Do inferno ao Céu: a história da Obralan Marka Di’ak

Loja fica em Campo Alor, em Díli, e funciona diariamente das 9h às 20h/Foto: DR

Jovem voltou a investir no negócio de venda de roupa de marca em segunda mão depois da pandemia de covid-19 e agora testemunha o crescimento da loja, conseguindo ajudar a família.

Maria do Céu Jorge Oliveira Gusmão, mais conhecida como Céu, é uma empresária timorense de 28 anos. De Liquiçá, Céu é proprietária da empresa “Obralan Marka Di´ak” (OMD).

Cresceu sem pai, que abandonou a mãe grávida de três meses, e resistiu à pobreza até encontrar o seu caminho como empreendedora, vendendo roupas de marca em segunda mão.

Muitas vezes sentiu-se discriminada, devido à ausência paterna. Apesar de protegida pela mãe e pelos avós maternos, a situação deixava-a triste e magoava-a, “como uma ave que partiu uma das asas”. Contudo, fortaleceu-se com o tempo.

Durante o primeiro e o segundo ciclo, frequentou a escola primária número 9 de Aimutin, em Díli, com o apoio financeiro dos avós, porque a mãe, como empregada doméstica, ganhava pouco.

No sétimo ano, mudou-se para a escola 10 de dezembro, em Comoro, e, no nono, para a escola pública número 1 de Liquiçá.

Devido ao seu bom desempenho escolar, foi contemplada com uma bolsa de estudo da Fundação Alola e, em 2013, concluiu o ensino secundário. A Fundação Alola é uma Organização Não Governamental que promove ações na defesa dos direitos de mulheres e crianças.

No mesmo ano, foi selecionada para participar, até 2015, no programa Parlamento Jovem, criado pela Secretaria de Estado da Juventude e do Desporto (SEJD), com o intuito de promover a cidadania dos jovens.

Em 2014, começou o seu percurso no ensino superior, frequentando o curso de contabilidade no Institute Of Buisness (IOB) com o apoio da mesma bolsa da Fundação Alola.

O seu primeiro emprego foi numa agência internacional alemã (GIZ), entre 2016 e 2017, como tradutora do inglês-tétum e vice-versa. Com a não renovação do contrato, viu-se desempregada e decidiu vender refeições para estudantes da Universidade Nacional Timor Lorosa’e (UNTL), atividade que interrompeu pouco depois, porque o local de venda estava em obras.

A necessidade de ganhar dinheiro e ajudar a família levou Céu a desistir do curso de contabilidade no IOB, em 2017. Foi então que decidiu apostar no comércio de roupas em segunda mão, inspirada pelo negócio de algumas colegas da Fundação Alola. Com apenas um investimento de 20 dólares, criou em 2018 a “Obralan Marka Di’ak”. A loja funcionava em um espaço na mesma casa onde morava, em Surik Mas, Díli. Céu sentia que o seu estabelecimento crescia, mas a pandemia de covid-19, em 2020, obrigou-a a interromper a atividade.

Por sorte, conseguiu um trabalho no setor de comunicação da UNICEF, onde ganhava 500 dólares. Em 2021, com o contrato a acabar, Céu teve a oportunidade de o renovar, mas, com a pandemia já controlada, decidiu não o fazer e focar-se na venda de roupas de marca em segunda mão.

A empresária Céu, dona da OMD/Foto: DR

Arrendou uma casa em Campo Alor e retomou a OMD com o dinheiro que havia economizado. Com uma clientela já conhecida, não demorou para a loja voltar a crescer. Hélio Soares é um dos clientes assíduos. Gosta de comprar roupa na OMD, porque “a seleção é de qualidade e não encontramos mais ninguém com roupa igual”. Considera que o preço é justo e proporcional à qualidade das peças e à simpatia do atendimento. Atualmente Céu emprega duas pessoas.

A loja funciona diariamente, das 9h às 20h. As peças vêm de mercados em Díli e são cuidadosamente selecionadas pela própria Céu. A empresária não revela quanto ganha, mas adianta que a tem dado um bom retorno financeiro e que ainda consegue ajudar a família.

No ano passado, a empreendedora viu o seu esforço reconhecido pelo Governo, que a convidou para representar Timor-Leste em Jakarta, na Indonésia, em abril, com jovens de outras nações, no evento ASEAN Youth Dialogue (Diálogo dos Jovens ASEAN).

A mãe de Céu, Olívia Jorge Olivéria dos Santos, com 53 anos, diz-se orgulhosa do esforço da filha para ajudar a família, que chegou mesmo a pagar os estudos do irmão mais novo no Colégio de Santo Inácio de Loiola. “É uma escola cara, mas a Maria esforçou-se muito para conseguir que o irmão estudasse lá”, confidenciou. Para além disso, com a ajuda da Céu, conseguiram construir uma casa em Liquiçá.

Céu encoraja os jovens timorenses a não perderem a esperança, “pois com esforço e dedicação, tudo é possível, mesmo que o sucesso demore”. Ao Governo, pediu para identificar o potencial dos jovens e contribuir para que o desenvolvam. “A rejeição da sociedade só acontece quando não temos nada, por isso temos de resistir até sermos valorizados”, conclui.

Paixão pelo xadrez

A empresária destemida, no tempo livre, gosta de dedicar-se ao xadrez, jogo que conheceu em 2018, quando vendia comida aos estudantes da UNTL.

Céu conta que demorou dois anos para aprender e melhorar a sua prática, vindo a vencer uma competição nacional já em 2020. No mesmo ano, o IOB convidou-a para representar a instituição num torneio nacional entre universidades. Céu aceitou e saiu vencedora entre as mulheres.

blank
Céu e as colegas na Olimpíada Mundial de Xadrez/Foto: DR

Em 2021, a jovem foi convidada a integrar a equipa feminina de Timor-Leste para participar da Olimpíada Mundial de Xadrez, em Chennai, na Índia. No torneio, Céu disputou sete partidas: venceu duas, empatou outras duas e perdeu três.

“Gosto de jogar xadrez, pois obriga-nos a pôr o cérebro a funcionar. Temos de ponderar bem antes de fazer um movimento. E isso reflete-se na minha vida. Penso muito antes de tomar qualquer decisão, para não me arrepender depois e levar um xeque-mate”, observou.

Ver os comentários para o artigo

  1. Parabens Ceu!
    Li que o PR concedeu 1.5 milhoes para o presepio.
    O Povo de TL precisa de “Presepio Realidade”,
    precisa que a vaquinha, o burro, as ovelhas, os reis magos etc.. sejam trocados por saude, educacao, emprego etc… e o Povo nao se importa que venha em segunda mao pois ate ao momento nem de rastos
    A Ceu com aquela bagalhoca toda, como mulher empreendedora, daria ao nosso Povo um verdadeiro “presepio realidade” com estrela e tudo.
    Como podem notar nao impliquei com o menino jesus, sao jose, virgem maria ou manjedoura.
    Eles todos ficam, vem ai o Papa!

Comente ou sugira uma correção

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

Open chat
Precisa de ajuda?
Olá 👋
Podemos ajudar?