Organização de jovens luta por uma vida mais saudável e inclusiva

Equipa e voluntárias da organização num seminário sobre eliminação do assédio sexual/Foto: JDN

A Juventude ba Desenvolvimento Nacional (JDN) trabalha para resolver os problemas sociais como assédio sexual, má nutrição e discriminação.

Em 2014, 12 jovens, com idades entre 17 e 25 anos, que vieram dos municípios para estudarem nas universidades em Díli, uniram forças com o intuito de encontrar soluções para os problemas que eram comuns a todos, sendo o desemprego o principal deles. Devido à falta de oportunidades, os universitários passavam fome e, para sobreviver, alimentavam-se apenas de supermie, uma massa pré-cozinhada indonésia que contém apenas carboidratos. A custar 25 centavos, era o que os jovens conseguiam pagar.

Contudo, com a ajuda de duas voluntárias australianas, criaram uma Organização Não-Governamental (ONG) registada no ano seguinte, com o nome Juventude ba Desenvolvimento Nacional (JDN).

O grupo então passou a receber alguns apoios e desde então tem procurado soluções para diversas questões sociais. Liderada por uma mulher, a equipa é formada por outras oito, além de três homens. Todos falam inglês fluentemente. A presença feminina marca também a posição do grupo, que envolve a luta pelos direitos das mulheres, colocando-as no centro do debate para o desenvolvimento nacional.

Atualmente, a JDN executa projetos que promovem a nutrição, passeios históricos e turísticos, a igualdade de género e a saúde reprodutiva para adolescentes. Desenvolve também iniciativas que combatem a discriminação contra pessoas com deficiência e o assédio sexual.

A organização frequentemente realiza seminários de sensibilização sobre as temáticas, com o intuito também de gerar efeito multiplicador de informações que promovam a dignidade e a igualdade entre os cidadãos.

Este ano, para responder às necessidades das comunidades mais desfavorecidas, as metas envolvem a criação de piscinas de peixes e de canteiros para o cultivo de alimentos, ações para incentivar o uso de terminologia correta para as pessoas com deficiência e implementar o código de conduta para eliminar o assédio sexual.

“Conforme o estudo de caso, a maior parte dos casos de assédio sexual acontece nos transportes públicos”

“Diga não ao assédio sexual!”

O projeto de eliminação do assédio sexual, com o apoio financeiro da organização australiana Indigo Foundation, começou em 2018 através de um estudo de caso. A maior parte das 80 jovens inquiridas na pesquisa disse ter sofrido algum tipo de assédio nos transportes públicos.

Para resolver o problema, pensou-se em estabelecer um conjunto de diretrizes, com um acordo entre a JDN e os condutores dos transportes públicos. Em 2020, a organização apresentou a proposta ao Grupo das Mulheres Parlamentares de Timor-Leste, que, por sua vez, submeteu o projeto para apreciação dos deputados. Ainda não houve resposta.

A ideia do código de conduta também foi discutida com o Ministério dos Transportes e Comunicações, a Direção Nacional de Transportes Terrestes (DNTT) e a Secretaria de Estado da Igualdade e Inclusão (SEII), porém não avançou.

Formação sobre assédio sexual/Foto: JDN

As regras preveem que os condutores sejam responsáveis pela segurança dos passageiros. Se acontecer assédio na sua viatura, o profissional deve denunciar o crime e proteger a vítima. Se não tomar nenhuma providência, pode ser penalizado.

Muitas pessoas assinaram a petição a aceitar que o código fosse criado e implementado, incluindo os condutores com quem a JDN conversou. Alguns reconheceram ter assistido a estas situações, mas ou não sabiam que estavam perante casos de assédio ou não tiveram coragem para defender as vítimas.

Apesar de o referido projeto ainda não estar em funcionamento, Belizia Dias, presidente da JDN, mostrou-se entusiasmada e otimista com a sua possível implementação. “Acredito que o código vai fazer uma grande diferença na sociedade timorense”, afirmou.

No entanto, a JDN não espera e começou, no mesmo ano em que apresentou a proposta ao Parlamento Nacional, a realizar formações para educar a população sobre o problema do assédio sexual. Mais de mil mulheres participaram nas iniciativas e cerca de 200 tornaram-se ativistas. Atualmente, há 20 voluntárias a dar formação à comunidade e a preparar panfletos para afixar nos edifícios onde se alugam quartos, local considerado de risco para as mulheres.

