A 5.ª edição da marcha da diversidade, evento que celebra, desde 2017, a comunidade LGBTQIA+ em Timor-Leste, teve lugar ontem e contou com a presença de mais de 500 pessoas das mais diversas faixas etárias, orientações sexuais e identidades de género. Os participantes vestiram-se de arco-íris e caminharam juntos desde o Ministério dos Negócios Estrangeiros e Cooperação até ao porto de Díli para promover os direitos humanos e a diversidade em Timor-Leste.
O coordenador da iniciativa, Pepito Kadalak, 31 anos, informou que o evento visa aumentar a visibilidade das comunidades marginalizadas, “especialmente a LGBTQIA+, mas também as pessoas com deficiência e outros grupos que, muitas vezes, são desvalorizados e discriminados”.
Kadalak acrescentou que a iniciativa pretende juntar a população no sentido de celebrar a diversidade e alertar para a discriminação dos grupos vulneráveis e das minorias. “Há diferentes orientações sexuais e identidades de género. Não existe apenas uma cor no mundo. Somos feitos de muitas cores”.
Questionado se nota mudanças na forma como a comunidade LGBTQIA+ é tratada no país, o coordenador reconhece progressos. “Há cada vez mais pessoas a abordar o assunto e a exigir respeito. Fiquei muito feliz por este ano a marcha também ter tido lugar em Oecússe, o que revela o aumento de visibilidade”.
Presente no local, a secretária de Estado da Igualdade (SEI), Elvina Sousa Carvalho, alertou para o facto de a Constituição proteger todos os cidadãos. “A comunidade LGBTQIA+ faz parte da sociedade e tem direitos e obrigações como todos. A sociedade timorense, tal como qualquer outra, é diversa e a SEI, consciente dessa multiplicidade, faz questão de participar nesta iniciativa com o intuito de apelar para a necessidade de eliminar qualquer forma de discriminação e violência contra esta comunidade e contra qualquer grupo minoritário”.
Aju Lopes, 37 anos, membro da comunidade LGBTQIA+, lamenta que ainda haja muita discriminação e bullying. “Através desta marcha, exigimos que nos tratem com respeito e dignidade. Somos pessoas valiosas, com contribuições significativas para a sociedade”.
Por sua vez, Ismael Ribeiro, 47 anos, também membro da comunidade LGBTQIA+, participante na marcha desde 2018, considera que o Governo de Timor-Leste reconhece a existência da comunidade, “mas, espero que, entretanto, o Parlamento Nacional debata as mudanças que são necessárias fazer para garantir a inclusão da nossa comunidade”.
Acrescentou ainda que este tipo de iniciativa acontece em vários países e é importante no sentido de mostrar à sociedade que a comunidade LGBTQIA+ existe e reivindica os seus direitos. “Enfrentamos estigmas e discriminação da família e da sociedade, por isso, temos de apostar mais na sensibilização junto dos cidadãos, sobretudo nos municípios para garantir uma maior participação das pessoas que se integram neste grupo e que, muitas vezes, se sentem sozinhas. O evento é um apelo poderoso para que todas as pessoas se unam e lutem pelos direitos que nos são negados.”
Alita Verdial, 49 anos, familiar de um membro da Comunidade LGBTQIA+, participa nesta atividade desde 2017 para apoiar o seu irmão. “Aceito esta comunidade e dou todo o meu apoio para que seja reconhecida e possa usufruir dos direitos como qualquer cidadão timorense”.
Avançou ainda que é importante que a sociedade esteja informada quanto aos direitos desta comunidade. “Alguns membros já foram aceites pela família, mas muitos ainda não. A maioria não tem acesso à saúde nem oportunidades de emprego devido à orientação sexual ou identidade de género. São vítimas de agressões, bullying e discriminação, tudo fruto da ignorância da sociedade.” Alerta ainda para a necessidade de as famílias apoiarem e defenderem os familiares que integram esta comunidade. “Se não têm o apoio da própria família, para onde é que vão?”, questionou.
Silvério Pinto Batista, ex-Provedor dos Direitos Humanos e Justiça e patrono da marcha deste ano, afirmou que a defesa dos direitos da comunidade LGBTQIA+ é uma questão de direitos humanos. “Timor-Leste é um Estado de direito democrático, que tem o dever de proteger os direitos de todos cidadãos. A marcha é muito importante para mostrar à sociedade que não se pode continuar a discriminar as pessoas só porque têm uma orientação sexual ou identidade de género diferente da sua”, salientou o patrono do evento, que reconhece o papel fundamental do Ministério da Solidariedade Social e Inclusão na garantia de uma sociedade inclusiva.
Porém, o caminho a percorrer ainda é longo. No universo de oito ocorrências da palavra inclusão no programa do IX Governo Constitucional, não há nenhuma referência à comunidade LGBTQIA+ nem mesmo na secção de ‘Outros Grupos Vulneráveis’.