PLÁSTICO

Materiais plásticos proibidos por lei ainda circulam no mercado timorense

Comerciante a vender sacos de plástico em Díli/Foto: Diligente

O Governo timorense decretou como lei, em setembro de 2020, a proibição do uso de vários tipos de produtos de plástico para promover a proteção do meio ambiente. Porém, por não oferecer alternativas viáveis à população, a referida legislação, mesmo estando em vigor desde 2021, na prática nunca funcionou.

Entre os materiais proibidos pelo decreto lei nº 37/2020 estão sacos de lixo, sacos de plástico de uso único, embalagens e recipientes para alimentos, garrafas com menos de 0,5 litros de capacidade, copos, talheres, pratos, tijelas, palhinhas e tabuleiros para refeições.

O chefe do departamento do Plano de Gestão Ambiental e diretor interino do Controlo da Poluição, Arlindo Silveira, reconhece as falhas.

“A lei proíbe o uso de água engarrafada de menos de meio litro, água em copos de plástico, por exemplo, mas quais são os substitutos? O Governo ainda não está pronto para isso e o país não tem ainda condições para substituir muitos materiais plásticos”, admitiu Arlindo Silveira, que lamenta a inexistência de agências ou companhias capazes de produzir materiais que substituam o plástico.

Deu o exemplo da produção de sal, da água engarrafada e do café em Timor, produtos que ainda precisam de ser embalados em plástico – e para os quais ainda não foram encontrados substitutos. Por isso, o Governo “decidiu autorizar este tipo de plástico para as companhias produtoras, mas com a introdução de um imposto, que começou a ser implementado desde 2022 até hoje”, informou o diretor.

Cristo Soong, 49 anos, um comprador em Fatuhada, considerou a eliminação total do plástico impossível, porque o mercado ainda depende deste material.

“Se proibirem a utilização de sacos de plástico em prol da proteção ambiental, como é que conservamos os alimentos congelados que precisam de ser embalados em plástico para garantir a sua qualidade?”, questiona. Duvida ainda que a lei, um dia, seja devidamente cumprida, porque os sacos de plástico continuam a circular no mercado timorense.

A negociante de vegetais, Rita de Fátima Viana, 50 anos, moradora em Comoro, concorda com a lei que proíbe a utilização de materiais plásticos, “pelo bem do ambiente, já que, quando chove, as valetas ficam entupidas e há inundações”.

Contudo, a negociante diz-se obrigada a usar material plástico diariamente para entregar os produtos à clientela. Segundo Rita, os clientes só aceitam comprar se receberem os vegetais em sacos de plástico. “Nas lojas grandes, os clientes aceitam comprar sacos feitos de tecido, mas connosco, isso não acontece”, argumentou.

A facilidade em obter sacos de plástico em Timor-Leste evidencia a falta de rigor no cumprimento da lei que restringe o uso deste tipo de material. Cesário de Carvalho, 40 anos, ganha a vida vendendo sacos de plástico em Díli, que compra nas lojas em Audian.

“Sei da política ‘zero plástico’, mas os vendedores de vegetais ainda precisam dos sacos deste material. A demanda é grande e por isso vendo”, explicou.

Um dono de uma loja chinesa que não quer ser identificado também está a par da proibição, mas culpa o Governo pela falta de fiscalização e de rigor nas fronteiras, “o que possibilita a entrada e circulação dos sacos de plástico no mercado timorense”.

Questionado se vende os referidos materiais, que estão à vista na sua loja, afirma que são “restos de sacos que já vendiam antes e que não se vai abastecer mais”. Relativamente ao distribuidor, informou que “algum miúdo veio aqui vender, mas não sei exatamente quem é”.

Atuação das autoridades

Arlindo Silveira afirmou que, desde a entrada em vigor da lei, houve divulgação. “Foi feita disseminação na comunicação social, encontros e workshops junto dos empresários, donos das lojas e companhias importadoras de plástico. A maioria dos vendedores tem consciência desta lei que proíbe a importação, produção e venda de produtos plásticos. Fizemos também um levantamento do tipo de materiais proibidos que existem no mercado, tanto em Díli como nos municípios”.

O diretor interino, no entanto, confessou que, somente em 2022, é que começou a haver as primeiras apreensões de produtos plásticos, nomeadamente sacos, nos pontos de entrada do país. Arlindo Silveira defendeu que a passagem destes produtos nas fronteiras não é exequível, porque “há trabalho conjunto entre a alfândega, a polícia marítima e os serviços de emigração. Se alguém importar os sacos de plástico pelas fronteiras, sem autorização da Secretaria de Estado do Ambiente, estes são automaticamente apreendidos”.

“O problema agora não é quem vende e usa os sacos de plástico, nem é culpa da Secretaria de Estado do Ambiente ou da Autoridade Aduaneira, mas quem fez entrar ilegalmente ou, desconfiamos, quem produz dentro do país”, acrescentou.

Questionado sobre quem está a fazer investigação da entrada e circulação contínua de sacos de plástico, o diretor atenuou. “O Governo está numa fase de transição de poder. Estou decidido a elaborar um plano de gestão e espero que o novo Governo dê a máxima atenção a este caso”.

O inspetor geral da Autoridade de Inspeção e Fiscalização das Atividades Económicas, Saúde e Alimentos (AIFAESA), Ernesto Monteiro, admitiu que “ainda não procederam à inspeção e ao controlo da situação, porque ainda não houve exigência por parte do Governo nem da sociedade civil. Se isso acontecer, estaremos prontos para colaborar”.

Por outro lado, alegou que o principal impedimento da AIFAESA para realizar o seu trabalho se deve à falta de funcionários, transportes e tempo. “Só trabalhamos de segunda a sexta-feira, mas os negócios continuam a funcionar aos fins de semana”.

O inspetor compromete-se a coordenar com a Secretaria do Estado do Ambiente para programar uma fiscalização, no sentido de poder incluir os produtos plásticos na lista de inspeção.

O impacto do plástico

Em Timor-Leste, o impacto para o meio ambiente causado pela utilização de produtos plásticos é bastante evidente. Nas praias, sobretudo depois de chover, os materiais acumulam-se, gerando sujidade e atraindo insetos e ratos. Grande parte destes materiais vem das valetas, entupidas pelo lixo.

Lixo e plástico acumulados em Metiaut/Foto: Diligente

A poluição nas zonas costeiras causada pelo plástico prejudica a biodiversidade marinha. O material é conhecido pela sua natureza duradoura, podendo levar centenas de anos para se decompor.

Uma vez nos oceanos, os produtos plásticos podem ficar presos em tartarugas, peixes e pássaros, ou mesmo ser ingeridos, podendo levar os animais à morte.

O chefe da Gestão Ambiental destacou ainda que a poluição gerada, principalmente pela queima de material plástico, contribui para a mudança climática. “Díli está cada vez mais quente”, disse Arlindo Silveira, observando que há muitas pessoas a comprar ar condicionado ou ventoinhas devido ao calor.

“Outra situação que mostra a veracidade da mudança climática é o aumento do nível do mar. Antigamente, o nível do mar em Pantai Kelapa ficava longe da estrada e a costa litoral era maior, agora a água do mar já atingiu a via”, refletiu.

“O nosso país é pequeno e não queremos que os plásticos nos invadam. A nossa estratégia de eliminação dos sacos de plástico para o bem do ambiente é a longo prazo, nos próximos 50 anos e para as futuras gerações. Agora já sentimos o impacto”.

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