Acesso à água em Díli é a conta-gotas e com hora marcada

Falta de água em casa leva população a furar canos da BTL/ Foto: Diligente

Na capital do país, Díli, o acesso à água canalizada é ainda um privilégio que, para a maior parte da população, se mede a conta-gotas. Enquanto famílias inteiras não têm acesso à água nas suas casas e têm de caminhar quilómetros para a conseguir, outras têm, mas com horário limitado. É o caso dos habitantes da aldeia de Becusse Centro, no suco de Becora, que só dispõem de abastecimento entre a meia-noite e as 4h da madrugada. Já a população da aldeia Moris ba Dame, no Bairro Pité, não tem sequer acesso a água canalizada e vê-se obrigada a comprar. Apenas os moradores de Hera e de Delta conseguem ter água 24 horas por dia.

“Compramos 5 mil litros por 35 dólares e chega para oito pessoas usarem durante três semanas”, explica Dionísio Rangel, habitante e proprietário de um quiosque (pequena loja) em Moris ba Dame, Díli. “Temos de poupar a pouca água que temos. Usamo-la apenas para cozinhar e lavar a loiça. Já para lavar a roupa e tomar banho temos de ir à fonte, quase a um quilómetro de distância”. O morador sublinha que, desde que se mudou para o local, há cerca de nove anos, tem sido “obrigado a gastar muito dinheiro para poder ter água”, tendo mesmo chegado a “ficar sem água por não ter possibilidades financeiras para comprar e estamos a falar de uma necessidade humana básica a que todos deviam ter direito”.

Em Becusse Centro, o cenário não é melhor. A água só corre das torneiras entre a meia-noite e as 4h da manhã. De madrugada, num horário que deveria, à partida, poder ser de descanso para a grande maioria das pessoas, “temos de acordar todas as noites para encher recipientes e às vezes demoramos muito, porque muitas pessoas fazem-no em simultâneo, influenciando o volume de água que sai das torneiras. Quando algumas casas já se abasteceram e fecham as torneiras, então a água chega com mais pressão às nossas casas”, conta Raimunda Amaral, doméstica, moradora em Becusse Centro há praticamente um ano.

O fornecimento de água limitado ao período de quatro horas é muitas vezes insuficiente para algumas famílias. “Usamos apenas água do tanque, que aproveitamos para encher durante a madrugada, entre a meia-noite e as 4h da madrugada. O tanque abastece três casas, cada uma com 15 ou mais pessoas”, explica Raimunda Amaral. Acontece que, por vezes , “não há água canalizada durante dois ou três dias e, sem podermos encher o tanque, ficamos sem água e temos de ir procurar em outros lugares, umas vezes mais perto , outras mais longe”. Na época de chuva, como agora, a água sai regularmente, mas, quando chegamos aos meses de agosto e novembro, as torneiras secam” e é ainda mais difícil ter água em casa.

Contactado pelo Diligente, o presidente da BTL (Bee Timor-Leste), Carlos dos Reis, confirmou que no tempo de chuva, “o débito de água é de cerca de 200 litros por segundo, mas, entre agosto a novembro, desce significativamente, para valores entre os 27 a 30 litros por segundo”. Por consequência, “não temos água suficiente para distribuir com regularidade a toda a comunidade de Díli” e, por isso, “temos de fazer uma rotação no abastecimento: para cada área disponibilizamos água durante cinco horas para que possamos garantir que, no espaço de um dia, conseguimos fazer a água chegar a todas as pessoas”.

Em Díli, só existem dois lugares onde a água tem um caudal contínuo de 24 horas – um em Hera e outro em Delta -, avança ainda o presidente da BTL, advertindo que “para garantir água 24 horas por dia em toda a cidade, teriam de ser reparados todos os sistemas”, que são “maioritariamente antigos, ainda do tempo português e indonésio”.

Acresce que, “quando há chuvas torrenciais em Aileu, água suja e enlameada entra na fonte e, daí, tem acesso direto ao tanque de armazenamento que fornece água ao público, localizado em Dare, contaminando a água”, sublinha o presidente. Quando isso acontece “temos de desligar o fornecimento durante uma ou duas semanas para sanear a água suja”.

Por outro lado, o responsável lamenta que, por vezes, as comunidades não queiram colaborar com a BTL para ajudar a resolver este problema, chegando mesmo “a dificultar os trabalhos” da empresa pública. “Há moradores que furam os canos principais da BTL para terem acesso a água nas suas habitações, o que diminui o volume de água nas canalizações e impede o acesso de muitas outras pessoas que, em condições normais, teriam água”.

Carlos dos Reis admite que 20 anos após a independência, “o sistema de distribuição de água em Díli não registou grandes melhorias” e atribui responsabilidades aos governos anteriores por “não terem dado prioridade ao saneamento básico. Com os Governos de Xanana Gusmão (de 2007 a 2012 e de 2012 a 2015), deu-se mais importância à rede elétrica nacional”. Já o atual Executivo “está a dar prioridade à água”, destaca.

O presidente da BTL avança ainda que, desde 2018, o Governo conseguiu mobilizar recursos na ordem dos 833 milhões de dólares para reabilitar o saneamento em todo o território.
Apesar disso, o investimento não se traduz ainda em melhorias no acesso a água, potável ou não potável, numa capital onde as “puxadas” de água são frequentes.

A BTL “já preparou um plano detalhado do sistema de distribuição da água” no município de Díli e na parte oeste do país, designadamente em Baucau, Viqueque, Manufahi e Lautém. “Já submetemos o plano à ADN (Agência de Desenvolvimento Nacional) para verificar e depois vai ser encaminhado para a CAFI (Conselho da Associação do Fundo de Infraestruturas) para o analisar e aprovar. Depois de ser aprovado, o plano tem de passar pela CNA (Comissão Nacional de Aprovisionamento) para se iniciar o processo de concurso público”.

De acordo com dados de um estudo das Nações Unidas, o Join Monitoring Program, a nível nacional, cerca de 85% da população tem acesso a água (canalizada ou de outras fontes) mas um valor próximo dos 49% não dispõe de saneamento básico, sendo que neste último se incluem esgotos”, conclui Carlos dos Reis.

Dionísio Rangel e Raimunda Amaral, assim como grande parte dos habitantes de Díli, continuam a ver a água a chegar as suas casas em quantidades escassas e de forma inconstante . Desconhecem estatísticas ou os milhões de dólares americanos acenados para a melhoria da distribuição e do acesso à água em Timor-Leste, um dos países mais pequenos da Ásia, com 1,3 milhões de habitantes, e cuja capital, Díli, não chega a ter 325 mil habitantes, segundo os Censos de 2022.

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  1. A agua vem a conta gotas
    Os pescadores andam a deriva
    O lixo adora as bermas das estradas
    O emprego nem com uma lupa
    Educacao sexual esta no forno
    A igreja recebe mais dinheiro que o HNGV
    As mulheres sao cidadaes de segunda classe
    Amamentacao e problematica
    Merenda escolar a espera de milagre
    As criancas tem de trabalhar em vez de estarem na escola
    As estradas precisam de buracos arranjados
    A educacao precisa ter prioridade maxima
    Pensao vitalicia e uma mina de ouro para deputados
    As moscas mudaram….
    TL precisa de um homem que saiba mandar

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