Para compreender o Autismo

O diagnóstico pode ser feito já a partir dos 18-24 meses de idade/Foto: pixabay

De acordo com uma pesquisa divulgada em 2023 pelo Centro de Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos (CDC, em inglês), cerca de 1 em cada 36 crianças norte-americanas com 8 anos de idade apresenta sintomas do espectro do autismo. Outro estudo, publicado em 2022 e financiado pelo Fundo de Pesquisa em Saúde de Québec (FRQS, em francês) e pelo Instituto Canadiano de Pesquisa em Saúde (CIHR, em inglês), analisou dados de vários países, estimando que globalmente existem aproximadamente 75 milhões de pessoas com algum nível de autismo. Contudo, esses números podem ser ainda maiores, uma vez que as estatísticas consideraram apenas os casos diagnosticados e registados pelos órgãos de saúde.

Em Timor-Leste não há estatísticas oficiais sobre a incidência do autismo. Além disso, muitas pessoas desconhecem não apenas os sintomas, mas até mesmo a existência deste transtorno. Este cenário pode reforçar preconceitos e dificultar que as pessoas procurem ajuda. Para entendermos um pouco mais sobre o autismo, selecionei algumas das perguntas mais frequentes que recebo de pais e educadores.

O que é o Autismo?

O autismo, ou Transtorno do Espectro Autista (TEA), é uma condição neurológica que afeta o desenvolvimento do cérebro. Isto causa alterações, principalmente, na capacidade de comunicação, na regulação emocional, no comportamento e na interação social.

O autismo é uma doença mental?

O TEA não é considerado uma doença mental, mas sim um transtorno neurológico que ocorre durante a formação e o desenvolvimento do cérebro. Podemos dizer que o autismo é uma variação ou mudança no processo de desenvolvimento cerebral e nas funções cognitivas. O cérebro desenvolve-se de maneira diferente ao padrão esperado.

Quais são as causas do autismo?

As pesquisas desenvolvidas, até ao momento, indicam que há uma combinação de fatores genéticos, neurológicos e ambientais que favorecem a alteração do processo de desenvolvimento do cérebro.

O autismo tem alguma relação com o mundo espiritual ou castigo?

De forma nenhuma. Isto é muito importante percebermos. Porque a maneira como entendemos os problemas condiciona a forma como buscamos as soluções. O TEA não tem causas sobrenaturais, não se “tem” TEA porque os pais fizeram algo errado, não é uma maldição ou castigo. Não se “pega” autismo e ele não é contagioso ou causado por uma bactéria, vírus, vacinas ou leite materno estragado. Ninguém precisa de ter vergonha ou sentir-se culpado por ter um(a) filho(a), parente ou amigo(a) com TEA.

Qual a importância do diagnóstico precoce?

Quanto mais cedo for realizado o diagnóstico, mais cedo podemos iniciar as intervenções para diminuir os impactos dos sintomas e promover uma melhor qualidade de vida para a criança. O diagnóstico pode ser feito já a partir dos 18-24 meses de idade, pois nesta fase os sintomas começam a ser mais evidentes e influenciam o desenvolvimento da criança.

Como é feito o diagnóstico?

Há uma série de critérios que precisam de ser observados. O profissional da área de saúde utiliza o Manual Diagnóstico e Estatístico de Distúrbios Mentais (DSM-5-TR) e a Classificação Internacional de Doenças (CID-11) como manuais objetivos para o diagnóstico do TEA. Utilizam, também, testes como o ADOS, ADI-R, CARS, M-CHAT, por exemplo. E realizam entrevistas com as pessoas próximas que podem ser, dependendo do caso, os pais, outros cuidadores, parentes, amigos, educadores e etc.

Quais são os tipos de autismo?

