Numa altura em que a Igreja Católica enfrenta tempos particularmente conturbados, em todo o mundo, na sequência de sucessivas denúncias de casos de abusos sexuais no seio da instituição, o representante do Vaticano em Timor-Leste, Marco Sprizzi, fala sobre os desafios à atuação da Igreja num dos países com mais população católica do sudeste asiático.
Antes de vir para Timor-Leste (TL), em 2019, que opinião tinha do país e da Igreja cá? O que esperava encontrar?
Conheci TL quando, em 1996, o D. Ximenes Belo e o atual presidente da República, José Ramos-Horta, receberam o Prémio Nobel da Paz. Naquela época, estava a ser ordenado sacerdote e li notícias sobre a situação de Timor-Leste, sobre o quanto era grande a fé dos timorenses e a importância da presença da Igreja, que era muito próxima do povo. Não esperava ser transferido para aqui. Quando recebi a notícia, fiquei muito comovido e pensei que era vontade de Deus que eu desse a minha contribuição humilde para que a Igreja fosse cada vez mais útil e fecunda neste país.
Qual foi a sua primeira impressão quando chegou cá?
Foi ainda melhor. Confirmei verdadeiramente a força da fé. Os timorenses têm uma grande energia espiritual. É um país e um povo que, cada vez mais, tem uma vocação e uma missão especial na Ásia, e, como disse João Paulo II, “é uma luz de fé e de paz” para a Ásia e para o mundo. Antes de vir para Timor, não esperava isto. Foi uma surpresa muito bonita.
Para si, o que é ser um “bom católico”?
Para ser um bom católico a primeira coisa é pôr Jesus no centro da nossa vida, acolhê-lo e segui-lo. Ser católico não é só ser fiel como um Papa ou Santo Padre, é preciso ter uma mentalidade aberta.
Católico deriva do grego kata (conforme) e holos (tudo), então católico significa um todo, não excluir nada, incluir tudo. Uma visão ampla que acolhe, considera, abraça e aprecia tudo e todos. Se um verdadeiro católico tiver esta mentalidade de “tudo”, do “inteiro” e não do parcial que exclui uma parte ou outra, vamos ter um católico com uma visão harmoniosa que inclui toda a criação. Para que isto aconteça, os timorenses devem acolher os outros. Mesmo que 2% das pessoas pensem diferente, tenham outra fé, outra religião, o católico timorense deve acolher, amar e valorizar as diferenças. Vejo que os timorenses têm mente aberta.
Segundo a sua opinião, existe diferença entre Igreja timorense e a Igreja noutras partes do mundo? Quais?
Sim, claro. No sentido de que cada povo é uma cultura, há uma diferença de caráter. É normal que haja diferença, mas, ao mesmo tempo, há uma grande unidade, porque os timorenses, a Igreja em Timor, tem firmeza de fé, há unidade na diversidade.
“Não se deve marginalizar, excluir, ou até condenar os membros da família homossexuais”
O Papa Francisco disse, no filme Francesco, que os casais gays têm direito à união civil. Na sua opinião, porque será que a Igreja timorense ainda está contra esta união?
Este filme foi, na linguagem cinematográfica, diz-se montado, resultado de uma montagem de pedaços diferentes de entrevistas. O Papa não disse que têm direito à união civil, disse que têm direito a uma família. Ele falava do direito a não serem excluídos da família, a merecerem ter pai, mãe e irmãos. Não se deve marginalizar, excluir, ou até condenar os membros da família homossexuais.
Quando perguntaram sobre a união civil, o Papa disse que têm também direito a usufrir de certos direitos, como, por exemplo, a assistência sanitária, a saúde, uma possibilidade de herança. Quando um casal homossexual vive junto, se um for ao hospital, o outro deve poder acompanhá-lo, dar assistência. Vivem juntos e têm uma vida, então devem existir algumas normas e leis que os ajudem, para que não sejam marginalizados e condenados a não se ajudar reciprocamente, mas o Papa não falou da união civil e do casamento entre homossexuais.
