Num país onde o investimento na educação não ultrapassa os 10% do orçamento geral do estado (OGE), uma boa parte dos jovens prefere não continuar os estudos por não confiar no sistema educativo de Timor-Leste. Os que decidem continuar a estudar apontam o dedo às falhas de um sistema que temem poder hipotecar o seu futuro e o do país.
O Diligente falou com alguns destes jovens que, de alguma forma, experienciaram ou experienciam este desânimo face à realidade atual do ensino timorense. As queixas são várias, desde a falta do básico, como livros atualizados, salas de aula insuficientes, falta de professores ou a ausência de formação destes e a dificuldade de ensino em português, o que, segundo os entrevistados, afeta a qualidade do sistema educativo.
Nélcia Belo, de 24 anos, começou a estudar Engenharia Civil numa das várias universidades timorenses, em 2015. No entanto, logo no seu segundo ano, em 2017, desistiu do curso, porque se deparou com dificuldades que travaram o seu percurso. “Falta de livros e de manuais didáticos na biblioteca e professores muito desinteressados foram as principais causas da minha desistência. Decidi não continuar na mesma faculdade e procurar oportunidades para estudar no estrangeiro.” Em 2019, conseguiu uma bolsa de estudos no programa China Scholarship Council (CSC), que resulta da cooperação entre o Governo da China e de Timor-Leste. Frequenta atualmente a licenciatura em Ciências Políticas e Administração Pública na Southwest University, na China.
“Só alguns professores utilizam as duas línguas oficiais para ensinar, a maioria utiliza quatro línguas ao mesmo tempo: português, tétum, língua indonésia e inglês”
Elcheta Belo, atual finalista do departamento de Agro Socio-Economia na UNTL, queixa-se do facto de os professores recorrerem a quatro línguas, em simultâneo, durante o processo de ensino-aprendizagem, “o que dificulta a aprendizagem. Esta situação preocupa-me e noto que os meus colegas também sentem estes entraves, mas não questionam os docentes”. A estudante reforça que “só alguns professores utilizam as duas línguas oficiais para ensinar, a maioria utiliza quatro línguas ao mesmo tempo: português, tétum, língua indonésia e inglês para explicar a matéria durante a aula e permite que respondamos às perguntas dos exames em qualquer língua. Como eu domino a língua inglesa, utilizo-a para estudar e fazer pesquisa. Nos exames, escrevo em tétum ou português, mas percebo as dificuldades dos meus colegas em relação à escrita. No entanto, como eles não questionam, faço o que tenho de fazer e não abordo esta questão”.
Em entrevista ao Diligente, a professora de Biologia da Faculdade de Educação, Artes e Humanidades (FEAH) da UNTL, Maria Lurdes Cardoso, explica que “daquilo que é o meu conhecimento, normalmente, todos os docentes usam o tétum e o português no processo de ensino-aprendizagem, mas não posso garantir que isso aconteça sempre”. Para evitar os constrangimentos sentidos pelos alunos, a professora defende que sejam utilizadas apenas duas línguas oficiais no ensino: o português como língua de instrução e o tétum como língua auxiliar.
“As línguas de ensino do sistema educativo timorense são o tétum e o português”, como pode ler-se na lei de bases da educação (artigo 8.º Lei n.º 14/2008).
“A disciplina de ciências deve ser aprendida em português, porque o tétum não tem vocabulário técnico para o fazer, sendo pedagogicamente impossível”
Por sua vez, o coordenador do Gabinete de Avaliação e Desenvolvimento Curricular do Ministério da Educação, Juventude e Desporto, Mateus dos Reis, reconhece lacunas no processo de ensino-aprendizagem, como a falta de domínio da língua portuguesa por parte de alguns professores que optam por lecionar noutros idiomas em que se sentem mais à vontade. “A escassa ou inexistente formação dos docentes na área da pedagogia e a falta de recursos humanos qualificados no setor prejudicam diretamente a qualidade do ensino”, considera.
Acrescenta ainda que, apesar de tudo, “estas dificuldades representam um desafio para o Governo timorense investir mais na área da educação, sobretudo nos recursos humanos qualificados.”
Dá o exemplo de “alguns engenheiros e licenciados em matemática que não têm formação pedagógica que lhes permita ensinar, mas devido à falta de professores, acabam por fazê-lo, o que, obviamente, compromete a qualidade de todo o processo de ensino-aprendizagem”.
