Como a sociedade timorense vê o bullying?

Em Timor-Leste, ainda não há lei que regule o bullying, tanto diretamente como através do ambiente virtual/Foto: Rido Franz (UNESCO)

No país, vídeos de pessoas a serem ridicularizadas ou constrangidas fazem sucesso nas redes sociais. Para tentar saber o que a população pensa a respeito do tema, o Diligente saiu à rua.

Bullying, de acordo com o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF, em inglês), é uma forma de comportamento agressivo que ocorre de forma intencional e repetida, fazendo com que outra pessoa se sinta magoada. “O bullying pode assumir múltiplas formas, incluindo a disseminação de ameaças, agressões físicas ou verbais, o envolvimento em práticas insidiosas, como excluir uma criança de um grupo para a magoar, ou quaisquer outros gestos ou ações que ocorram de forma menos visível”, descreve a UNICEF na sua página oficial.

Para o psicólogo Alessandro Boarccaech, uma vítima de bullying pode enfrentar uma série de problemas, tais como ansiedade, depressão, baixa autoestima, dificuldades de aprendizagem, evasão escolar, desafios para interagir ou confiar em outras pessoas, traumas psicológicos, isolamento, pesadelos e stress pós-traumático.

Além disso, “a criança pode desenvolver comportamentos de risco ou autolesivos, ideação suicida e, de forma não consciente, reproduzir as agressões em outras pessoas ou relacionar-se no futuro com indivíduos que continuarão a agredi-las física ou emocionalmente”, explicou o psicólogo.

Já o psicólogo Elvis do Rosário abordou a questão do cyber bullying, “em que as pessoas usam a internet para ameaçar ou insultar, expressando frases que difamam alguém, e que o afetam de alguma forma”.

Em Timor-Leste, o assunto voltou à tona perante o elevado número de visualizações de vídeos que circulam nas redes sociais, muitos deles de práticas que ridicularizam crianças. No país, ainda não há lei que regule o bullying, tanto diretamente como através do ambiente virtual.

Para tentar saber o que a população pensa a respeito do tema, o Diligente saiu à rua.

“As pessoas não percebem que as palavras podem magoar psicologicamente um indivíduo”

Judite Elisa Pinto, 21 anos, Estudante de Universidade da Paz (UNPAZ)/Foto: Diligente

Bullying é uma situação que sempre acontece nas escolas, nas estradas, nas famílias, e que leva as pessoas a ficarem com medo, traumas e a perder a vontade de ir à escola, no caso dos estudantes. Felizmente, não enfrentei esta situação, mas conheço alguns colegas que foram vítimas.

Parte da sociedade timorense considera que gozar com outros cidadãos é normal e é uma brincadeira. As pessoas não percebem que as palavras podem magoar psicologicamente um indivíduo.

Para prevenir o bullying, precisamos de consciencializar as pessoas através da educação cívica. As famílias, sobretudo os pais, devem começar a ensinar as crianças a respeitar os outros. Além disso, precisamos de criar uma lei que defina o bullying como uma violação, prevenindo este tipo de comportamento que prejudica a integridade dos outros.”

“Fui vítima de bullying. No primeiro, gozávamos uns com os outros, mas pouco a pouco, a conversa tornou-se irritante. Senti-me desvalorizado e fiquei a pensar nisso por algum tempo, o que afetou a minha autoconfiança”

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João Carceres, 22 anos, estudante de Relações Internacionais da UNTL/Foto: DR

Bullying é um ato de discriminação, maus-tratos e pressão. Quando subestimamos outras pessoas, estamos a agredi-las psicologicamente. Para mim, bullying é crime, porque mesmo que não magoemos fisicamente, magoamos psicologicamente.

Fui vítima de bullying. Primeiro, gozávamos uns com os outros, mas pouco a pouco, a conversa tornou-se irritante. Senti-me desvalorizado e fiquei a pensar nisso por algum tempo, o que afetou a minha autoconfiança, mas já passou.

Quando assisto a situações de bullying, vou falar com quem o faz e digo-lhe para não gozar com as pessoas, porque isso as pode magoar. Além disso, vou aconselhar a vítima, ajudando-a a ultrapassar a situação e a ser forte.

Muitas pessoas fazem vídeos a fazer bullying por mero entretenimento, mas para mim não é divertimento nenhum, é errado, não é cómico. Estas pessoas devem ser responsabilizadas. Se tivéssemos uma lei para controlar este tipo de comportamento, seria muito bom e ajudaria a diminuir a prevalência.”

