Entre a inovação tecnológica e a aposta na sustentabilidade, a Coreia do Sul revela como o combate às alterações climáticas é uma urgência global. Da ilha de Jeju à Zona Desmilitarizada, uma viagem pelos novos caminhos do desenvolvimento sustentável.
A era da Inteligência Artificial (IA) é inevitável. Países desenvolvidos, como a Coreia do Sul, estão a aproveitar esta tecnologia, utilizando-a para impulsionar um desenvolvimento mais sustentável e amigo do ambiente.
O crescimento económico de um país, muitas vezes, está associado à degradação ambiental, sobretudo quando a principal fonte de energia provém do carvão e de combustíveis fósseis. Esta degradação afeta desproporcionalmente os países menos desenvolvidos, como Timor-Leste, que, apesar de emitirem baixos níveis de gases com efeito de estufa, são dos mais prejudicados, segundo o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC).
Timor-Leste é um exemplo disso. Tempestades, inundações e secas tornaram-se fenómenos tão frequentes que já são encarados como normais, raramente sendo associados diretamente à mudança climática.
De acordo com o relatório de síntese de 2023 do IPCC, desastres naturais relacionados com o clima — como tempestades, inundações e secas — causaram uma mortalidade 15 vezes superior em países altamente vulneráveis, entre 2010 e 2020. A discussão sobre o tema é, por isso, urgente.
Todos os países, com exceção dos Estados Unidos da América — que se retiraram do Acordo de Paris no início deste ano — comprometeram-se a limitar o aumento da temperatura global a 1,5 °C e a reduzir gradualmente as emissões de gases com efeito de estufa.
A Coreia do Sul, embora sendo uma nação desenvolvida, está empenhada em promover um crescimento mais sustentável. O Diligente teve a oportunidade de testemunhar este compromisso numa viagem de uma semana organizada pela Associação de Jornalistas da Coreia (JAK), no âmbito da Conferência Mundial de Jornalistas 2025 (WJC2025), realizada no início deste mês.
Ilha de Jeju: uma cidade net-zero em construção
Situada a sul da península, com uma área de 1,8 mil quilómetros quadrados e cerca de 690 mil habitantes, a ilha de Jeju é um dos destinos turísticos mais populares da Coreia do Sul, recebendo mais de 13 milhões de visitantes por ano.

Jeju é reconhecida pela UNESCO pelo seu ecossistema único e mares preservados, ostentando quatro títulos de prestígio: Reserva da Biosfera, Património Mundial Natural, Geoparque Global e zona húmida Ramsar — esta última sob uma convenção internacional distinta da UNESCO.
Além do seu património natural, Jeju é considerada a ilha mais limpa da Coreia do Sul, produzindo 20% da sua energia a partir de fontes renováveis — mais do dobro da média nacional, que é de 9%.
Combinando um rico património cultural, uma natureza exuberante e a harmonia das estações, Jeju aposta na conservação ambiental para garantir um desenvolvimento sustentável.

A ilha traçou uma meta ambiciosa: atingir a neutralidade carbónica até 2035, ou seja, recorrer exclusivamente a energia renovável 15 anos antes da meta nacional estabelecida para 2050.
Atualmente, Jeju emite cerca de 4,74 milhões de toneladas de gases com efeito de estufa no setor energético. Para inverter esta tendência, pretende aumentar o uso de energias renováveis para mais de 70%.
Desde 2024, está em execução o projeto de energia eólica offshore de Jeju, que aproveita os ventos fortes durante todo o ano. Com 18 turbinas instaladas no mar, espera-se produzir 100 megawatts de energia, suficiente para abastecer cerca de 100 mil casas.
Em terra, Jeju conta com mais 36 turbinas distribuídas por cinco parques eólicos, com uma capacidade total de 54 megawatts. As centrais solares da ilha, instaladas em cinco locais, contribuem com uma capacidade de produção de 2,5 megawatts. O objetivo global é ultrapassar os 7 gigawatts de capacidade de energia renovável.
Mobilidade sustentável: carros e autocarros movidos a hidrogénio

Jeju já dispõe de 22 autocarros e 48 carros de passageiros movidos a hidrogénio. Apenas 200 quilogramas de hidrogénio são suficientes para abastecer toda esta frota, sendo que cada quilograma permite percorrer cerca de 100 quilómetros. Para alcançar a meta net-zero até 2035, o Governo pretende vender mais de 500 veículos a hidrogénio e expandir a frota elétrica.

Jeju também criou a primeira instalação de produção de hidrogénio limpo da Coreia do Sul, alimentada exclusivamente por energia renovável, como a eólica. Esta infraestrutura pode abastecer mais de 50 autocarros por dia e prevê expandir a capacidade de 3,3 para 10,9 megawatts até 2030.
Além disso, a ilha planeia produzir mais de 60 mil quilogramas de hidrogénio verde por ano, substituindo progressivamente a energia baseada em combustíveis fósseis, que ainda representava 60% do consumo em 2022.
Indústria espacial e inovação tecnológica

