Para compreender o Transtorno de Ansiedade Generalizada

“O TAG pode causar angústia e sofrimento, interferindo diretamente nas interações sociais, profissionais, familiares e afetivas” /Foto: IA

Emoções e sentimentos são aspetos da afetividade humana que, embora interligados, não são exatamente iguais. As emoções podem ser entendidas como respostas fisiológicas automáticas a estímulos internos ou externos, enquanto os sentimentos correspondem a experiências subjetivas e conscientes que refletem a interpretação pessoal dessas emoções. Estas são frequentemente influenciadas por experiências anteriores, ideias, valores e fatores socioculturais.

Com o avanço das neurociências, principalmente a partir da década de 1990, inúmeros estudos têm procurado compreender a importância da afetividade na experiência humana e na saúde mental, explorando, por exemplo, de que forma o medo e a ansiedade contribuíram para a preservação e adaptação das pessoas a ambientes de risco.

Por exemplo, o medo é uma emoção básica associada a uma resposta instintiva e automática a ameaças reais ou percebidas. O processo é mediado por estruturas cerebrais como a amígdala, responsável pela deteção de ameaças e pela ativação de respostas instintivas, e o hipotálamo, que coordena as reações fisiológicas, desencadeando respostas automáticas, como luta, fuga ou imobilização.

Assim, o medo, enquanto resposta a ameaças imediatas, estimula o sistema de defesa do corpo, preparando o indivíduo para reagir a situações de perigo, o que aumenta as suas chances de sobrevivência. A experiência do medo pode ser posteriormente interpretada – o que pode levar apenas alguns microssegundos – e transformada num sentimento consciente por meio da mediação de processos cognitivos no córtex cerebral.

Este envolvimento do córtex permite que as reações instintivas iniciais sejam avaliadas e contextualizadas, atribuindo significado e intensidade à experiência emocional com base em fatores como a memória, os valores, as crenças, o contexto sociocultural, os atores envolvidos, bem como a história de vida e as características de cada indivíduo.

A ansiedade, por sua vez, é uma combinação de emoções e processos mentais, além de estar orientada para o futuro. Trata-se de uma resposta emocional a possíveis ameaças, mediada por áreas do cérebro, como a já citada amígdala, responsável pela deteção de perigos, o hipocampo, ligado à memória associativa e à formação de recordações, e o córtex pré-frontal, que avalia riscos, planeia respostas e orienta a tomada de decisões.

Por estar voltada para a antecipação de potenciais ameaças, a ansiedade pode contribuir, por exemplo, para a preparação e adaptação a situações incertas, como uma avaliação, enfrentar desafios, prestar auxílio ou lidar com eventos inesperados ou potencialmente prejudiciais.

Contudo, a ansiedade torna-se problemática quando a sua intensidade, frequência ou impacto interferem negativamente na qualidade de vida e no desempenho cognitivo, emocional, fisiológico e comportamental das pessoas. Quando isso acontece, podemos estar a desenvolver algum tipo de Transtorno de Ansiedade, como, por exemplo, o Transtorno de Ansiedade Generalizada.

O que são os Transtornos de Ansiedade?

De acordo com os principais Manuais de Diagnóstico dos Transtornos Mentais (DSM-5-TR e CID-11), os Transtornos de Ansiedade são um conjunto de diferentes transtornos mentais que compartilham características de medo e ansiedade excessivas, duradouras e desproporcionais em resposta a ameaças reais ou percebidas. Esses medos e ansiedades vão além da preocupação que todos sentimos de vez em quando e interferem nas atividades quotidianas, como trabalho, estudos, relacionamentos e afetam tanto o bem-estar psicológico quanto a saúde física.

Quais são os tipos de Transtornos de Ansiedade?

Entre os principais tipos de Transtornos de Ansiedade estão: o Transtorno de Ansiedade Generalizada (TAG), o Transtorno de Ansiedade de Separação, o Transtorno do Pânico, o Transtorno de Ansiedade Social (ou Fobia Social), a Agorafobia, as Fobias Específicas (como medo de animais, insetos, altura, sangue e injeções, por exemplo), entre outros.

Quais são as principais diferenças entre os Transtornos de Ansiedade?

Os Transtornos de Ansiedade distinguem-se entre si pelo tipo de situações ou objetos que provocam medo (como o medo de socializar no caso da Ansiedade Social ou o medo de locais abertos na Agorafobia), pela duração e intensidade dos episódios de ansiedade, pelo conteúdo dos pensamentos e crenças associados aos sintomas, e pelos comportamentos de esquiva e evitação característicos de cada transtorno.

O que é o Transtorno de Ansiedade Generalizada (TAG)?

Como mencionado anteriormente, o Transtorno de Ansiedade Generalizada (TAG) integra o grupo dos Transtornos de Ansiedade. Caracteriza-se por uma ansiedade crónica e excessiva, com preocupações persistentes sobre diversas situações ou atividades quotidianas, como responsabilidades no trabalho, saúde, finanças, bem-estar da família, a opinião dos outros, acidentes e, até mesmo, a realização de tarefas domésticas ou a possibilidade de se atrasar para compromissos.

Quais as causas do Transtorno de Ansiedade Generalizada (TAG)?

