Insegurança alimentar elevada afeta cerca de 20% dos timorenses

Crianças fazem fila para receberem a merenda escolar/Foto: Diligente

Cerca de 300 mil cidadãos, o equivalente a 22% da população, enfrentaram, entre novembro de 2022 e abril passado, insegurança alimentar elevada. Prevê-se que, relativamente ao período entre maio e setembro deste ano, a percentagem seja de 20%, o correspondente a 262 mil pessoas, uma ligeira redução que se deve ao período das colheitas e pós-colheitas.

Considerada um fenómeno de curta duração, ligado a “choques” de de origem humana ou invulgares, como os resultantes do clima, a insegurança alimentar em Timor-Leste, precisa de “ação urgente”. É atribuída “aos preços altos dos alimentos, ao baixo poder de compra, aos efeitos persistentes da pandemia covid-19 e às cheias de 2021”. Os dados resultam da primeira classificação de Insegurança Alimentar Aguda do IPC (Classificação Integrada de Fases de Segurança Alimentar).

Com objetivo de sensibilizar para o impacto da insegurança alimentar na saúde da população, realizou-se, esta quarta-feira, um seminário científico subordinado ao tema “Perspetivas para uma alimentação segura em Timor-Leste”.

Organizada pelos estudantes do curso de Nutrição e Dietética da Universidade Nacional de Timor Lorosa’e, em parceria com a Organização Mundial de Saúde (OMS), a iniciativa decorreu no âmbito do Dia Mundial da Segurança Alimentar, que se assinala a 7 de junho.

Para combater os valores elevados de má nutrição em Timor-Leste, Rofino Soares Gusmão, Diretor Nacional da Segurança Alimentar no Ministério da Agricultura e Pescas (MAP), alertou na conferência para a necessidade de “intervenção de todas as linhas ministeriais, porque o problema não é só do MAP, mas de todos os ministérios”. Destacou também como necessária “a diversificação agrícola no contexto de distribuição, de utilização dos alimentos e da assistência técnica para se poder garantir uma alimentação saudável e adequada a toda a população timorense”. Como maiores obstáculos, apontou “as falhas da coordenação entre os ministérios relevantes e o facto de não haver dinheiro suficiente para ações de sensibilização”.

O diretor indicou ainda os desafios enfrentados pelos agricultores, que passam pelas infraestruturas, equipamentos e recursos humanos: “Máquinas avariadas, falhas no sistema de irrigação e a idade avançada da maioria dos agricultores estão entre as são maiores dificuldades para conseguirmos um aumento da produção”.

A grande maioria dos agricultores timorenses privilegia a agricultura de subsistência: “Só produzem para comer e não o suficiente para vender”. O problema agrava-se com o crescimento da população, que “faz com que a procura de alimentos também aumente. Por outro lado, o impacto do clima também afeta a nossa produção”, concluiu Rofino Soares Gusmão

Mário Moreira dos Reis, representante da Direção Nacional de Nutrição do Ministério da Saúde, considera que “a maioria da população ainda não possui conhecimentos para escolher os alimentos mais adequados e preparar refeições nutritivas”, o que resulta, muitas vezes, em problemas como “a má nutrição, nanismo, obesidade ou deficiências”.

Segundo o nutricionista Marcos Salgário, Timor-Leste “precisa urgentemente de mais educação alimentar”. É importante que o Governo “seja mais interventivo através da criação de programas para erradicar a subnutrição e garantir a segurança alimentar”. Para o especialista, “o Estado deve também investir nos recursos humanos, formados nas universidades em Nutrição, mas que acabam por não ter colocação no mercado de trabalho”.

Já Arvind Mathur, representante da Organização Mundial de Saúde (OMS) em Timor-Leste, destacou a necessidade de se garantir alimentos seguros e nutritivos para todos, porque “cerca de 600 milhões de pessoas no mundo, ou seja, uma em cada dez pessoas no mundo, a cada ano, contraem doenças por causa de alimentos contaminados”.

“O impacto destas doenças é particularmente grave nos nossos jovens e nas pessoas com recursos limitados”, salientou, relativamente à realidade de Timor-Leste. “É necessário um trabalho de sensibilização para aspetos essenciais como a prevenção, deteção e gestão dos riscos através de práticas sólidas de segurança alimentar”. Nesse sentido, o representante da OMS alertou para a importância de uma participação efetiva das autoridades relevantes na procura de soluções inovadoras que identifiquem as melhores práticas para a saúde humana, em áreas como o comércio, a agricultura e o desenvolvimento sustentável”.

A insegurança alimentar resulta da falta de acesso a alimentos em quantidade e qualidade suficiente para sobrevivência, como define a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO).

De acordo com os dados de classificação de Insegurança Alimentar Aguda do IPC, tanto de novembro a abril como na projeção de maio a setembro, os municípios de Díli, Baucau e Ataúro são classificados como em fase de ‘stress’ e os restantes numa situação mais séria de ‘crise’.

Situação da insegurança alimentar aguda em Timor-Leste. Fonte: IPC

A análise distingue o nível de insegurança alimentar em cinco fases distintas: mínima ou nenhuma insegurança alimentar aguda (1); ‘stress’ alimentar (2); crise alimentar (3); emergência alimentar (4); catástrofe ou fome (5). A insegurança alimentar elevada abrange as fases 3 e 4 do IPC.

Relativamente ao período de maio a setembro deste ano, a ligeira melhoria resulta dos efeitos esperados das colheitas: ofertas de trabalho na agricultura, mais disponibilidade de alimentos no mercado e aumento do stock de alimentos de famílias que dependem da agricultura. Os resultados estão, contudo, dependentes de “choques climáticos”, como inundações, que podem afetar 70% dos agricultores. Os preços também não deverão baixar aos valores anteriores à pandemia.

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