Eleições parlamentares: 2,8 milhões de dólares de financiamento do Estado para as campanhas

Valor inicial de quatro dólares por voto pode ascender, durante cinco anos, até cerca de 50 dólares/Foto: Diligente

Os partidos candidatos às eleições parlamentares têm o direito, consagrado na legislação timorense, a receber quatro dólares por cada voto obtido. Finalizado o apuramento da votação pela Comissão Nacional de Eleições (CNE), com 692.521 votos válidos num universo de 705 mil votantes, o valor que o Estado timorense disponibiliza para o pagamento de subvenções totaliza 2,8 milhões de dólares americanos. O dinheiro é retirado do Orçamento Geral do Estado.

O Congresso Nacional para a Reconstrução de Timor-Leste (CNRT), partido mais votado, com 288.289 votos, vai receber 1,15 milhões de dólares de financiamento do Estado para a campanha eleitoral. A Frente Revolucionária de Timor-Leste Independente (FRETILIN), segundo partido mais votado, vai arrecadar perto de 700 mil dólares.

Relativamente a três outros partidos que conquistaram assentos parlamentares, o Partido Democrático (PD), Kmanek Haburas Unidade Nasional Timor Oan (Khunto) têm direito a mais de 200 mil dólares americanos cada e o Partido de Libertação Popular (PLP) a 162 mil.

O Partido do Desenvolvimento Nacional (PDN), força política menos votada, vai  receber 2,3 mil dólares americanos pelos 597 votos.

Nas eleições parlamentares de 2018, concorreram 19 partidos, mais dois do que neste ano. Com mais de 635 mil votantes dos 784 mil eleitores registados, as subvenções às campanhas eleitorais ascenderam a a 2,5 milhões de dólares americanos, uma quantia similar à calculada para as campanhas deste ano.

Em termos comparativos, se olharmos , por exemplo, para o projeto do ainda atual Governo Uma Naroman ba Povo (“Casas brilhantes para o povo”, na tradução literal), que construiu casas para franjas da população mais necessitadas, no valor de 18 mil dólares, a fatia agora disponibilizada do Orçamento Geral do Estado para financiamento das campanhas, permitiria construir mais 150 casas.

“Contando com as subvenções que terão de ser pagas este ano, o apoio pode chegar  a 7,5 milhões de dólares, no espaço de três eleições”

O valor fixado em quatro dólares por voto tem por base a lei que determina que os candidatos têm direito a um apoio estatal entre 1 a 10 dólares. Questionado sobre a escolha do montante da subvenção, o presidente da CNE, José Belo, disse que “o Conselho de Ministros fixou o apoio do Estado em quatro dólares por considerar um valor razoável“.

Desde a fixação do valor das subvenções, em 2018, “que se aplica retroativamente ao pagamento da subvenção respeitante às eleições parlamentares de 2017”, já saíram dos cofres do Estado, no mínimo, cerca de 4,8 milhões de dólares em subvenções para as campanhas das eleições parlamentares. Contando com as subvenções que terão de ser pagas este ano, o apoio pode chegar  a 7,5 milhões de dólares, no espaço de três eleições.

Em termos comparativos, Portugal, país com 10,8 milhões de eleitores recenseados, doze vezes mais do que Timor-Leste, pagou 7 milhões de euros (perto de 8 milhões de dólares americanos) em apoio financeiro para a campanha legislativa de janeiro de 2022. Estes financiamentos só são atribuídos para os partidos que obtenham mais de 50 mil votos ou representação parlamentar e que os solicitem ao Presidente da Assembleia da República, como pode ler-se na lei de financiamento dos partidos políticos e das campanhas eleitorais.

Em Timor-Leste, a lei determina que todos os partidos candidatos têm direito ao subsídio e não estabelece a obrigatoriedade de apresentar orçamentos que clarifiquem o valor previsto para os gastos nas campanhas.

Apesar disso, José Belo explica que, no fim das campanhas e das eleições, os candidatos devem apresentar os relatórios à CNE. “Os relatórios serão publicados no Jornal da República depois de verificação feita pela comissão, mas, durante esse processo, quem quiser pode aceder ao relatório diretamente na CNE”, informou.

No regulamento da CNE sobre a Campanha Eleitoral para as eleições presidenciais e parlamentares, consta que “os candidatos, os partidos políticos e as coligações partidárias devem possuir contabilidade organizada e separada para a campanha eleitoral, para os gastos e as receitas de modo a que seja possível conhecer a sua situação financeira e verificar o cumprimento das obrigações previstas na lei”.