Questionado sobre a utilização de várias línguas durante as aulas, o coordenador considerou como “um ato de irregularidade, se tivermos em conta a lei de bases da educação”.
Mateus dos Reis defende a importância da língua portuguesa no ensino, porque segundo ele, é uma língua estruturada e padronizada. “A disciplina de ciências, por exemplo, deve ser aprendida em português, porque o tétum não tem vocabulário técnico para o fazer, sendo pedagogicamente impossível”, reforça.
Relativamente ao nível de qualidade do ensino, o coordenador defende que “a qualidade não é assim tão má. Vamos ser realistas, vivemos num país com 21 anos de independência, não estamos a falar de um país que tem 50 ou 100 anos. É normal que Timor-Leste enfrente estas dificuldades. O mais importante é estarmos todos a trabalhar para melhorar o setor da educação”.
Realça ainda que a formação contínua de professores no Instituto Nacional de Formação de Docentes e Profissionais (INFORDEPE) é um indicador de que o Governo está a trabalhar nesta área. A atribuição de bolsas de estudo, que resultam da cooperação entre países lusófonos e outros países, também demonstra a preocupação do executivo. “O importante é reconhecer as nossas falhas, trabalhando diariamente para melhorar e evoluir com o tempo”, destaca.
Quanto às mudanças necessárias para a melhoria do sistema educativo no país, o coordenador sublinha que é preciso “maior investimento financeiro e mais formações, não só para os professores existentes, mas também para os jovens recém graduados na área da educação”.
O valor proposto pelo Governo, neste ano, para o Ministério da Educação, Juventude e Desporto foi de 122 milhões de dólares, 9% do OGE, valor inferior aos anos anteriores.
O coordenador da pesquisa e advocacia para a educação da fundação MAHON (Many Hands, One Nation), em Díli, Crispim Gomes de Jesus, corrobora que o investimento para o setor da educação é muito reduzido. “Se pararmos para pensar, o valor alocado para a educação só dá para pagar o salário dos professores e responder a algumas necessidades básicas da escola. No entanto, não permite cobrir todas as carências das escolas públicas, como manuais escolares, mais formação para os professores, laboratórios com materiais adequados e construção de mais escolas nas áreas rurais.”
Por isso, a fundação MAHON além de criar oportunidades para os jovens, através da oferta de formações em informática, gestão hoteleira e financeira, inglês, português e gestão financeira, também estabelece parcerias com a embaixada do Japão em Díli, no sentido de ampliar o número de escolas nas áreas rurais. Neste momento, já construíram duas escolas no interior de Bobonaro e, em Covalima, o projeto de construção da escola está na fase de verificação do terreno.
A maior parte das dificuldades que hoje pautam a realidade do ensino em Timor-Leste, tinham sido já elencadas no último Congresso Nacional da Educação, que teve lugar em 2017, mas continuam ainda hoje sem solução. “Apesar de, durante os primeiros 15 anos após a restauração da nossa independência, se terem registado vários progressos, é notório que a qualidade dos serviços educativos não responde, de forma eficaz e eficiente, às necessidades da nossa população”, realçava, na altura, António da Conceição, no exercício das suas funções de ministro de Estado, coordenador dos Assuntos Sociais e ministro da Educação.
“Aprender não tem de ser só nas escolas e universidades”
Octaviano Ferreira, 26 anos, tradutor e revisor de português no Consultório da Língua para Jornalistas (CLJ), partilhou com o Diligente os motivos que o levaram a desistir de tentar estudar em universidades timorenses.
“A minha experiência na escola não foi boa. Senti sempre que as aulas só se focavam nos professores e nas suas regras, eram eles que organizavam e controlavam, os alunos apenas tinham de obedecer e receber a matéria em forma de monólogo, não havia diálogo, nem possibilidade de apresentar dúvidas. Não havia interação entre docentes e alunos. Limitávamo-nos a ouvir e a aceitar, o que era muito desmotivante”.
Ainda assim quis continuar a aprender e foi atrás do conhecimento. Depois de terminar o ensino secundário, em 2016, na escola católica Santo Estevão, em Viqueque, decidiu, apesar de todas as reservas, decidiu dar uma oportunidade ao ensino superior e candidatar-se à Universidade Nacional Timor Lorosae (UNTL). Na candidatura, teve de escolher três cursos, aos quais concorreu com média de 40 (de 10 a 60).
