Passados 81 anos da invasão japonesa do Timor Português, as mulheres timorenses vítimas de escravatura sexual às mãos dos militares japoneses nunca ouviram um pedido oficial de desculpas nem receberam qualquer indemnização por parte do Japão, ao contrário do que aconteceu em outros países. A Associação da Lei, Direitos Humanos e Justiça (HAK, em indonésio), que assinalou a data esta quinta-feira, dia 20 de fevereiro, em Díli, mantém a exigência de que as autoridades japonesas reconheçam os direitos das vítimas.
“Um crime contra a humanidade”. Foram estas as palavras escolhidas pelo diretor-executivo da HAK, Sisto Freitas, para descrever a violência levada a cabo pelo exército japonês durante a invasão a Timor-Leste na Segunda Guerra Mundial. A escravatura sexual é um “crime cruel, muito grave, um dos piores crimes do mundo e ninguém pode esquecer estas mulheres”, sublinhou.
O diretor da organização lembrou que “ainda não foi feita justiça e que a falta de reconhecimento dos direitos das vítimas de violação sexual pelas autoridades japonesas deixa feridas abertas nestas mulheres”.
“Queremos relembrar ao Governo nipónico que as vítimas ainda sentem as feridas da tortura, castigos, terror e violação cruel por parte dos agressores japoneses do passado. Esse sofrimento ainda assombra estas mulheres. No entanto, vocês [japoneses] não curam essas dores”.
“A missão dos militares era fazer guerra e não violar as mulheres, ainda menores na altura”, defendeu Sisto Freitas”, no evento de homenagem às vítimas, que teve lugar no Jardim de Lecidere.
A associação aproveitou a ocasião para recordar os dados do estudo que realizou em 2005, onde apresenta o testemunho de 20 mulheres timorenses levadas pelos militares japoneses e enclausuradas num espaço conhecido como “ianjo”, (“estações de conforto”, em japonês). Aqui, eram transformadas em escravas sexuais, a maioria na altura ainda sem atingir a puberdade.
Um desses testemunhos é o de Marta Abu Bere, falecida em 2005, uma das “mulheres de conforto”, como eram chamadas as jovens forçadas à prostituição e escravatura sexual, violada por soldados do exército japonês, que relata no estudo a dor psicológica, mas também física, que chegou mesmo a impedi-la de andar após as agressões.
“Os soldados obrigaram-me a trabalhar no “ianjo” durante três meses. No quarto, havia mais três mulheres e éramos obrigadas a servir sexualmente os militares, todos os dias. Tentei resistir, mas quando o fazia estrangulavam-me e ameaçavam-me de morte”, contou Marta no seu testemunho.
Além de escravas sexuais, jovens mulheres como Marta foram forçadas a trabalhos pesados, como construir estradas, trabalhar na terra e recolher lenha e bambu.
Inês de Jesus, natural de Ermera, hoje com 88 anos, é a única participante do estudo ainda viva. Também feita escrava sexual ainda criança, era violada por oito homens, que se revezavam. “Não me conseguia pôr a pé. Só dormia como uma morta. Algumas das minhas companheiras fugiram, mas eu não, porque os soldados sabiam o meu nome e conheciam a minha família”.
Aliança Soares de Deus, neta de Inês, marcou presença no evento organizado pela HAK para reivindicar também que não se esqueça o sofrimento da avó: “Exigimos às autoridades japonesas que reconheçam as vítimas. A minha avó ainda sofre”.
Depois da entrada de forças australianas no território, a 20 de fevereiro de 1942, na Segunda Guerra Mundial, o Japão invadia o Timor Português e violava a neutralidade de Portugal. A invasão terminou a 5 de setembro de 1945, com o lançamento das bombas atómicas em Hiroshima e Nagazaki e a rendição do Japão.
Em Timor-Leste, além de dezenas de milhares de mortos, a invasão deixou marcas profundas de violência sexual. A vergonha silenciou muitas mulheres. Não se sabe ao certo quantas foram vítimas, mas estima-se que existissem no território cerca de 20 “estações de conforto”.
O exército nipónico pediu, durante a guerra, ao Governo uma escrava sexual para cada 70 militares. Cerca de 200 mil jovens, muitas ainda nem sequer adolescentes, foram feitas escravas sexuais na Coreia, China, Taiwan, Filipinas, Indonésia ou Timor-Leste, entre outros países asiáticos.
Autoridades japonesas e timorenses ignoram reivindicações de vítimas
A questão das mulheres de conforto têm sido uma pedra no sapato para a diplomacia japonesa, em especial nas relações com a Coreia do Sul. As autoridades sul-coreanas exigiram o reconhecimento do sofrimento das mulheres exploradas sexualmente. O Japão acabaria por pedir, em 2015, desculpa e compensou as escravas sexuais com cerca de 8,6 milhões de dólares americanos. Em janeiro de 2021, um tribunal de Seul condenou também o Japão a pagar indemnizações a 12 escravas sexuais sul-coreanas.
Em 2015, chegou a vez de Taiwan exigir ao Japão um pedido de desculpas às vítimas. Ainda segundo a agência Antara, em 2017, o embaixador japonês na Indonésia, Masafumi Ishii, reconheceu, em nome do Governo, o sofrimento das mulheres de conforto indonésias durante a invasão e pediu desculpa às vítimas.
Em Timor-Leste, ainda antes da Restauração da Independência, Ramos Horta, então Ministro dos Negócios Estrangeiros e Cooperação do Segundo Governo de Transição, defendendo a participação de um batalhão de engenheiros japoneses num contingente das Nações Unidas, que acabou por ser recebido em 2002 com protestos de mulheres timorenses vítimas de exploração sexual, referiu num comunicado: “Relativamente à questão da compensação e desculpas, os países têm diferentes formas de abordar esta questão. O Japão já expiou de várias formas o seu passado”.
Há 10 anos, em 2013, um grupo ligado aos direitos humanos, a Coligação Timor-Leste e Japão, apelou ao Governo japonês, num documento assinado por 40 organizações e 350 cidadãos, que se iniciassem conversações para compensar financeiramente as “mulheres de conforto” timorenses. Defendeu igualmente o diálogo com as vítimas para pedir desculpa e uma “reparação adequada”.
O silêncio das autoridades timorenses e japonesas mantém-se. As únicas vozes que em Timor-Leste se ouvem a defender os direitos das vítimas, algo que já foi feito em outros países, são os desta coligação e da HAK.
Um assunto bem ignorado da História do Império Português..
E não vejo motivo algum para silenciar o sofrimento destas mulheres.
Ainda temos muitas guerras e era bom que quem as ordena ou ordenou se responsabilize.
Quem sou eu para nao concordar com tamanha dor?
Quem sou eu para nao concordar com o sofrimento infligido a estas senhoras?
Quem sou eu para nao concordar que o anos nao apagam o malefico da invasao japonesa?
Quem sou eu para esquecer esta tortura embora o governo japones tenha ajudado imenso b
nos ultimos 20 anos?
Quem sou eu para dizer que uma coisa boa anula uma coisa horrivel?
Quem e sou eu?
Um pedaco de pau?
Nao, sou e sempre serei um humano ate a morte!
Li que os Aliados afastaram Timor das compensações e indemnizações de guerra por Portugal não ter participado na 2a Guerra Mundial.Uma verdade apenas formal.
Mas que Timor pagou um.elevdo preço em vidas (de dez a quinze mil) e sofrimentos é inegável .
Tendo estado sob administração portuguesa até 2002 também me parece que ficava bem à nossa democracia ter aqui um papel de defesa de direitos humanos.