“Compromisso, responsabilidade, profissionalismo e pontualidade são requisitos para integrar a organização dos jovens”

Turismo valorizado pela JDN

No ano passado, a JDN foi galardoada com o Prémio dos Campeões do Turismo para a Melhor Experiência Turística em Díli. Iniciado em 2016, o projeto com 10 guias turísticos, dos quais 9 são mulheres, já realizou mais de mil passeios turísticos. Só no mês anterior, foram 22.

“A iniciativa da JDN diferencia-se das de outras organizações por ter guias jovens treinados intensivamente, com compromisso, responsabilidade, profissionalismo e conhecedores da história do país”, enfatizou Belizia Dias.

Antes de serem guias, os jovens passam por uma formação mínima de dois meses, que os habilita no atendimento aos clientes, na comunicação e no domínio dos aspetos culturais, turísticos e históricos de Timor-Leste.

O projeto abarca quatro tipo de passeios: Dili history tour (Passeio da História de Díli), que explora o período da Resistência; Women of Timor-Leste Tour (Passeio das mulheres de Timor-Leste) apresenta o envolvimento das mulheres no processo da independência; Culture Tour (Passeio cultural) demonstra a variedade cultural do país; e o Maubara Tour (Passeio Maubara), que leva os visitantes a atrações turísticas fora da capital, como a prisão de Aipelu, em Liquiçá, e a antiga residência dos governadores portugueses.

“Muitas vezes, os turistas fazem um dos passeios e depois querem experimentar os outros. Também costumam partilhar a experiência com outras pessoas, o que é ótimo para nós, porque ganhamos mais clientes”, contou orgulhosa a presidente da JDN. Belizia Dias advertiu que a clientela não é limitada a estrangeiros, pois há cada vez mais procura dos próprios timorenses.

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Passeio com a equipa de Kirsty Sword no mês passado/Foto: JDN

A jovem lamenta, no entanto, que a entrada nos sítios turísticos não seja paga, pois seria uma fonte de rendimento para a comunidade e manutenção dos locais “Há ainda falta de instalações adequadas, como casas de banho, e quando existem, não estão a funcionar”, observou.

Tinésia dos Santos, coordenadora do projeto de nutrição da JDN, corrobora a opinião de Belizia e acrescenta que certas atitudes diminuem o valor de algumas estruturas. “O monumento de homenagem a Rosa Muki Bonaparte na Rotunda de Mandarin, por exemplo, está vandalizado com vários palavrões”, revelou, indignada. No referido local, não há qualquer placa informativa a respeito da importância histórica do monumento.

“As formações exigem que implementemos o que aprendemos em casa”

Canteiros familiares para diminuir má nutrição e pobreza

O projeto nutrisaun diak, futuru diak (nutrição boa, futuro bom) pressupõe a reunião frequente de estudantes dos departamentos de Nutrição de várias universidades em Díli para abordar o problema de insuficiência alimentar.

A pobreza, a par da falta de fontes de proteína e vegetais, dificuldades de acesso a água potável e ausência de conhecimento sobre alimentação saudável – problemas mais graves nas áreas rurais – são as principais causas da má nutrição no país, descreve a JDN.

No início deste ano, a organização fez um teste de antropometria às crianças das comunidades de Lesibuta, Metinaro e Lahane, em Díli, medindo o peso, a altura e a circunferência do braço, para identificar casos de desnutrição. As 10 crianças diagnosticadas com nanismo, uma condição gerada pela subnutrição, foram encaminhadas para tratamento nos centros de saúde.

“Infelizmente, não há um suplemento específico para o tratamento da desnutrição aguda grave, como o PlumpyNut, uma pasta à base de amendoim com outros nutrientes necessários, por isso, as crianças tomam um suplemento de micronutrientes, mas não é suficiente”, preocupa-se Tinésia dos Santos, informando que o teste será, no futuro, alargado a outras comunidades.

Para oferecer fontes de proteína à população vulnerável, a JDN construiu este ano uma piscina de peixes na comunidade em Turiscai. A organização também vai implementar, ao longo deste ano, um projeto-piloto de criação de canteiros para o cultivo de alimentos e de produção e venda de uma merenda saudável para famílias em Lesibuta, Metinaru e Lahane, em Díli.

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Aula de culinária, maio de 2023, em Lahane/Foto: JDN

No âmbito do projeto, atualmente financiado pela Blue Mountain East Timor Sister (BMETS), são realizadas formações de alimentação saudável e demonstrações de culinária para jovens mães, onde se ensinam cinco chaves da alimentação segura: assegurar a higiene das mãos, dos equipamentos e ingredientes; separar alimentos crus e cozidos; cozinhá-los bem; manter os alimentos a temperaturas adequadas e usar água e matérias-primas limpas.