Qual acha que deveria ser a postura da Igreja timorense em relação aos casais do mesmo sexo? O que poderia fazer de diferente?
A Igreja timorense deve seguir a doutrina católica. Não discriminar, mas o verdadeiro casamento é entre um homem e uma mulher, conforme o projeto de Deus e a natureza humana. O casamento também é para que a humanidade continue.
Dois homens ou duas mulheres podem fazer sexo uma vida inteira, com todo o respeito, mas não nasce nada, não conseguem gerar uma vida nova. Esta só pode nascer num relacionamento amoroso, respeitoso e sexual entre um homem e uma mulher.
No entanto, não podemos negar o que é a realidade. Pois, se existem dois homens ou duas mulheres que fazem uma caminhada juntos, temos de acolhê-los e respeitá-los. Encontrar normas para não discriminar, tampouco criminalizar, mas não podemos dizer que este é um casamento e uma família. Esta é a posição da Igreja.
Timor-Leste (TL) é um Estado laico, mas, na realidade, a Igreja tem grande influência na decisão do Estado. Por exemplo, na questão de não incluir a disciplina de Educação Sexual no currículo. O que pensa sobre isto?
TL é um Estado laico. Laicidade não significa ser contra a fé. O próprio artigo 12.º da CRDTL (Constituição da República Democrática de Timor-Leste) diz que o Estado pode cooperar e colaborar com as confissões religiosas para o desenvolvimento da nação. A laicidade pressupõe uma colaboração.
Particularmente, a Igreja Católica é mencionada a partir do preâmbulo da Constituição timorense, que valoriza a sua contribuição no processo de criação do Estado de Timor. Portanto, é laico, mas tem um relacionamento especial com a Igreja Católica pela História e pela atualidade. 98% da população é católica.
Desconheço o assunto da educação sexual. É a primeira vez que estou a ouvir. Em princípio, uma educação sexual saudável deve acontecer na adolescência. Uma criança de 5 ou 6 anos não fala sobre isso, não tem ainda maturidade para entender a sexualidade, mas quando chega a adolescência, sim.
Uma educação saudável não está contra a doutrina da Igreja, se não ensinar os adolescentes a usar preservativos, a fazer abortos, a fazer sexo em qualquer momento como se fosse uma brincadeira.
Se a educação sexual estiver de acordo com a moralidade do evangelho, então concordamos. Uma educação que permita descobrir a riqueza, a beleza do corpo humano, do relacionamento sexual, na construção de uma família e amor do casal, sim, deve entrar na educação dos jovens.
A Lei Canónica, “1398” prevê que “o padre, bispo ou cardeal que comete “um crime contra um menor é punido com a privação do cargo e com outras penas justas, sem excluir, se o caso o merecer, a exoneração do estado clerical.” Acha que esta pena é suficiente?
Eu acho que, da parte canónica, é suficiente, não pode ser a Igreja a colocar na cadeia os que cometem este crime. Colaboramos com as autoridades civis para que o Estado julgue e condene os pedófilos conforme as leis do Estado, como aconteceu com o ex-padre Dashback, que foi condenado a 12 anos de cadeia. Deixou de ser padre e o Estado condenou-o.
Na maioria dos casos, os padres acusados de pedofilia são transferidos para outros lugares em “silêncio”, onde as pessoas não os veem. É uma forma de a Igreja punir um acusado?
Não, isto já não acontece. Acontecia até 2002 quando explodiu o escândalo em Boston sobre estas transferências. A Igreja tomou consciência ao nível do Vaticano. E os papas, João Paulo II, Bento XVI e Francisco aprovaram normas para que nunca mais haja transferências, ocultações e silêncio. No caso de Dashback, não foi transferido, mas privado do estado clerical.
Relativamente ao caso do ex-bispo de Díli, Ximenes Belo, porque será que só agora se sabe do caso? Terá a ver com o facto de os crimes, de acordo com a lei timorense, já terem prescrito? Enviá-lo para Portugal será um castigo quando as vidas das vítimas ficam para sempre afetadas?