Jeju está a investir na indústria espacial privada. Em novembro de 2023, foi lançado, a partir da praia de Joong, um satélite totalmente desenvolvido com tecnologia nacional. O Centro de Operações de Satélites da Coreia (KOSC) está localizado na ilha.
Até ao final de 2025, Jeju contará com um complexo industrial espacial, esperando atrair 22 empresas ligadas à investigação aeroespacial, inovação e apoio a startups do setor.
Na área da Mobilidade Aérea Urbana (UAM), Jeju prepara-se para lançar o primeiro serviço turístico de transporte aéreo da Coreia do Sul, ligando o aeroporto às atrações turísticas de forma rápida e inovadora.
A preocupação ambiental estende-se também ao espaço: a empresa Contec desenvolveu um sistema para capturar satélites obsoletos e conduzi-los à atmosfera terrestre para serem queimados, reduzindo os resíduos espaciais.
Outras medidas em curso para atingir a neutralidade carbónica até 2035 incluem a instalação de centenas de sistemas de captação de água da chuva em edifícios públicos, a geração de energia a partir de resíduos orgânicos e a reflorestação de 496 hectares com florestas de carbono.
Jeju está a transformar-se numa cidade global amiga do ambiente, promovendo o crescimento sustentável através da transformação digital e tecnológica.
Jeju Stone Park: a história na pedra

Um dos pontos turísticos mais emblemáticos da ilha é o Jeju Stone Park, um museu ecológico que conta a história da formação da ilha e da sua cultura das rochas. Com cerca de 900 mil metros quadrados, o parque preserva a memória do passado, projetando-se no presente e no futuro.
Segundo a lenda, antes da formação da ilha, uma grande avó, Seolmundae Halmang, transportava pedras na sua saia, deixando-as cair no mar e moldando as montanhas e terras da região. Acredita-se que foi ela quem criou o vulcão Hallasan e desenhou a paisagem de Jeju.
Ilha Tartaruga: da cidade morta à renovação viva

A Ilha Tartaruga é uma ilha artificial que combina uma série de atividades desportivas aquáticas, sendo um centro global de lazer marinho com competições internacionais de surf no Wave Park, o maior parque de surf artificial do mundo. Conta ainda com outras facilidades, como piscinas de mergulho, iates, banana boats, entre outras. A ilha é também um centro de educação ambiental e conservação.
O lago Shiwa, onde se situa a Ilha Tartaruga, foi inicialmente criado para apoiar o desenvolvimento desta nova cidade, sem considerar os potenciais problemas de poluição. O lago foi então severamente poluído, pois era um mar fechado, o que levou até a migração de cidadãos para outras cidades, devido à impossibilidade de sobreviver na região.
Com os esforços comunitários e governamentais de restauração ecológica, o lago foi transformado num ecossistema próspero, sendo designado pela UNESCO como um sítio de demonstração de ecohidrologia.
A região conta também com uma usina de marés que utiliza a água do mar para gerar eletricidade, contribuindo para o desenvolvimento regional.
Zona Desmilitarizada (DMZ): história viva da separação
Os jornalistas também visitaram a história viva da separação entre as Coreias. Depois de atravessar a Ponte da Unificação, na cidade de Paju, na província de Gyeonggi, a cerca de dois quilómetros da Zona Desmilitarizada (DMZ), foram submetidos a controlo no Posto de Verificação Militar, onde os passaportes e cartões de identidade são temporariamente retidos.
O percurso prosseguiu até ao Camp Greaves, um centro cultural, artístico e educativo localizado perto da DMZ, que funcionou como base do Exército dos EUA durante mais de 50 anos. Durante a viagem, o Camp Greaves foi o único local onde os 65 jornalistas puderam tirar fotografias.
Arte pela paz

“One” é uma instalação artística do projeto Powder Magazine, situada no antigo depósito de munições do Camp Greaves. A escultura de um veado com ramos a crescer dos cornos simboliza o ciclo da vida e da natureza: da terra nascem as plantas e os animais, que, ao morrerem, voltam para a fertilizar.
A peça pretende sensibilizar os visitantes — especialmente os coreanos — para a importância da paz.

“Do not cross this line”, uma exposição também situada no antigo depósito de munições, conta a história da separação da península coreana. No início, dentro desta instalação escura e num ambiente silencioso, é projetada no chão uma linha vermelha que indica a limitação de movimento dos visitantes.
Esta linha avança periodicamente, enquanto nas paredes surgem imagens da guerra e da separação das famílias.
A experiência encerra com o desaparecimento da linha vermelha e o aparecimento de uma natureza florescente na área desmilitarizada, transmitindo uma mensagem de esperança, paz e reconciliação.
No Camp Greaves, existe ainda o Museu da Comissão de Supervisão das Nações Neutras (NNSC, na sigla inglesa), que retrata a história e o processo de criação da Zona Desmilitarizada da Coreia (DMZ). A NNSC foi criada em 1953 para monitorizar o cumprimento do acordo de cessar-fogo entre a Coreia do Norte e a Coreia do Sul.
Dentro do museu, encontra-se uma fotografia da Ponte Sem Retorno, onde, após a guerra, os prisioneiros de guerra tinham de escolher onde queriam viver, sem nunca mais poderem regressar ao outro lado.

Na imagem, a Coreia do Norte (à esquerda), separada pelo rio Imjin, a cerca de 2 quilómetros de distância, é vista a partir do Observatório Odusan. Os visitantes conseguem observar a cidade mais de perto utilizando os telescópios.
O observatório, para além de ser um ponto turístico e histórico, é um espaço de reflexão sobre a paz e a reunificação, sendo o rio uma representação da linha invisível, mas muito real, que mantém famílias separadas há décadas.