O primeiro foi o de Física, em segundo lugar, Geologia e, por último, Informática. No entanto, não foi colocado em nenhum dos cursos. Em 2017, tentou novamente. Desta feita, escolheu Agronomia, Saúde Animal e Física. “Quando os resultados foram publicados em janeiro, no Serviço da Educação Municipal em Comoro, Díli, o meu nome não constava da lista dos colocados.”
“Ouvi os relatos dos meus colegas que frequentam a universidade e todos se queixam do mesmo: a falta de qualidade no ensino e o sistema que não é saudável”
Na altura, ficou muito triste, mas, hoje “só posso agradecer por tudo, porque se eu tivesse estudado na UNTL, talvez não tivesse o conhecimento que tenho hoje. O curso no CLJ permitiu-me evoluir muito. E se me perguntar se pretendo estudar em universidades nacionais no futuro, diria que não. Só quero estudar se tiver oportunidade de o fazer no estrangeiro. Enquanto trabalhei como jornalista, tive a oportunidade de conhecer melhor a realidade do país, ouvi os relatos dos meus colegas universitários e todos se queixam do mesmo: a falta de qualidade do ensino e um sistema nada saudável.”
Quando se refere a um sistema que não é saudável, o jovem recorda que no ensino secundário, entre 2014 e 2016, os professores eram autoritários e agrediam os estudantes. “Eu sou da área de ciências, e houve uma vez, no meu 11.ºano, em que o professor me bateu só porque me esqueci de trazer o caderno de matemática. Foi um momento muito traumático. Fazíamos os trabalhos de casa por termos medo do professor, não porque gostávamos de aprender”, relata.
A verdade é que “os professores demonstravam dificuldade em ensinar, porque muitos não tinham formação na área. Os que eram da área e dominavam os conteúdos tinham dificuldade em transmiti-los em português e, por vezes, até em tétum também. Portanto, era muito difícil absorver a matéria”.
Apesar de tudo, Otaviano levantou a cabeça e seguiu em frente, “para termos um futuro melhor é através da educação tanto formal como informal. Como já sabia que já não ia para a universidade, arranjei forma de me ocupar. Moro perto da rádio comunidade em comoro, onde o meu primo trabalha. Um dia, ele propôs-me ser voluntário na rádio e eu aceitei. Ajudava a tratar do equipamento do estúdio e comecei a despertar para o jornalismo” e a fazer pequenos trabalhos.
“Tive o privilégio que os meus colegas não tiveram de me cruzar com pessoas boas e extraordinárias que me ajudaram a acreditar na minha capacidade e a seguir em frente”
No mesmo ano em que não entrou na universidade pela segunda vez, frequentou a formação de fotografia e edição de fotografia do Centro de Formação Técnica em Comunicação (CEFTEC), durante seis meses. Depois de terminar o curso, continuou a trabalhar na rádio, onde começou a produzir mais notícias e a ser locutor. A partir daí, as oportunidades começaram a bater à porta.
Na altura, “o diretor da rádio perguntou-me se eu queria frequentar a formação de português do Instituto Camões e eu aceitei. Fiquei muito surpreendido com a qualidade da formação, tínhamos manuais bem elaborados, havia interação entre os formadores e formandos na sala de aula, condições que nunca encontrei em lado nenhum. Nesta formação, aprendi mais do que na própria escola. Tive o privilégio, que os meus colegas não tiveram, de me cruzar com pessoas extraordinárias que me ajudaram a acreditar nas minhas capacidades e a seguir em frente”, realça com um brilho no olhar.
Apesar do desgosto com os métodos dos professores do ensino básico até ao secundário, o jovem não desistiu de aprender, pois, para ele, “sempre existe outro caminho para evoluir, quando temos vontade. Aprender não tem de ser só nas escolas e universidades”.
A qualidade no sistema educativo Timorense uma questao politica. Seraque o novu direngente do ministerio Educacao aplicam uma regurosa recrutamento ao professores por merito lisensiado em Faculdade de educacao Como de FEAH UNTL. Comicao Funcao Publica organiza uma selecao teste de competencia no domino do materia curiqular, abilidade em lingua de instructions, domino de uzos variadades metodologia de ensino em confirmidade materia escolar. Outro medida e Ministerio Educacao organiza uma avalicao desenpenho professores que neste momento desenpenhar proficao Como professor nas escolas para determinar a continuacao de contrato ou nesesitam uma formacao complementar ou termina o contrato Como professor nas escolas.