Dia Nacional das Pessoas com Deficiência: “Não precisamos de caridade nem de pena, precisamos de oportunidades”

Portadores de deficiência enfrentam dificuldades de acessibilidade nos espaços públicos/Foto: ADTL

Timorenses portadores de deficiência queixam-se da falta de critérios básicos de inclusão, como rampas de acesso nos espaços públicos, escolas específicas e livros em braille.

Hoje, 4 de julho, comemora-se, pela primeira vez em Timor-Leste, o dia Nacional das Pessoas com Deficiência, data que visa sensibilizar a sociedade para a promoção dos direitos dos cidadãos com algum tipo de limitação. Segundo o censo de 2022, existem 17.061 deficientes no país, dos quais 8517 são homens e 8544 mulheres.

Os timorenses portadores de deficiência reclamam que os seus direitos não são respeitados e exigem que o Governo implemente ações para garantir a sua integração na sociedade de maneira igualitária e sem preconceitos.

O Orçamento Geral do Estado (OGE) deste ano alocou cerca de 179 mil dólares para a Direção Nacional da Proteção das Pessoas com Deficiência. Até ao momento, foram executados apenas 15,5% dessa quantia, de acordo com o Portal de Transparência do Orçamento de Timor-Leste.

Beatriz Sarmento, 24 anos, deficiente visual, afirmou que parou de estudar devido à falta de professores qualificados e materiais didáticos apropriados, como livros em braille. “Assim como eu, muitas pessoas abandonam os estudos por não conseguirem acompanhar as aulas”, lamentou. Beatriz pede que as autoridades competentes, como o Ministério da Educação, invistam na criação de escolas específicas para os portadores de deficiência.

A jovem ainda enfatizou que, no país, quase não há rampas de acesso nos espaços públicos para as pessoas que usam cadeiras de rodas. “Critérios básicos de inclusão não são respeitados”, queixou-se.

O coordenador do programa Open the Book de Raes Hadomi Timor Oan (RHTO), Júnior da Costa, 29 anos, destacou que ainda há muita discriminação na sociedade contra os homens e mulheres com alguma limitação, inclusivamente no seio familiar. “Muitas pessoas, sobretudo nas áreas rurais, por falta de informação, ainda usam terminologia pejorativa e estigmatizante quando se referem a nós, o que tem um grande impacto na nossa saúde mental”, desabafou.

Júnior está consciente de que estes problemas exigem mais atenção por parte do Estado. “Devem apostar mais na sensibilização da sociedade para este tema, pois o que está em causa são os direitos humanos”, observou.

O jovem realçou que, apesar das dificuldades, “todas as pessoas portadoras de deficiência têm capacidade de contribuir para o país, mas precisam de condições adequadas. Não precisamos de caridade nem de pena, precisamos de oportunidades”.

Por sua vez, a gestora da Associação dos Deficientes Timor-Leste (ADTL), Verónica Tilman, reforçou a importância do dia, que deve servir para relembrar que “é o momento de lutar por uma sociedade mais inclusiva e propor medidas que garantam acessibilidade e participação de cidadãos com deficiência”.

Verónica lembrou que, no país, existem várias estratégias para defender e impulsionar os direitos das pessoas com alguma limitação, como por exemplo a Política Nacional para a Inclusão e Promoção dos Direitos dos Deficientes, o Plano de Ação Nacional para as Pessoas com Deficiência e a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, ratificada pelo Parlamento Nacional no ano passado. Contudo, as ideias não se refletem na prática, sublinhou Verónica.

“A política e a legislação estão bem definidas, mas os ministérios ainda não mostram ações reais, sobretudo na alocação de orçamento para a inclusão dos cidadãos com deficiência”, avançou. Deu o exemplo do Ministério da Educação, que tem um departamento de educação inclusiva, “no entanto, as escolas ainda não estão prontas para receber e ensinar pessoas com deficiências visuais e auditivas”, evidenciou Verónica.

Para celebrar o Dia Nacional das Pessoas com Deficiência em Timor-Leste, data instituída em março através do decreto-lei n.º 10/2023, a ADTL e os seus membros realizaram, nas suas instalações, um diálogo entre pessoas do grupo vulnerável e autoridades do Governo.

A Secretaria de Estado para a Igualdade e Inclusão informou que apoia cidadãos com deficiência na realização de atividades, como por exemplo na abertura de negócios e criação de animais, bem como organizações, como a RHTO e outras.

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  1. Cordeais saudações;
    Para além de lhes dar as boas vindas, ao meu espaço do Facebook, quero também felicitar-vos pela publicação deste trabalho que oxalá sirva para “despertar consciências” a quem de direito, já que sobre o assunto das acessibilidade e respeito para com as pessoas deficiências físicas, a ONU, na sua importante convenção sobre os direitos a pessoas com deficiência, determinou a garantia da igualdade a todos.

    E depois, é importante discutir as questões ligadas à acessibilidade devido ao facto de estas ainda serem tratadas com certa timidez em vários países do mundo apesar de sua consistente legislação.

    Por isso, é importante dar voz aos que reclamam do preconceito, do descaso e da forma “invisível” como são tratados.

    Porém, como todos sabem, o cumprimento dos direitos à acessibilidade passa por investimentos destinados a melhorias e adaptações, e estes recursos financeiros são, freqüentemente, insuficientes, mal geridos e o que é pior, acabam muitas vezes sendo desviados pela corrupção instalada nesses países.

    Assim é louvável a vossa “chamada de atenção” sobre este importante assunto e oxalá que as autoridades timorenses executem um Plano Diretor Nacional que seja obrigatório cumprir e que dele deverá conter um plano de vias acessíveis sobre os passeios públicos a serem implantados ou reformados pelo poder público, com vistas a garantir acessibilidade da pessoa com deficiência ou com mobilidade reduzida a todas as rotas e vias existentes, inclusive as que concentrem os focos geradores de maior circulação de pedestres, como os órgãos públicos e os locais de prestação de serviços públicos e privados de saúde, educação, assistência social, esporte, cultura, correios e telégrafos, bancos, entre outros, sempre que possível de maneira integrada com os sistemas de transporte coletivo de passageiros.
    Oxalá que estes anseios se tornem realidade.
    Foi um prazer estabelecer contacto convosco.
    Sejam bem vindos!!
    Com os melhores cumprimentos;
    João Machado

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