Aldo: “A minha mãe preferia que eu fosse um bandido a ser homossexual”

Grivaldo de Jesus Loudoe é rosto do preconceito que ser gay representa em Timor-Leste/ Foto:Diligente

No âmbito da realização da 5ª marcha da diversidade de Timor-Leste, realizada hoje, 28 de julho, subordinada ao tema `Esperansa ba futuru ida naroman ho kor oioin´, em português, “Esperança para um futuro brilhante com diferentes cores”, o Diligente conta a história de Grivaldo de Jesus Loudoe, mais conhecido por Aldo, um jovem timorense homossexual, de 18 anos.

“A minha mãe preferia que eu fosse um bandido a ser homossexual, não me considera seu filho e pressiona-me para ser ‘um homem verdadeiro’. O meu pai ameaçou bater-me até me partir as pernas para eu não sair de casa e queria matar-me, cortar-me em pedaços e atirar-me ao mar. Tenho casa, mas não tenho lar. As pessoas gozam comigo e humilham-me. Tentei suicidar-me duas vezes. Da primeira vez, tomei 25 comprimidos, mas não morri. Depois de uma semana da primeira tentativa, ingeri 49 comprimidos, mas em vão.”

Os episódios relatados por Aldo não são caso único e refletem as dificuldades da comunidade LGBTQIA+ timorense.

Bella Galhos, assessora do Presidente da República, José Ramos-Horta na área do empoderamento económico para as mulheres e ativista pelos direitos humanos, refere que os problemas que o Aldo relatou são comuns entre a comunidade. “Não tenho um número exato, mas sei que há um número elevado de pessoas a passarem por estas situações”.

Neste sentido, Galhos decidiu partilhar, na sua conta de Facebook, o encontro que teve com o Aldo e com o Presidente da República. Questionada sobre o porquê de ter tornado público o caso de Aldo, Bella respondeu que é uma realidade para a qual quer chamar a atenção, “com o objetivo de sensibilizar a população e, ao mesmo tempo, diminuir os casos de discriminação e agressão contra esta comunidade. Quero também encorajar todos os que sofrem a não ficarem em silêncio, a denunciarem as agressões de que são alvo, porque todas as pessoas merecem amor, respeito e proteção”.

Aldo contou ao Diligente que percebeu que era diferente quando estava no 4º ano do ensino básico e deu conta que preferia brincar com meninas e usar maquiagem. “Quando brincava com os rapazes, sentia-me diferente, sobretudo quando me tocavam, quando as minhas colegas me tocavam enquanto brincávamos, não sentia nada”. Até aos 17 anos, nunca teve coragem de contar aos pais. Foi em fevereiro deste ano que “saiu do armário”: “Eu não quero ser assim, pai e mãe, eu sou gay e faço parte da comunidade LGBTQIA+”.

O pai considerou que a situação poderia ser resolvida através de agressões: “Enquanto dependeres de mim, não te podes comportar como homossexual, se o fizeres, vou bater-te até agires como um ‘homem verdadeiro’”.

Depois de ser ameaçado de morte várias vezes pelo pai, mudou-se para casa da tia, no final de abril. “Não me sentia confortável a viver com os meus próprios pais.”

Foi a tia, funcionária no Palácio Presidencial, que deu a conhecer Aldo a Bella Galhos. Os dois encontraram-se na Cantina Verde, no Palácio do Presidente. Aldo explicou toda a sua situação a Bella, inclusivamente o facto de os pais terem deixado de pagar as propinas da escola, depois de ter revelado a sua orientação sexual.

Aldo chegou a enviar várias mensagens ao pai para que pagasse os seus estudos, mas foi ignorado.

Num posterior encontro com Bella Galhos e o Presidente da República, José Ramos-Horta, na Cantina Verde, no dia 15 de julho, Ramos-Horta orientou a assessora e ativista para conversar com a família do jovem.

Apesar de todas as pressões, tristezas e momentos difíceis pelos quais passou durante a sua ainda curta vida, Aldo sente-se feliz por poder participar, pela primeira vez, na marcha da diversidade, depois de ter revelado a sua orientação sexual aos pais. Para o jovem, é importante haver eventos como este para mostrar que “somos todos iguais e não devemos discriminar ninguém” com base na sua orientação sexual ou identidade de género. “Peço a todas as pessoas como eu que tenham força e coragem para se defenderem, mesmo que tenham de contrariar os vossos familiares. Não fiquem em silêncio”.

Bella Galhos, por sua vez, considera que a marcha da diversidade é importante para reforçar a existência da comunidade e alertar a sociedade para o facto de Timor-Leste ser um país democrático, que não pode discriminar ninguém. “A marcha não pretende promover a comunidade LGBTQIA+, o objetivo é chamar a atenção para os problemas e para a necessidade de defender os direitos destas pessoas, de modo a sermos uma sociedade inclusiva e defensora dos direitos humanos”, alerta.

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