O dinheiro para as subvenções é retirado do Orçamento Geral do Estado. Em 2023, um terço do OGE é financiado pelo Fundo Petrolífero, sendo que o Governo alocou 75% do orçamento nas despesas correntes, as que não trazem retorno, um cenário que se tem repetido em todos os OGE de Timor-Leste, nos últimos anos. De acordo com o relatório de 2022 do Ministério das Finanças, relativo ao OGE deste ano (2023), está previsto que o Fundo Petrolífero se esgote em 2034, se o Executivo continuar a gastar dinheiro em despesas correntes.

Subvenções das eleições parlamentares de 2023
O que diz a lei

A lei n.º 3/2004 sobre os partidos políticos não mencionava a atribuição de subvenções públicas para as campanhas dos partidos candidatos às eleições parlamentares. A primeira alteração a essa lei surge através do diploma n.º 2/2016 aprovado pelo VI Governo Constitucional liderado por Rui Maria de Araújo, posteriormente promulgado pelo então Presidente da República Taur Matan Ruak.

Com a alteração, os partidos políticos passaram a ter direito a “receber uma subvenção do Estado para as campanhas eleitorais atribuída depois das eleições e de acordo com o número de votos obtidos pelo partido, a fixar por diploma do Governo entre um mínimo de 1 dólar americano e um máximo de 10 dólares americanos por cada voto obtido”.

A alteração teve como objetivo cumprir o direito “de contribuir para a organização e expressão da vontade popular e a participação nos órgãos do poder político, bem como o de exercer o direito de oposição política”, pode ler-se no mesmo diploma.

Dois anos depois desta alteração, em 2018, o VII Governo Constitucional, encabeçado pelo então primeiro-ministro Marí Alkatiri, fixou o valor da subvenção em quatro dólares por cada voto obtido, quer nas eleições legislativas quer nas presidenciais. O decreto-lei n.º 5/2018 foi então promulgado por Francisco Guterres ‘Lú-Olo”, Presidente da República em funções.

“Os partidos políticos com assentos parlamentares recebem também, desde 2014, uma subvenção anual do Governo, no valor de 6 milhões de dólares americanos”

Festa da democracia ou das subvenções?
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Ação de campanha do CNRT no município de Ermera/Foto: Xanana ba Ema Hotu

Além das subvenções para as campanhas eleitorais, os partidos políticos com assentos parlamentares recebem também, desde 2014, uma subvenção anual do Governo, no valor de 6 milhões de dólares americanos, o que equivale a 92 mil dólares por deputado.

A lei nº 15/2008 consagra no seu artigo 69.º o apoio às bancadas parlamentares em forma de subvenção anual “com o objetivo de assegurar que as bancadas tenham as suas assessorias próprias, espaço por pessoas da sua livre escolha e confiança política e com o perfil técnico que cada bancada houver por mais adequado, assim como os meios para a prossecução dos seus fins legais”.

Questionado sobre a razão para a atribuição de 92 mil dólares por cadeira, o presidente da CNE invoca que esse valor está previsto na lei. “É um subsídio, em termos de democracia, para ajudar na melhoria e na organização dos partidos”.

Feitas as contas relativamente à legislatura que está prestes a terminar, os partidos que preenchem o hemiciclo parlamentar receberam, somados os cinco anos de mandato, um total de 30 milhões de dólares de subvenção anual distribuído por todas as bancadas parlamentares.

Por sua vez, tendo em conta a atribuição de 4 dólares por voto, o financiamento das campanhas legislativas de 2018 foi de 2,5 milhões de dólares, referentes aos 624 mil votos válidos. Se a esse valor somarmos a subvenção anual atribuída às bancadas parlamentares, cada voto passou a valer na realidade um total de 52 dólares americanos.

A manter-se a mesma atribuição de subvenções – 4 dólares por voto para as campanhas e 6 milhões por ano para as bancadas parlamentares -, em 2028, ano do fim de mandato do Governo recém-eleitos do CNRT, o total das subvenções seria de 32,8 milhões de dólares e, com os 692.521 votos válidos, cada um acabará por valer 47 dólares americanos.

Recorde-se relativamente às últimas eleições presidenciais de 2022 que, à semelhança do que aconteceu nas legislativas deste ano, houve um número também bastante elevado de candidaturas. Foram, ao todo, 16 candidatos à presidência que receberam um total de 3,4 milhões de dólares em subvenções.

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