Jovens interrogados por demonstrarem solidariedade ao povo palestiniano vão apresentar queixa à Procuradoria da República de Díli

Caso deverá ser investigado pela Procuradoria da República/Foto: Diligente

Estudantes alegam que foram levados  por agentes da PNTL para uma esquadra por estarem a usar bandeiras da Palestina durante um concerto a 12 de Novembro. Dizem ainda que foram agredidos fisicamente e chamados de terroristas pelos polícias. Procurada pelo Diligente, a PNTL evitou dar declarações sobre o facto.

Na noite de 12 Novembro, data em que povo timorense homenageia as vítimas do Massacre de Santa Cruz, os estudantes Paulo dos Santos Soares, 27 anos, e Nelson Roldão Xavier, 32 anos, divertiam-se num concerto realizado no espaço do Ministério da Juventude, Desporto, Arte e Cultura (MJDAC), em Díli, quando, em determinado momento, colocaram, cada um, uma bandeira da Palestina às costas: queriam expressar solidariedade ao povo palestiniano, alvo de bombardeios e incursões militares israelitas na Faixa de Gaza. Poucos minutos depois, terão sido abordados por cinco agentes da Polícia Nacional de Timor-Leste (PNTL) e, sem grandes explicações, levados para a esquadra Na’in Feto, na capital.

No caminho e já na referida esquadra, os jovens alegam que foram agredidos fisicamente com bofetadas na cara, pontapés e golpes de cassetetes. Terão sido ainda chamados de terroristas, milícias e, em tom pejorativo, de muçulmanos – numa clara demonstração de ignorância e preconceito. Após serem interrogados, foram liberados à meia-noite, depois de duas horas e meia de constrangimento.

Apoiados pela associação Força Maubere para a Advocacia (FM Advocacy, em inglês), os jovens vão apresentar queixa à Procuradoria da República Distrital de Díli contra os agentes da PNTL, por considerarem que a atuação dos elementos foi ilegal e corresponde a um abuso de poder.

“Sabemos que somos livres de expressar os nossos sentimentos sobre o que está acontecer na Palestina, seja num concerto ou noutro sítio qualquer. Ter uma bandeira daquele país durante um evento não constitui um crime. A atuação da PNTL é um atentado contra a liberdade de expressão e contra o princípio da solidariedade internacional”, pode ler-se no comunicado de imprensa do movimento Frente Maubere para a Solidariedade Internacional (FMSI, sigla em tétum).

No documento, a Frente Maubere ainda classifica a atuação dos polícias como “uma violação aos direitos humanos e revela um comportamento semelhante a uma ditadura e a um regime autoritário”.

Captura

Paulo Soares contou ao Diligente que, passados cinco minutos de ele e o amigo estarem com as bandeiras da Palestina às costas, os agentes apareceram e os capturaram.

“Nunca pensámos que poderíamos ser levados para a esquadra, uma vez que não fizemos mal a ninguém, nem perturbámos o concerto. Apenas mostramos a nossa solidariedade com o povo palestiniano, que está a sofrer, tal como nós há 32 anos. Infelizmente, fomos levados para a esquadra sem qualquer justificação. Por isso, considero que esta atuação é ilegal e contraria os princípios de um Estado de direito democrático”, afirmou Paulo Soares.

O jovem reforçou que os membros da PNTL o obrigaram a dizer que morava em Ai-tarak Laran, perto da mesquita muçulmana. “Durante o interrogatório, só nos perguntaram o porquê de termos levado a bandeira e quem nos tinha mandado fazer isso. Relativamente à lei que supostamente estávamos a infringir, não disseram nada”, confidenciou.

Na carta de denúncia pública, emitida pela FM Advocacy, a associação enfatiza que o ato não representa nenhuma ilegalidade, e cita o artigo 10º, alínea 1 da Constituição da República Democrática de Timor-Leste, onde se lê: “A República Democrática de Timor-Leste é solidária com a luta dos povos pela libertação nacional.”

Por sua vez, o ativista Miguel Monsil, 29 anos, membro da FMSI, ressaltou que, inspirados pela solidariedade internacional para com os cidadãos timorenses nos tempos da resistência, os jovens quiseram aproveitar a comemoração do 12 de Novembro para demonstrar a sua empatia ao povo palestiniano, e lamentou a forma de agir dos polícias.

“Preocupo-me com o facto de alguns membros da PNTL não saberem interpretar as leis. Se não sabem servir de acordo com a lei e a ordem, atuam à toa. Os comentários que fizeram, para além de refletirem a sua ignorância, são também reveladores de um sentimento racista, uma vez que chamaram aos jovens muçulmanos, como se ser muçulmano fosse algo negativo. Então, em Timor-Leste só os católicos é que são livres de expressar as suas opiniões?”, questionou Miguel.

O Diligente tentou falar com a PNTL, mas a unidade de relações públicas e comunicação do Comando Geral disse não ter conhecimento da situação, solicitando que o Comando de Díli fosse procurado. Porém, o comandante da capital, Orlando Gomes, respondeu que o “relatório sobre esta situação já tinha sido entregue ao Comando Geral”. No dia seguinte (16.11), o Diligente foi confirmar a informação, contudo, alguns dos membros da PNTL do Comando Geral relataram que o porta-voz do superintendente António da Luz não estava disponível.

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