Para o projeto da saúde reprodutiva dos adolescentes, está a ser implementada uma formação a 300 novos dinamizadores nos municípios de Covalima e de Díli, com um guião desenvolvido juntamente com o Ministério da Saúde.

“Também nós precisamos de educar as pessoas e mostrar-lhes que não ficamos confortáveis quando nos chamam cegos ou malucos”

Pessoas com deficiência ainda são alvo de discriminação

Nelson Xavier, 20 anos, pessoa com deficiência física, juntou-se recentemente à JDN depois de ter participado numa formação do projeto Acabar com Discriminação contra Pessoas com Deficiência. A iniciativa ajudou o jovem a ganhar coragem para se defender contra os maus-tratos ou linguagem inapropriada de que frequentemente é alvo.

“Muitas vezes, as pessoas com deficiência acham que os ministérios são os únicos responsáveis em mudar atitudes. Também nós precisamos de educar as pessoas e mostrar-lhes que não ficamos confortáveis quando nos chamam cegos ou malucos”, destacou o jovem. Salientou ainda que é considerado assédio, quando as pessoas os olham fixamente, deixando-os desconfortáveis.

Através dos seminários realizados, identificou-se a falta de acessibilidade das pessoas com deficiência às vias públicas, como inexistência de rampas para quem usa cadeira de rodas, e à educação – por não haver livros em braille e professores especializados.

Por não conseguirem ir à escola, alguns jovens com deficiência que vêm dos municípios para estudar na capital acabam por ficar em casa a cuidar dos filhos dos seus familiares.

Financiado pela organização australiana Australia Pacific Training Coalition (APTC), o projeto conseguiu integrar 16 pessoas com deficiência nos centros de formação. Este grupo vai receber qualificação nas áreas de hotelaria, administração, língua inglesa e cafetaria.

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Formação para pessoas com deficiência/Foto: JDN

Em 2022, a JDN formou 50 jovens com deficiência para serem líderes juvenis e atuarem na definição de prioridades e nas questões que querem melhorar – como a educação inclusiva, autonomia, uso da terminologia correta e atitudes nas suas famílias e comunidades.

Há ainda formação específica sobre igualdade de género para homens, com o objetivo de combater o pensamento patriarcal, que, por exemplo, considera o trabalho doméstico função exclusiva das mulheres. “As formações exigem que em casa implementemos o que aprendemos. Se eu não cozinho ou lavo a loiça, vou logo fazer isso”, disse Nelson Xavier. A JDN acompanha os jovens depois das formações e partilha os progressos.

“As nossas ações estão a ter um impacto muito positivo. Que seja apenas o começo”

A coragem de atuar contagia as pessoas

Ainda é recorrente, em lugares públicos, assistirmos a homens a importunarem mulheres, seja através de assobios, comentários maldosos e pedidos de contactos. “Muitas pessoas ainda acham normal incomodar as mulheres que não conhecem. Não é normal. É assédio!”, ressaltou Belizia Dias.

Há, porém, histórias de sucesso de eliminação do assédio sexual. Com o intuito de sensibilizar mais pessoas para este problema e mudar mentalidades, a JDN partilha estas histórias na sua página de Facebook.

“Uma formanda do nosso projeto viveu uma situação de assédio. Quando quis repreender os jovens que a importunaram, as amigas, que estavam com ela retiveram-na e aconselharam-na a ignorar a situação. A jovem explicou-lhes que esta não é a atitude mais correta, pois este tipo de situação deve ser denunciada para que não se repita. Aos rapazes, a mulher disse que deveriam respeitar as mulheres e questionou o que sentiriam se isso acontecesse às suas mães ou irmãs. Estes jovens reconheceram que se zangariam com as pessoas que assediassem os membros da sua família”, partilhou a presidente da JDN.

Belizia informou que a publicação viralizou, atingindo mais de 10 mil pessoas. Depois disso, a organização passou a receber muitos convites para a realização de seminários sobre assédio sexual nos municípios.

“Isso mostra-nos que estamos no bom caminho. As nossas ações estão a ter um impacto muito positivo. Que seja apenas o começo”.

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  1. A JDN executa projetos que promovem a nutrição, passeios históricos e turísticos, a igualdade de género e a saúde reprodutiva para adolescentes.

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