Incansável é a palavra que melhor define Fernando Marques, de 24 anos, vendedor de pulsa e finalista do curso de Pescas e Ciência Marinha da Universidade Nacional Timor Lorosa’e (UNTL). Só falava makalero, língua da terra, quando saiu da sua pequena aldeia no município de Lautém para a capital com o objetivo de, pelo menos, aprender tétum antes de ingressar na Universidade, em Díli, mas a vida obrigou-o a “fazer-se à estrada” muito cedo para pagar os estudos.
Durante três dias seguidos, a equipa do Diligente procurou saber quem é o Fernando, mais conhecido por Nando. Há sete anos que o jovem trocou o conforto do lar, em Lautém, para ser vendedor ambulante nas ruas de Díli e estudar. Encontrámo-nos numa quarta-feira solarenga. O jovem de pele escura e cabelo preto encaracolado, tipicamente timorense, olhos pretos acastanhados, cor que sobressai quando está ao sol, traz na sua essência o brilho do mar.
Os pais, agricultores e analfabetos, sempre lutaram para fazer chegar comida à mesa e pagar a educação dos filhos. Fernando é o terceiro filho de 12 irmãos.
Aos 13 anos, consciente das condições precárias em que a família vivia, o sentimento de responsabilidade “bateu à porta” do jovem, que acredita que só a educação pode salvar a vida dos pais e dos irmãos.
Depois de terminar o 9.º ano na escola São João Paulo II, em Iliomar, Lautém, em setembro de 2015, e sem pensar duas vezes, decidiu continuar os estudos em Díli. Logo no início de 2016, mudou-se para a casa do tio, irmão da mãe, na capital, onde enfrentou o primeiro desafio que a vida lhe ofereceu: continuar o ensino secundário na escola São José Operário, em Balide, com escasso domínio da língua tétum.
“Durante três meses, quase não falava com ninguém, porque tinha muita dificuldade em comunicar em tétum e tive receio que os meus colegas gozassem comigo, o que acabou por acontecer. No dia da apresentação de um trabalho do nosso grupo, em vez de dizer grupo, disse “kurupu”, provocando o riso geral”, lembra às gargalhadas, apesar de na altura não ter achado piada nenhuma.
O gozo dos colegas não o reteve, antes pelo contrário, impulsionou-o ainda mais a atingir os seus objetivos. “Para mim, todas as dificuldades eram pequenas e nunca levei a peito. Conversava com os meus problemas ‘olhos nos olhos’ e dizia a mim mesmo que estou aqui com um objetivo: aprender”. E assim é até aos dias de hoje, Nando está sempre em aprendizagem constante.
Quando passou para o 11.º ano, percebeu que, além do tétum, o português e o inglês também são línguas indispensáveis e “janelas” para oportunidades profissionais. Por ter dificuldades, o jovem pensou em duplicar o esforço para aprender estas duas línguas através de cursos específicos de inglês e português. Porém, o caminho para conseguir frequentar os cursos foi árduo, porque os pais não tinham condições financeiras, sendo que as propinas da escola já eram pagas com grande esforço.
“Eu sabia que os meus pais tinham dificuldades em pagar as minhas propinas, no entanto, insistiam em mandar-me dinheiro, mesmo que para isso tivessem de reduzir as despesas em casa e as necessidades dos meus irmãos ao básico. Não foi fácil para eles nem para mim”, lamentou.
“De manhã, vendia até às 11h, depois voltava a casa e preparava-me para ir à escola”
Consciente de que os pais não iam conseguir pagar os cursos, começou a pensar num plano para ganhar dinheiro. Na época, Fernando fez o melhor que pôde para multiplicar o dinheiro enviado pelos pais e para não os sujeitar a mais esforços financeiros.
“Como sei que as crianças gostam de T-shirts com a imagem de ícones do futebol, como Neymar, Cristiano Ronaldo e outros, comprei T-shirts na loja dos indonésios em Campu-alor e vendia-as na rua a um preço superior. Andei de bairro em bairro durante um ano. O meu horário da escola era flexível. Tinha aulas só a partir das 14h. Então, de manhã, vendia até às 11h, depois voltava a casa e preparava-me para ir à escola.
Consegui juntar dinheiro para pagar a formação extra de inglês e de português sem ter de pedir aos meus pais”, conta o jovem, certo que, com disciplina e perseverança, consegue atingir os objetivos.
Em 2018, como tinha de se preparar para o exame nacional, decidiu mudar de negócio. “Tive de encontrar um trabalho que não consumisse tanto a minha energia para, ao mesmo tempo, conseguir estudar e preparar-me para o exame. Então, comecei a vender pulsa até terminar o secundário nesse mesmo ano.” E nunca mais parou.
