Durou pouco mais de 24 horas, a primeira visita oficial do primeiro-ministro de Portugal, António Costa, a Timor-Leste. O tema central foi o novo plano estratégico de cooperação para 2024-2028, com destaque para as oportunidades económicas que podem resultar da adesão de Timor-Leste à ASEAN e para a continuidade da aposta na língua portuguesa.
“Não é só mais uma língua, é a língua que faz a diferença e dá uma identidade específica à nação timorense”. Foi por estas palavras que, na deslocação ao externato de São José, em Díli, que marcou, esta quarta-feira, o final da curta visita do primeiro-ministro português à mais jovem democracia do sudeste asiático, António Costa exaltou a importância da língua portuguesa. “É muito importante que o ensino da língua prossiga e se desenvolva, porque é esta diferença que reforça a identidade de Timor, a mesma identidade que fez com que tenham resistido ao invasor e tenham recuperado a liberdade e a independência que assegurarão o progresso de todos vós”.
Também o Ministro dos Negócios Estrangeiros de Portugal, José Gomes Cravinho, que integrou a comitiva oficial de Costa, destacou, à saída do externato, que este é um “momento particularmente propício para Portugal estar mais presente no mercado sudeste asiático, porque com a adesão de Timor à ASEAN abrem-se portas aos dois países”. Nesse sentido, Cravinho avançou que os próximos meses serão de “descoberta de novas oportunidades no quadro económico, resultantes da adesão de Timor-Leste à ASEAN e também das oportunidades no quadro da economia azul”, num percurso que não poderá deixar de passar também “pelo renovado ênfase na língua, no ensino, na formação e na assistência técnica”.
António Costa, que aterrou em Timor-Leste esta terça-feira, encontrou-se no mesmo dia com o seu homólogo, Xanana Gusmão, e começou por destacar a importância da visita oficial para “identificar as prioridades do novo Governo de Timor para a cooperação, de modo a que o próximo programa estratégico corresponda às necessidades da nova governação”.
Também o primeiro-ministro timorense, Xanana Gusmão, reforçou a convicção de que “a certeza da amizade demonstrada pelo Governo português será, mais uma vez, provada na prática, com a ajuda de Portugal a este jovem país que quer desenvolver-se para que o povo sinta que a independência valeu a pena”.
Os dois primeiros-ministros falaram à comunicação social, em conferência de imprensa, no Palácio do Governo, em Díli, sem que houvesse lugar a perguntas dos jornalistas.
No mesmo dia, à margem de um encontro com o Presidente da República, José Ramos-Horta, o primeiro-ministro de Portugal avançou, em declarações à Lusa, que os dois países vão trabalhar em conjunto no combate à imigração ilegal e ao tráfico de seres humanos, através de canais legais de migração. A questão continua a estar em cima da mesa depois de, no ano passado, centenas de timorenses terem ido para Portugal sob promessas falsas de emprego e melhores condições de vida.
Homenagem a antigo presidente por dedicação à causa de Timor-Leste
Ainda na terça-feira, António Costa marcou presença na reinauguração do Centro Cultural Português, em Díli, agora Centro Cultural Jorge Sampaio, que passa assim a homenagear o antigo presidente da República portuguesa, falecido em 2021, pela sua dedicação à causa da independência de Timor-Leste.
Em Portugal, “muitos deram a cara ao lado dos timorenses na luta pelo direito à autodeterminação e à independência de Timor”, lembrou António Costa, com enfoque para a entrevista de Jorge Sampaio à CNN, em 1996, que denominou como “um grito de alerta para toda a comunidade internacional”, relativamente à luta dos timorenses.
Por sua vez, o Presidente da República, José Ramos-Horta, realçou a importância do papel do antigo presidente português, com a memória da primeira visita de Sampaio ao país. “Timor-Leste não tinha ainda nenhum objeto de homenagem, medalhas ou condecorações, na altura, Timor ainda não era independente. O que pudemos fazer, em forma de homenagem, foi entregar ao Presidente Jorge Sampaio o passaporte de Timor-Leste, porque passaporte já tínhamos”, recordou. Foi, nas palavras do presidente, “o substituto para a condecoração com a Ordem de Timor-Leste, que veio a receber muitos anos depois”.
Da agenda da deslocação oficial do chefe de Governo português fizeram também parte as visitas ao Parlamento Nacional de Timor-Leste, ao Centro Juvenil Padre António Vieira, à Escola Portuguesa de Díli (Escola Portuguesa Ruy Cinatti) e às novas instalações do Centro de Língua Portuguesa na Universidade Nacional de Timor Lorosa’e.
Ruas de Díli de “cara lavada” para receber primeiro-ministro de Portugal?
“Como uma cidadã, queria dizer aos governantes que nós não vendemos no meio da estrada, só vendemos aqui à beira, sobra muito espaço para o primeiro-ministro passar e ir ao cemitério. Porque é que nos proíbem de vender onde vendemos todos os dias?”
Jacinta Santos, mãe de seis filhos, tem uma banca à porta do cemitério de Santa Cruz, palco do massacre de 12 novembro de 1991. O marido está preso, na prisão de Becora, também em Díli, e a pequena banca de fruta é o meio de subsistência para a família desta vendedora de 33 anos.
A banca da comerciante não é a única. Até à alegada proibição da semana passada, perto de dez bancas ocupavam todo o espaço à beira da estrada em frente ao cemitério de Santa Cruz, que, na manhã desta quarta-feira, quando chegaram os carros da comitiva oficial do primeiro-ministro, estava completamente vazia.
Jacinta Santos conta que, na segunda-feira da semana passada, foi abordada por elementos da Polícia Nacional de Timor-Leste (PNTL) e da Autoridade Municipal de Díli (AMD) para que abandonasse o local. “Disseram-me que não podia vender durante o dia, por ser um lugar histórico, mas à noite sim”.
“Já não vendemos aqui durante o dia há uma semana e estamos a perder os nossos rendimentos”, reclamou.
O Diligente entrou em contacto com o diretor do Serviço Municipal de Gestão de Mercado e Turismo, Artur Henriques, que explicou não ser possível ainda prestar esclarecimento sobre esta situação, avançando apenas que “já recebemos várias queixas por partes dos vendedores e o caso está a ser analisado pela nossa equipa. Só devemos ter conclusões na próxima semana”.