Atualmente utiliza-se os níveis 1, 2 e 3 para falarmos do grau de severidade dos sintomas e do tipo de apoio que uma pessoa com TEA necessita. O nível 1, apesar das dificuldades de interação social e comunicação, os sintomas são menos severos e as pessoas podem ter uma vida mais independente e conseguem, em muitos casos, estudar, trabalhar e relacionar-se socialmente. No nível 2, são necessários alguns cuidados mais específicos em relação ao nível 1, e o nível 3 é quando a pessoa precisa de cuidados mais intensos e tem menos independência em comparação com os níveis anteriores. É importante destacar que a classificação em níveis é uma estratégia útil para entender as necessidades individuais e planear o tipo de suporte e intervenções para ajudar a pessoa com TEA. No entanto, cada pessoa é única, o tipo e a intensidade dos sintomas (mesmo entre os que estão em um mesmo nível) variam de um indivíduo para outro.

O autismo tem cura?

Embora o autismo não seja uma condição que possa ser “curada”, os tratamentos e intervenções estão focados em ajudar a pessoa com TEA a desenvolver habilidades que permitam que tenha certo nível de autonomia e melhorar a sua qualidade de vida.

Como é feito o tratamento?

O tratamento do TEA geralmente envolve uma abordagem multidisciplinar que inclui terapeutas ocupacionais, fonoaudiólogos, psicólogos e outros profissionais de saúde. Essa abordagem e as diferentes técnicas utilizadas procuram ajudar a pessoa a desenvolver habilidades necessárias para uma vida mais integrada, com qualidade e independente.

Há algum remédio para o autismo?

Não existem medicações específicas para o autismo. Mas algumas vezes uma pessoa com TEA pode precisar de remédios para tratar outros sintomas e problemas como insónia, agressividade, hiperatividade, depressão, dificuldade de concentração, ansiedade, comportamentos obsessivos e outros.

Como os pais e professores podem identificar se uma criança apresenta sinais de autismo?

Os pais podem ficar atentos a alguns sinais. Cada um destes sinais isoladamente ou mesmo em conjunto não significa que a criança apresenta TEA. No entanto, os pais devem procurar ajuda de um profissional da área da saúde para identificar as causas destes comportamentos. Entre estes sinais estão:

– Dificuldade em olhar nos olhos das outras pessoas;

– Dificuldade em reconhecer sentimentos por meio das expressões faciais;

– Dificuldade com a mudança de rotinas;

– Pode não responder quando chamada pelo nome;

– Pouco interesse em interagir e brincar com outras crianças;

– Não falar após os dois anos de idade;

– Não responder ao sorriso ou aos estímulos visuais de outras pessoas;

– Brincar sozinha e dificuldade em usar a imaginação;

– Comportamento agressivo;

– Fazer movimentos repetitivos, se balançar e comportamentos estereotipados;

– Não apontar ou usar as mãos para mostrar o que quer;

– Sensibilidade excessiva a cheiros, sons, luzes ou ao toque.

Onde procurar ajuda?

Os pais, educadores, familiares e amigos podem procurar ajuda de profissionais da área da saúde para uma avaliação específica. Há o Hospital Nacional, a Associação dos Profissionais de Psicologia, os postos de saúde nos sucos, as clínicas médicas, o Centro de Apoio à Saúde em Laclubar e ONG’s como, por exemplo, a Alma e a Maluk Timor. Estas instituições, se não tiverem profissionais no local, podem fornecer orientações e ajudar a encontrar ajuda especializada.

Alessandro Boarccaech, psicólogo com especialização em psicologia clínica e da saúde, psicoterapeuta e PhD em antropologia. Professor universitário, coordenador do Centro de Pesquisa em Cultura e Sociedade e editor da revista académica Diálogos da Untl. Autor de diversos livros e artigos científicos entre os quais Os eleitos do cárcere; A diferença entre os iguais; Dicionário Hresuk-Português; Conhecimento local, curandeiros e Psicologia: causas, sintomas e tratamentos dos transtornos mentais em Timor-Leste.

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