Desde que Nando decidiu mergulhar na experiência de trabalhar e estudar ao mesmo tempo, deixou de ter sábados, domingos e feriados. E nem o calor o impede de vender. Para se refrescar nos dias mais quentes, Nando costuma abrigar-se à sombra de uma árvore à frente do supermercado Lita, que apelidou de “árvore santa”. Foi assim que conseguiu juntar dinheiro para estudar. Na mochila, carrega uma garrafa de água e um livro.
Sustenta a vida com um sorriso no rosto, pois cativa qualquer pessoa que lhe compra pulsa. Passou um autocarro com uma pessoa a acenar e a gritar “ailoloro” enquanto conversávamos. Questionado sobre o significado da palavra, explicou que era um conhecido da sua terra que o estava a cumprimentar em makalero.
A passagem do conterrâneo deixa-o melancólico. “Desde que cá cheguei, em 2016, tenho visitado os meus pais apenas uma vez por ano”, desabafou com o olhar cheio de saudades. Por alguns segundos, ficou cabisbaixo e introspetivo. Depois apercebeu-se, começou a rir e voltou à nossa conversa.
O jovem desconhece a palavra cansaço. A sua vida, durante sete anos, resumiu-se a vender nas ruas e a estudar até ao momento em que o mar se tornou no seu melhor amigo.
Fernando e o mar
“O curso de Pescas e Ciência Marinha foi a minha primeira opção, porque vi que os recursos humanos nesta área são poucos e certamente teria mais opções no mercado de trabalho. Além disso, desde pequeno que vejo os meus avôs a comunicarem com o mar. Para eles, o mar é um território de cura, onde existem todas as fontes de vida e de transformação”.
Fernando revela que, quando alguém da família ficava doente, os seus avôs faziam uma espécie de veneração ao mar para pedir “matak malarin” (em português, bênção e cura). “Por isso, conhecer e estudar o mar, para mim, é voltar às origens.”
Em 2020, no segundo ano do curso, Fernando candidatou-se a uma atividade de mergulho, organizada pela UNTL em parceria com a Compass Diving, em Timor-Leste. Houve mais de 200 candidaturas e só 50 pessoas foram selecionadas. O jovem fez parte dessa seleção.
“Antes de mergulhar, tivemos uma semana de treino intenso. Treinámos na piscina e conhecemos todos os equipamentos de mergulho” para depois “rumar ao mar”.
Enquanto todos os colegas entravam no mar com receio, Fernando sentia-se calmo e protegido, pois, para ele, o mar substitui a casa dos antepassados e é um “paraíso natural”, onde se refugia sempre que sente saudades dos pais.
“Se cuidarmos do mar, ele também cuidará de nós”
O jovem acredita que “se cuidarmos do mar, ele também cuidará de nós, porque ele é o jardim do mundo e todos deveriam conhecer este jardim maravilhoso. Mergulhar e conhecer o fundo do mar deveria ser obrigatório para todos os seres humanos”.
O mergulhador sonha, um dia, ser instrutor profissional de mergulho para dar a conhecer o mundo marítimo e sensibilizar as pessoas para a importância de o preservar. “Estou, neste momento, a juntar dinheiro para um dia conseguir proporcionar esta oportunidade a todos os jovens interessados. Vender pulsa é um caminho para lá chegar”, confidencia.
Em maio deste ano, a UNTL organizou mais uma atividade de formação de mergulho, desta vez em cooperação com a Dreamers Dive Academy. Participaram 25 alunos do departamento de Pesca e Ciência Marinha da UNTL. Nando foi um deles. A formação terminou no mês passado (30 de junho), tendo recebido o certificado de open water (certificação de mergulho).
Luís Melki Bere-Hunu, primeiro instrutor timorense de mergulho, da Dreamers Dive Academy, disse ao Diligente que Nando é um dos melhores formandos. Para ele, “Nando tem alma de mar”.
Muito obrigado pela sua informasaun sobre historia atividades diaria em capital Dili, o irmao Nando que eu conheco antes de venha a capital quando nostalgia conversa sempre falamos sobre como que vivemos em capital e nao fica com pai e mae mas comel outras familias.portanto quela momento que nos decidimos por cada pesssoas que fazer ha que para ter beneficios e tambem pode supporta o nosso estudo,ntw irmao decidi verder pulsa e estou ser carpintaria ate agora estou trablhar na area agricultura em Australia porque ter opportundade ao nosso governo.muito obrigado
Muintos parabéns esta informação para motivas os amigo Fernando Marque kontinua prepara o futuru.
Parabéns