acaba por ser um fator de reforço desta nossa ligação com Timor, dentro do espaço dos países de língua oficial portuguesa.

Qual a importância do trabalho dos professores em Timor-Leste?

O trabalho dos professores é decisivo. Eu vi professores que trabalham imenso, que se dedicam ao ensino mais do que a uma profissão, para quem o ensino é uma missão, que vai para além das ou do tempo em que estão na sala de aula. Eles são determinantes, porque, sem eles, não é possível os alunos terem sucesso na aprendizagem, mesmo que o ensino tenha uma arquitetura e uma conceção que me parece correta.

Qual é o papel da secretaria de Estado para a divulgação da língua portuguesa em Timor-Leste?

A Secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas tem, no contexto do Governo, uma responsabilidade, que se associa, neste caso, ao Ministério da Educação em Portugal. O ensino da língua portuguesa, obviamente através do Instituto Camões, é fundamental, porque o português é uma língua global, falada por 260 milhões de pessoas, está no top 5 das línguas mais faladas no mundo, o que representa uma vantagem para os timorenses e para o espaço da lusofonia como língua de cultura, mas também como língua de negócios. Nestes espaços onde se fala português, há oportunidades de emprego e de negócios. Saber a língua pode abrir portas para que essas oportunidades aconteçam.

“A minha presença aqui é um reconhecimento de que Portugal não se esquece dos portugueses e das portuguesas que aqui vivem”

Há escolas públicas em Timor-Leste com duas turmas de 50 alunos a partilharem a mesma sala, além das muitas situações precárias . Uma vez que a maior parte dos portugueses em Timor-Leste é professor, qual é o papel da comunidade portuguesa em TL para a melhoria das condições de ensino das crianças e jovens timorenses?

Estamos num processo, num caminho ainda muito recente e há, naturalmente, aspetos que podem ser melhorados, mas a evolução já tem sido muito grande. Temos de nos focar nos resultados positivos, que servirão para superarmos as dificuldades que ainda possam existir, mas o contributo tem sido dado e irá continuar a ser dado. Quanto às situações que ainda não são ideais, estamos no caminho certo para as ultrapassar.

Que importância têm estas visitas para a aproximação entre Portugal e os seus residentes no estrangeiro?

Uma importância essencial, porque, apesar de estarem tão distantes de Portugal, os portugueses em Timor-Leste continuam com uma ligação muito forte ao seu país. É claro que a minha presença aqui, enquanto Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, é um reconhecimento de que Portugal não se esquece dos portugueses e das portuguesas que aqui vivem.

Como foi o encontro com o Presidente da República José Ramos-Horta? Quais foram os temas abordados durante esse encontro?

O encontro foi muito positivo. O PR tem uma larga experiência de vida. Tem um conhecimento do mundo que poucos líderes mundiais terão. Pela experiência que teve, tem uma visão muito interessante deste contexto global em que vivemos: a invasão na Ucrânia, os problemas de inflação, os problemas energéticos que o mundo atravessa, os problemas financeiros que começam a surgir e em termos das finanças internacionais.
Os aspetos de cooperação também foram falados, com destaque para a língua portuguesa. O PR teve a amabilidade também de participar no encontro com a comunidade portuguesa, onde estavam largas dezenas de portugueses mas também de luso-timorenses. Teve a simpatia de me ter dado boleia no seu Mini Moke e essa viagem foi feita em segurança, segurança essa que se estende às relações entre Portugal e Timor, que obviamente quero aqui registar.

E com o vice-ministro dos Negócios Estrangeiros e Cooperação?

Foi também uma reunião muito positiva, onde abordámos os problemas da diáspora, com um objetivo bem claro: Portugal e Timor têm de cooperar para a melhoria dos programas e políticas das suas comunidades no estrangeiro. Ficou esse compromisso de uma maior cooperação para que aquilo que Portugal e Timor fazem possa ser partilhado e possamos aprender uns com os outros, através da experiência que temos com os timorenses que vivem fora de Timor e com os portugueses que vivem fora de Portugal.

Qual é o balanço que faz da visita a Timor-Leste?

Eu vou falar do futuro. Quero voltar, o que significa que o balanço é muito positivo. Verifiquei que Timor começa a ter um amadurecimento no seu sistema democrático, está a construir bases sólidas e a dar passos certeiros, não passos em falso, na organização do país. É um país moderno, virado para o futuro, e fico muito satisfeito por Portugal ser o seu principal aliado nesta construção do país e da dignidade do povo.

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  1. Apesar de continuar a levar com os pes quer seja do governo portugues, suas instituicoes e demais parentes, somos e seremos sempre portugueses.
    Carlos Escaumfofo

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