O Transtorno de Ansiedade Generalizada pode ser causado por uma combinação de fatores biológicos, psicológicos e ambientais. Estes fatores podem variar de pessoa para pessoa, podendo ocorrer devido a alterações na química do cérebro ou no funcionamento dos neurotransmissores, a padrões de pensamentos disfuncionais que interferem na interpretação dos eventos, assim como ao stress e a experiências traumáticas.

Quais são os principais sintomas do Transtorno de Ansiedade Generalizada (TAG)?

No TAG, as preocupações variam frequentemente entre diferentes assuntos ou circunstâncias, sendo desproporcionais à probabilidade real ou ao impacto dos eventos antecipados. Essas preocupações ocorrem na maioria dos dias, durante pelo menos seis meses. A pessoa considera difícil controlar os seus pensamentos e preocupações. Para o diagnóstico, é necessário que o indivíduo apresente pelo menos três dos seguintes sintomas: inquietação, irritabilidade, fadiga, dificuldade de concentração ou sensação de “mente vazia”, tensão muscular e distúrbios do sono. O TAG pode causar angústia e sofrimento, interferindo diretamente nas interações sociais, profissionais, familiares e afetivas.

Como a cultura pode afetar a ansiedade?

Os padrões culturais e as normas sociais desempenham um papel importante na forma como nos percebemos a nós mesmos e lidamos com as nossas emoções. As expectativas culturais contribuem para moldar a nossa autoimagem, levando-nos muitas vezes a comparar-nos com ideais inalcançáveis ou a seguir regras limitantes. O processo de socialização, que se inicia na infância, faz com que estas normas culturais se tornem parte da nossa identidade. A pressão para cumprir esses padrões – de forma consciente e não-consciente – pode gerar sensações de inadequação, insegurança, frustração, ansiedade e medo. O desejo de aceitação e o receio da exclusão reforçam a conformidade com esses padrões, enquanto as instituições sociais exercem um controlo subtil, levando à naturalização de certas práticas, pensamentos, sentimentos e crenças que podem ser opressivos e disfuncionais, dificultando, assim, qualquer questionamento ou análise das dinâmicas de poder e controlo social envolvidos.

Como a internet pode afetar a ansiedade?

Os algoritmos são projetados para captar a nossa atenção e manter-nos conectados o máximo possível. Somos conduzidos pelo fluxo de conteúdos, que define o que veremos ou ouviremos a seguir. Há um constante bombardeio de informações, onde não é necessário refletir profundamente, apenas consumimos. Nesse ambiente, as redes sociais impõem padrões de beleza, saúde, produtividade, felicidade, sucesso e riqueza que, muitas vezes, são distantes e fantasiosos. Como resultado, lidamos com idealizações e expectativas distorcidas sobre as nossas próprias vidas. Além disso, a necessidade de estar constantemente conectado, de responder rapidamente a mensagens ou de nos atualizarmos sobre o que acontece gera um sentimento de urgência e sobrecarga mental, dificultando o descanso e a concentração, favorecendo, assim, o aumento da ansiedade.

Como uma sociedade patriarcal e hierarquizada pode afetar a ansiedade?

Numa sociedade patriarcal, com hierarquias rígidas e pouca mobilidade social, onde as desigualdades sociais são marcantes e os jovens e as mulheres encontram poucas oportunidades, os Transtornos de Ansiedade tendem a ser mais prevalentes devido à pressão constante para atender às expectativas sociais e à sensação de impotência perante a escassez de alternativas. A rigidez das normas de género e geracionais, juntamente com a desigualdade entre classes sociais, cria um ambiente de frustração e insegurança, especialmente para aqueles que sentem que não têm poder ou recursos para mudar a sua situação. Em Timor-Leste, por exemplo, as poucas oportunidades para jovens e mulheres, somada à falta de apoio ou conhecimento sobre saúde mental, contribuem para o aumento do stress, da preocupação excessiva com o futuro, do pensamento fatalista e do sentimento de impotência. Além disso, num contexto onde o diálogo sobre saúde mental é limitado ou estigmatizado, as pessoas podem ter dificuldades em reconhecer e lidar com os seus sintomas de ansiedade, o que agrava ainda mais a condição e impede a busca por ajuda adequada.

Como é feito o tratamento do Transtorno de Ansiedade Generalizada (TAG)?

O tratamento do Transtorno de Ansiedade Generalizada envolve, principalmente, psicoterapia e, em alguns casos, o uso de medicamentos ansiolíticos ou antidepressivos. Além disso, é importante adotar práticas que promovam o bem-estar, como procurar apoio social com amigos e familiares, praticar exercício físico, yoga e meditação, manter uma rotina regular de sono e cuidar da alimentação. Evitar substâncias como cafeína, nicotina, álcool, sal em excesso, alimentos picantes e fritos, que podem agravar os sintomas de ansiedade, também é benéfico. Manter-se organizado, focado no presente, limitar o tempo nas redes sociais e estabelecer uma agenda de tarefas simples são estratégias adicionais que ajudam a controlar a ansiedade. Contudo, é fundamental consultar um profissional especializado para identificar corretamente as causas e os sintomas, assim como desenvolver uma estratégia de tratamento personalizada e eficaz.

Alessandro Boarccaech é psicólogo, especialista em psicologia clínica, psicoterapeuta, semiótico e Ph.D. em antropologia.

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