“É uma situação que acontece em todo lado, principalmente nas escolas e vias públicas. A maioria das pessoas ainda considera normal e não se preocupa com os efeitos que a vítima sofre”

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Cecília da Costa Gomes, 22 anos, estudante do Institut Of Bussiness (IOB)/foto: Diligente

“Passei por esta situação quando era criança. Na escola, os meus colegas gozavam-me a dizer que era preta. Reconheço que tenho pele escura, mas não me sinto confortável, quando as pessoas me chamam assim. Quero que me chamem pelo meu nome, não pelas minhas condições físicas.

Quando sofri bullying, afastei-me das pessoas que mo fizeram e procurei outros colegas que me respeitavam. Tinha medo de os encontrar, mas isso não tirou a minha vontade de continuar a ir à escola.

Não contei esta situação aos meus pais, fiquei calada por ainda não ter consciência de que era bullying. Alguns pais mostram-se preocupados e zangados quando os seus filhos choram por causa de bullying.

É uma situação que acontece em todo lado, principalmente nas escolas e vias públicas. A maioria das pessoas ainda considera normal e não se preocupa com os efeitos que a vítima sofre. O bullying faz com que as vítimas fiquem com medo, traumas e até percam a vontade de ir à escola.

Em primeiro lugar, precisamos de consciencializar as pessoas para saberem que o bullying é uma infração. Em segundo lugar, o Estado deve criar uma lei que contribua para evitar este comportamento abusivo”.

“O bullying acontece quando as pessoas gozam com outras, mas para mim isso não é um problema, desde que não haja agressão física”

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Seles Ribeiro, técnico profissional de Informática do Conselho dos Ministros/Foto: DR

“O bullying acontece quando as pessoas gozam com outras, mas para mim isso não é um problema, desde que não haja agressão física. Se houver, já é um crime.

Relativamente às pessoas que fazem bullying contra indivíduos com problemas mentais, considero isso como comédia, porque só têm como objetivo entreter. As pessoas usam os indivíduos vulneráveis como ícone por entretenimento.

Por serem cómicos, as pessoas divulgam e partilham vídeos de crianças, neste caso, com algum tipo de deficiência. Para mim, é normal, os vídeos não retratam ameaças nem crimes, porque não envolvem ódio. As palavras duras na gravação não vão afetar ninguém, porque são a brincar.

No entanto, tenho pena quando vejo a cara triste das crianças em alguns dos vídeos de bullying. As crianças não devem estar expostas, tanto nas redes sociais como na rua a vender comida. A infância é o momento para estudar.”

“Eu cheguei a escrever um comentário a um dos vídeos, dizendo que aproveitar-se de pessoas vulneráveis é errado. Em vez de agravarmos os seus problemas, devemos ajudar”

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José Lino da Silva Fernandes, membro do movimento Comité Esperança/Foto: Diligente

“Gozar com a situação física, psicológica ou social não é bom, porque todas as pessoas devem ser respeitadas, independentemente da sua situação.

Vi em vídeos nas redes sociais que as pessoas usam indivíduos com problemas mentais para aumentar os acessos à sua conta. Eu cheguei a escrever um comentário a um dos vídeos, dizendo que aproveitar-se de pessoas vulneráveis é errado. Em vez de agravarmos os seus problemas, devemos ajudar.

O Estado, em particular, deve dar mais atenção a pessoas com necessidades específicas. Deve fazer uma chamada de atenção para as pessoas que usam outros, neste caso, para lucrar. Ainda não temos lei para controlar o bullying, mas gozar com indivíduos com deficiência mental e até agredi-los deve ser criminalizado.”

“Isso acontece muitas vezes na escola. Como professora, quando assisto a crianças a gozar umas com as outras, intervenho. O bullying fez com que alguns estudantes chorem ou fiquem tristes e quietos, o que mostra os efeitos terríveis deste tipo de violência”

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Agustinha da Silva Guterres, 35 anos, professora/Foto: Diligente

“Praticar bullying é errado. As crianças com mentalidade forte conseguem superar, mas as que não conseguem ultrapassar a situação podem sofrer de stress e baixa autoestima.

Isso acontece muitas vezes na escola. Como professora, quando assisto a crianças a gozar umas com as outras, intervenho. O bullying faz com que alguns estudantes chorem ou fiquem tristes e quietos, o que mostra os efeitos terríveis deste tipo de violência.

Na escola, os professores tentam resolver o problema, ajudando a vítima a superar e educando os agressores para não repetirem o ato.

Apesar de ainda não ter voltado a ensinar, por causa da polémica dos contratos que não foram renovados, comprometo-me a parar estes atos, sempre que me deparo com um.”

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