Naquela época, quando deixou TL, renunciou. Não é que só se tenha sabido agora, mas ele deixou o cargo, porque estava com problemas de saúde física e mental.
Nunca apareceram vítimas a dizerem que foram abusadas, nem na nunciatura, nem na arquidiocese. Recentemente, saíram notícias de que a Congregação para a Doutrina da Fé, em Roma, sancionou o bispo Belo, em 2020, com sanções canónicas e que ele não pode voltar mais a TL, fazer celebrações públicas, usar as insígnias de bispo, dar entrevistas e várias restrições muito duras, como manter-se humilde na sua posição dentro da casa salesiana, em Portugal.
Não foi privado do estado clerical, porque não havia denúncias de vítimas, por isso, é diferente de Dashback. Ninguém encobriu o caso do bispo Belo. A Santa Sé tomou as suas decisões.
“Se houver, mesmo que seja apenas um caso, deve ser imediatamente investigado e sancionado da maneira mais severa possível”
Considera que este é um crime que continua a acontecer na Igreja timorense?
Sinceramente, espero que não. Se acontecer, é preciso denunciar. A Igreja timorense acaba de aprovar diretrizes muito sérias e severas para a proteção de menores. No caso de haver queixa, não pode ser ignorada, deve ser investigada e todo o material deve ser enviado para a Congregação para a Doutrina da Fé, em Roma. É necessário também colaborar com as autoridades do Estado, juízes e polícias, para que a pessoa seja investigada e julgada. Espero e rezo para que não haja casos. Se houver, mesmo que seja apenas um, deve ser imediatamente investigado e sancionado da maneira mais severa possível.
Não podemos aceitar que uma criança, um menor ou um adolescente, rapaz ou rapariga, seja abusado dentro da Igreja, que deveria ser um lugar seguro.
Depois das recentes descobertas, o que tem feito a Igreja Católica para controlar e evitar que mais casos destes aconteçam?
As diretrizes que foram aprovadas em Timor-Leste pela conferência episcopal, em 2021, foram aprovadas pela Congregação para Doutrina da Fé e estão em vigor. Estas diretrizes pretendem proteger os menores dentro da Igreja. Estão a ser divulgadas, explicadas e aprofundadas em todas as congregações. A Igreja está muito empenhada em pôr em prática estas diretrizes.
Que progressos podem e devem ser feitos pela Igreja católica em Timor-Leste?
A Igreja está a trabalhar na consciencialização das famílias, porque muitos casos de pedofilia acontecem no seio familiar. Através do sermão, da catequese, do trabalho feito junto dos jovens e do diálogo, podemos chegar à população. Temos de ajudar a amadurecer a ideia de que abusar de menores é contra o evangelho e contra a vontade de Deus. É um pecado gravíssimo. Acho que este é o maior progresso que fizemos.
A Igreja em Timor nao e bom catolico, nao possui uma mentalidade aberta, a julgar pelo padrao do representante do Vaticano.
Se o setor mais conservador do clero timorense não abrir a mente para os desafios da modernidade rapidamente os crentes abandonarão a Igreja que não ajuda a emancipar a pessoa humana e,sobretudo, a proteger as crianças e adolescentes que lhes foram confiados.
Em Portugal, como noutros países europeus, felizmente, a investigação sobre os crimes de pedofilia conhecem grandes avanços.
Em Díli encontramos, na via pública,grandes referências aos Direitos Humanos.
Pois é disso mesmo que se trata!
É uma notícia impressionante. Pode traduzir para lingua Tetum, assim que os timorenses possam comprender melhor. 😊🙂
Sou Timorense e BOM CATOLICO!
Apostolico
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As vezes, melancolico
Outras, diabolico
Com tanto problema as vezes, alcoolico
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Amante do Rai Doben, cronologico
Carlos Batista
Poeta de Timor