Assessor jurídico cita receio de que acessórios tenham câmaras. Circular menciona a necessidade de proteger a privacidade dos pacientes.
Desde ontem, 25 de março, é proibido usar óculos escuros no interior do Hospital Nacional Guido Valadares (HNGV), com exceção do presidente da República, membros do Governo, Parlamento Nacional e Tribunal. A medida, segundo o assessor jurídico do HNGV, Zezito Fátima Martins Correia, foi tomada devido ao receio de que os acessórios tenham câmaras incorporadas, o que põe em causa a privacidade dos pacientes.
Na circular, assinada pela diretora-executiva do HNGV, Cecília Barros, onde consta esta medida, proíbe-se também a captura de imagem e vídeo dentro do estabelecimento hospitalar.
O documento foi emitido no dia 19 de março. Segundo Zezito Correia, as novas regras baseiam-se no artigo 36º da Constituição da República Democrática de Timor-Leste, que menciona o direito à honra e à privacidade e no artigo 38º, sobre proteção de dados pessoais. O artigo 183º do Código Penal pune com pena de prisão de um ano ou multa os indivíduos que não respeitem a privacidade, bom nome e imagem dos outros.
“Quando há acidentes e os pacientes são trazidos para o hospital, há quem tire fotografias e as publique nas redes sociais sem autorização. Então, quando os pacientes recuperam, ficam surpreendidos ao verem a sua imagem exposta”, realçou. Esta situação, destacou o assessor jurídico, tem levado a inúmeras queixas por parte dos utentes e dos seus familiares.
Zezito Correia informou que o registo audiovisual do interior do HNGV só será permitido com anuência da diretora-executiva e do conselho diretivo do hospital.
O assessor jurídico enfatizou que a medida, especialmente a parte que proíbe cidadãos de usar óculos escuros no HNGV, não se trata de discriminação. Na avaliação do jurista, os membros do Governo, do Parlamento Nacional e o Presidente da República “não têm más intenções”.
“A direção do HNGV não está contra a liberdade de expressão das pessoas, mas quer garantir a qualidade do atendimento, sobretudo no que diz respeito à proteção da privacidade, por isso, temos de limitar os direitos dos cidadãos”, salientou. Zezito Correia ainda partilhou que a circular vai ser revista, “no sentido de especificar os espaços onde não é permitido o uso de óculos escuros”.
Para implementar as novas regras, a direção do HNGV está a coordenar com os chefes das unidades hospitalares, funcionários e profissionais da saúde de forma a controlarem os visitantes. Os agentes da Polícia Nacional de Timor-Leste (PNTL) e os seguranças do hospital já receberam orientações para expulsarem as pessoas do HNGV, em caso de descumprimento das novas regras.
Um segurança do HNGV que prefere não revelar a identidade por medo de represálias, afirmou que ele e os colegas estão a par das instruções e vão controlar os visitantes.
O que dizem os cidadãos
Um visitante no HNGV, Norberto da Cruz, 60 anos, concorda com as novas regras. “Mesmo que algumas pessoas publiquem fotografias e vídeos com o objetivo de informar, se os pacientes não se sentem confortáveis e não autorizam, é preciso criar regras para proteger a sua privacidade”, disse.
Relativamente à proibição de utilizar óculos escuros, considera que o acessório é importante para proteger os olhos e “não faz sentido esta proibição. É uma questão de saúde”, defendeu.
Para Maria de Jesus, 25 anos, estudante da Universidade Nacional de Timor Lorosa´e (UNTL), a partilha de imagens do HNGV nas redes sociais sobre pacientes, na maioria dos casos acontece com o intuito de se identificar algum familiar de determinado paciente, “porque, muitas vezes, chegam ao hospital acidentados sem familiares”.
A estudante pede à direção do HNGV que esclareça a norma que proíbe o uso de óculos escuros, porque, a seu ver, trata-se de discriminação. “Qualquer pessoa deve ser livre de usar óculos. O HNGV não pode proibir”, destacou.
O jurista Armindo Moniz afirmou que esta circular surge no seguimento da insatisfação por parte de muitos pacientes. “Muitos utentes, descontentes com o atendimento dos profissionais de saúde, querem gravar o que se passa para terem provas do mau serviço. Por isso é que foram criadas estas regras. Não é para proteger a privacidade dos pacientes”, argumentou.
“Há muitos casos de irregularidades entre pacientes e pessoal de saúde e os cidadãos têm o direito de se defender, para isso, precisam de fotos e vídeos. Sem estas provas, é difícil acusar os profissionais de saúde”, sublinhou.
Armindo Moniz observou ainda que as regras devem ser aplicadas a todos, sem exceção. “Temos de tratar todos os cidadãos de forma igual, exceto os invisuais ou indivíduos com problemas de visão e que necessitam obrigatoriamente de usar este acessório”, concluiu.
O que acontece a quem la vai com oculos cor de rosa?