Assinala-se hoje, 1 de maio, o Dia do Trabalhador. Em Timor-Leste, a realidade da classe trabalhadora é, excetuando as franjas mais privilegiadas da sociedade, uma de duas, ou o desemprego, ou um trabalho com condições precárias. O valor do salário mínimo aplicado à função pública é de 115 dólares, o mesmo que a Comissão Nacional do Trabalho (CNT) estabeleceu para o setor privado, em 2012. Mais de dez anos depois, não houve ainda uma única atualização.
Funcionários de limpeza, seguranças e empregados da área da restauração são os que mais lamentam os baixos salários e se queixam de serem explorados, de terem péssimas condições de trabalho e de trabalharem horas extraordinárias sem serem remunerados.
O Diligente falou com alguns trabalhadores que sentem que os seus direitos não têm sido respeitados. Nenhum quis ser identificado por medo de perder o emprego: “é uma estratégia de sobrevivência”, explicou uma das fontes.
Eram duas da tarde, quando encontrámos Afonso (nome fictício), segurança de 49 anos, e dois colegas, numa rua do centro de Díli. Os três, impecavelmente fardados com o uniforme de segurança, estavam sentados à frente do portão do local de trabalho, sob um sol brilhante que prometia uma tarde muito quente.
“Já há muito tempo que procuramos um órgão de comunicação social para falarmos sobre os nossos direitos, porque ninguém aborda este problema com seriedade”, lamentou Afonso.
Apesar de cumprirem, diariamente, os seus deveres, sentem que os seus direitos estão a ser colocados “debaixo do tapete” para não serem notados nem discutidos, contou o segurança. “Aqui trabalhamos de segunda a sexta-feira, mas, na maioria das vezes, trabalhamos também nos fins de semana e alguns feriados. No entanto, a empresa não nos paga as horas extraordinárias”, revelou.
Xisto (nome fictício), 34 anos, é cozinheiro num hotel em Díli, desde 2011. “Antes, trabalhava de segunda a sábado e só tinha folga ou ao sábado ou ao domingo, mas nem sempre tinha uma dessas folgas. Em 2016, comecei a questionar-me sobre o porquê de não gozarmos também os feriados, de fazermos muitas horas extraordinárias sem serem pagas e de auferirmos apenas 120 dólares mensais.”
O cozinheiro decidiu pedir ajuda ao sindicato “Trabalhador para a Libertação Nacional” (TRABALIAN), para se informar sobre os direitos dos trabalhadores. “Comecei a aprender a lei laboral e expliquei aos meus colegas que já trabalhavam no hotel desde 2002. Desde essa altura até 2016, ano em que tomei a iniciativa de reivindicar o aumento salarial, só ganhavam 120 dólares por mês.”
Perante esta situação, Xisto e os colegas (140 trabalhadores), juntaram-se ao movimento TRABALIAN para, diplomaticamente, apresentarem as suas reivindicações ao gerente do hotel. “Apresentámos as nossas preocupações, tendo por base a lei do trabalho. Depois desta conversa, o gerente aumentou o nosso salário de 120 para 260 dólares e passamos a ter 2 dias de descanso semanal.”
Maria (nome fictício), 37 anos, empregada de limpeza numa universidade da capital, em entrevista ao Diligente, contou que tem oito filhos para sustentar e que, “aqui nem temos um lugar apropriado para almoçar. Aproveitamos a sala de arrecadação da Universidade para almoçar e descansar um pouco, mas eu não me importo muito com as condições de trabalho, eu só quero que o Governo aumente o nosso salário, porque 115 dólares mensais não chegam nem para duas semanas. Depois tenho de pedir dinheiro aos meus familiares ou colegas para sustentar os meus filhos.”
Marito, (nome fictício), 27 anos, desempenhava no ano passado, três funções ao mesmo tempo na mesma empresa: segurança, funcionário de limpeza e analista de logística. “Trabalhava arduamente, mas só recebia 115 dólares. Acho muito injusto, porque trabalhava tanto e ganhava tão pouco. Para piorar a minha situação, recebia sempre tardíssimo. Tive de trabalhar como ajudante de construção civil, para ajudar os meus pais e assegurar as minhas necessidades básicas enquanto esperava o salário.”
Em declarações ao Diligente, o presidente do sindicato “Trabalhador para a Libertação Nacional” (TRABALIAN), Julito Benevides, lamenta que a falta de emprego seja um dos principais fatores a obrigar os trabalhadores a sujeitarem-se a condições precárias de trabalho e a qualquer tipo de tratamento vindo dos patrões.
“Os problemas que a esmagadora maioria dos trabalhadores têm enfrentado e de que dão conta ao sindicato são trabalhar horas extraordinárias sem serem pagos e o valor do salário mínimo ser baixo, insuficiente para as necessidades básicas”, avançou o presidente.
Julito Benevides contou que, em 2017, o TRABALIAN juntamente com a Secretaria de Estado da Formação Profissional e Emprego (SEFOPE) e vários empresários timorenses discutiram, em Tibar, Liquiçá, o aumento do salário mínimo e “chegámos à conclusão de que deveria aumentar de 115 dólares para 155. Passados seis anos, o salário mantém-se e nunca ninguém tocou mais no assunto.”
Um dos principais serviços prestados pelo sindicato TRABALIAN é dar assistência jurídica aos trabalhadores, nomeadamente, informar os funcionários dos seus direitos e deveres.
Por sua vez, a presidente da comissão para as mulheres da KSTL (Confederação dos Sindicatos de Timor-Leste, em português), Eduarda Miranda Branco explicou, hoje, no âmbito do evento organizado pela confederação para assinalar o Dia do Trabalhador, na sede da KSTL, que, nesta data, se pretende consciencializar os empregadores, principalmente em Timor-Leste, para a importância dos direitos dos trabalhadores.
A presidente acrescentou que “é altura de falar sobre o salário mínimo em Timor-Leste. Já há 10 anos que os trabalhadores têm exigido esse direito, mas sem resultados“.