Tarifa dos Estados Unidos poderá ter pouco impacto na exportação do café timorense

A política de tarifas de Trump tem sido criticada em todo o mundo por economistas e parceiros internacionais, que alertam para o risco de uma nova guerra comercial à escala global /Foto:DR

Apesar do papel central do café para a economia timorense, especialistas acreditam que tarifas impostas a outros países produtores poderão ajudar a exportação de Timor-Leste.

Os Estados Unidos da América (EUA) implementaram, a 5 de abril, uma tarifa aduaneira universal de 10% sobre produtos importados de 185 países, incluindo Timor-Leste. A medida poderá ter impacto limitado sobre as exportações timorenses de café, principal produto não-petrolífero do país.

De acordo com o Banco Central de Timor-Leste (BCTL), em 2024, o país exportou 17,8 milhões de dólares em café, sendo que 5,1 milhões foram destinados aos EUA, representando 30% da produção total.

O café continua a ser um pilar fundamental da economia timorense, respondendo por mais de 80% das exportações não-petrolíferas e envolvendo diretamente cerca de 37,5% das famílias do país.

De acordo com Adelino do Carmo, o gestor de Agroprocessamento da Cooperativa de Café de Timor (CCT), foram exportadas, no ano passado, 770 toneladas de café em sete meses através das companhias Starbucks e Royal Coffee.

Até à entrada em vigor da nova tarifa, o café entrava no mercado norte-americano isento de tarifas, beneficiando do Sistema Geral de Preferências e do regime para Países Menos Desenvolvidos.

Apesar da nova tarifa e das preocupações que está a gerar entre os timorenses, especialistas acreditam que o impacto pode ser mitigado. Adelino do Carmo afirmou que a medida ainda não gerou efeitos visíveis devido ao calendário sazonal das exportações.

O gestor reconhece que o aumento do custo pode refletir-se no preço final para os consumidores, mas mostra-se otimista quanto à resiliência do setor: “Acho que as medidas tomadas não vão ter um impacto significativo na economia de Timor-Leste, sobretudo na nossa atividade”.

O economista português António Serra também minimiza os possíveis efeitos negativos, sublinhando que as exportações de café para os Estados Unidos estão muito concentradas em duas empresas, o que pode permitir que estas absorvam parcialmente o aumento dos custos sem os repassar integralmente ao consumidor.

Tanto para o economista como para o gestor da CCT, as tarifas impostas pelos Estados Unidos a outros países exportadores de café, que variam entre os 10% e os 46%, poderão não prejudicar Timor-Leste.

Entre os quatro maiores produtores de café do mundo, os EUA impuseram direitos aduaneiros de 10% ao Brasil, 46% ao Vietname, 10% à Colômbia e 32% à Indonésia.

“Como outros países da região exportadores de café para os EUA vão pagar uma taxa mais alta, tendencialmente e, apesar da taxa de 10% cobrada, Timor-Leste poderá, em princípio, ganhar alguma quota de mercado”, explica Serra, alertando, porém, para a “limitação da capacidade produtiva do país”.

Segundo o economista, as tarifas aplicadas na região podem também criar oportunidades: “As diferenças de taxas, se vierem a ser permanentes, podem levar alguns países da região a transferirem parte da sua produção para Timor-Leste para beneficiarem da sua taxa alfandegária muito mais baixa”.

Questionado sobre medidas a tomar, o gestor da CCT disse desconhecer qualquer intenção de apoio governamental: “Ainda não recebemos qualquer apoio. O Governo ainda não deu declarações, sobretudo o Ministério do Comércio e Indústria e o Banco Central. Da nossa parte, ainda estamos a realizar uma pequena discussão sobre o assunto”, explicou.

Para Serra, Timor-Leste devia também dirigir esforços de exportação para países europeus, como a Alemanha, mas também para o Japão e a China.

O especialista alerta, no entanto, para riscos estruturais da dependência excessiva do café: “Timor-Leste fica muito dependente das políticas de comércio internacional do país importador e, sendo o café uma ‘commodity’ [produto com valor comercial, frequentemente negociado em bolsas internacionais], fica sujeito aos preços nas bolsas mundiais, além das oscilações da colheita devido a fenómenos climáticos ou pragas”.

O economista recomenda ainda medidas estruturais para diversificar a economia agrícola timorense. “É necessário apostar mais no aumento da produção de vários produtos agrícolas para o mercado nacional e para exportações”, sugere Serra, destacando a importância da melhoria da alimentação interna, da transformação industrial para agregar valor aos produtos locais e da dinamização da produção florestal de madeiras nobres.

Tarifa agrava desequilíbrio nas trocas comerciais com Timor-Leste

A aplicação de uma tarifa mínima universal de 10% sobre todas as importações, abrangendo 185 países, nomeadamente aliados tradicionais dos Estados Unidos, entrou em vigor a 5 de abril. Estão também previstas tarifas adicionais até 60% para países considerados “desleais” nas trocas comerciais. Nesta terça-feira, Trump avançou com taxas de 104% sobre produtos chineses.

A medida visa, segundo o Presidente norte-americano, reduzir o défice comercial e proteger a indústria americana. Porém, no caso de Timor-Leste, as exportações dos Estados Unidos para o país atingiram cerca de 19 milhões de dólares em 2024, segundo dados do Departamento do Comércio dos EUA, e mostram uma tendência de aumento contínuo nas vendas americanas ao país, particularmente desde 2021.

As exportações timorenses para os Estados Unidos são, desta forma, mais modestas – 5,9 milhões de dólares em produtos. Este desequilíbrio resultou num superavit de mais de 13 milhões de dólares para os EUA.

No que diz respeito às tarifas, Timor-Leste aplica geralmente uma taxa média de 2,5%, sem medidas protecionistas significativas e, após a adesão à Organização Mundial do Comércio, em agosto de 2024, consolidou um sistema tarifário simples e pouco elevado.

De acordo com a Associação Nacional do Café dos Estados Unidos, cada dólar de importações relacionadas com o café gera 43 dólares em valor para a economia americana e o produto sustenta 2,2 milhões de empregos no país.

A política de tarifas de Trump tem sido criticada em todo o mundo por economistas e parceiros internacionais, que alertam para o risco de uma nova guerra comercial à escala global.

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