Novo escândalo de assédio na UNTL: estudantes exigem expulsão definitiva de docente

Após a conferência de imprensa, os estudantes prosseguiram com discursos livres no recinto da Faculdade de Educação, alertando docentes e comunidade académica para o problema do assédio sexual / Foto: Diligente

A Universidade Nacional Timor Lorosa’e (UNTL) enfrenta mais um escândalo de alegado assédio sexual. Estudantes acusam um professor de Língua Portuguesa de enviar mensagens impróprias e ameaçar alunas com represálias académicas. A instituição suspendeu de imediato o docente, mas a Associação Académica Estudantil exige medidas mais firmes: “Quem abusa dos estudantes não pode continuar a ensinar.”

A Universidade Nacional Timor Lorosa´e (UNTL) volta a ser palco de um novo caso de assédio sexual envolvendo um docente e estudantes da Faculdade de Educação, Artes e Humanidades.  O caso terá acontecido no presente mês, quando o docente identificado pelas iniciais A. L. que leciona a disciplina de Língua Portuguesa, alegadamente enviou mensagens impróprias e usou o seu poder académico para ameaçar e pressionar as estudantes.

Segundo as estudantes, o professor enviava mensagens abusivas e convites fora de contexto através do WhatsApp, chegando a afirmar que quem não aceitasse sair com ele poderia reprovar na disciplina.

Na conferência de imprensa, realizada esta terça-feira (28/10), no Liceu da UNTL, o estudante Carlito Soares, da Associação Académica Estudantil (AAE), relatou que as vítimas começaram a sentir medo de frequentar as aulas. “As nossas colegas já não se sentiam seguras. Por isso, recorreram à Associação para denunciar”, explicou.

Perante as denúncias, o decano da Faculdade suspendeu de imediato o professor. Mas os estudantes consideram que tal medida não basta. “Enquanto este predador sexual mantiver qualquer ligação à universidade, os casos vão continuar”, afirmou Carlito.

A AAE exige o afastamento definitivo do docente de todas as instituições públicas e privadas. “Quem pratica assédio não tem perfil moral para continuar na profissão de educador. O papel do professor é ensinar, não abusar dos estudantes”, sublinhou.

Segundo a Associação, cinco alunas apresentaram formalmente queixa e são reconhecidas como vítimas diretas. “Em quase todas as turmas ele fazia comentários e enviava mensagens. Felizmente, algumas tiveram coragem de falar”, acrescentou Carlito.

Os estudantes alertaram ainda que, se o docente voltar a dar aulas na Faculdade de Educação, estão dispostos a bloquear as aulas em protesto. “A universidade deve agir com firmeza. Quem pratica assédio tem de sair, sem exceções”, declarou Carlito.

Por enquanto, a AAE não apresentou queixa formal às autoridades judiciais. A denúncia pública tem como objetivo pressionar a direção universitária a agir rapidamente.

O estudante Miguel Arcanjo Pinto destacou que “o campus deve ser um espaço livre para aprender, sem medo nem repressão”.

Segundo relatou, uma das vítimas chegou a ser forçada a abraçar o professor no final de uma aula. “O problema é que ele usava o poder que tinha sobre as notas para ameaçar as estudantes. Ignorava os trabalhos e falava de assuntos pessoais”, denunciou.

Já a estudante Felicidade Oliveira alertou: “O espaço académico não pode transformar-se num local de prostituição.”

A AAE recomendou às Associações das Faculdades de Agricultura e de Medicina e Ciências da Saúde — onde o docente também leciona — que exijam igualmente o seu afastamento.

Felicidade Oliveira apelou ainda à reitoria e à Pró-Reitoria dos Assuntos da Provedoria e Aconselhamento (PRAPA) para reforçarem a sensibilização não só junto dos estudantes, mas também dos docentes. “É necessário formar professores que possam identificar e corrigir comportamentos predatórios. Os docentes devem ser exemplos de integridade e profissionalismo, nunca agressores.

Este não é um caso isolado. Estudantes das Faculdades de Ciências Sociais e de Medicina e Ciências da Saúde da UNTL já tinham denunciado episódios semelhantes. Situações parecidas foram também reportadas noutras instituições de ensino superior, como a Universidade da Díli (UNDIL) e a Universidade da Paz (UNPAZ).

Decano confirma suspensão de docente acusado de assédio e ministro promete nova lei para prevenir abusos

O decano da Faculdade de Educação, Artes e Humanidades confirmou a suspensão imediata do docente A.L., acusado de assédio sexual a alunas. Enquanto a UNTL tenta lidar com o caso, o ministro do Ensino Superior anunciou a preparação de um decreto-lei para regular o comportamento ético de professores e estudantes, garantindo maior proteção às vítimas.

Em declarações ao Diligente, o decano Teodoro Soares revelou que recebeu, na semana passada, uma queixa formal da Associação de Estudantes do Departamento de Ensino da Física sobre indícios de assédio sexual cometidos por A.L.

“No dia 22 de outubro, convoquei uma reunião com docentes e estudantes. Após ouvir as partes, decidimos suspender o professor no dia 24, de acordo com a exigência dos alunos. A carta de suspensão foi oficialmente emitida”, afirmou.

Segundo o decano, o docente não era permanente, mas sim colaborador a tempo parcial. “Ele não tinha contrato assinado com a Faculdade de Educação. Foi convidado apenas para apoiar temporariamente devido à falta de professores. Soube que era ex-aluno do Departamento de Língua Portuguesa. Nunca aprovei pagamento em seu nome nem encontrei o seu registo na administração”, explicou.

Teodoro acrescentou que não tem confirmação se o mesmo docente está contratado noutras faculdades, como Agricultura ou Medicina e Ciências da Saúde, mas pediu a todas que façam verificações internas.

O decano assegurou que o professor já foi notificado da decisão e recebeu ordens claras para não contactar estudantes nem exercer qualquer atividade académica. “Foi determinado que se afaste do campus e que não tenha qualquer relação com os alunos. Mostrou-se insatisfeito, mas pode apresentar recurso se quiser”, disse.

Teodoro apelou ainda a todos os estudantes para denunciarem situações semelhantes. “Não toleramos ameaças nem atitudes que criem insegurança. A Faculdade de Educação forma futuros professores, e a relação entre docente e estudante deve ser de apoio, nunca de abuso.”

O Diligente contactou o docente A.L., que preferiu não se pronunciar sobre as acusações. Alegou estar ainda a reunir informações e prometeu prestar esclarecimentos públicos posteriormente.

Recorde-se que o Ministro do Ensino Superior, Ciência e Cultura, José Honório, lamentou, depois do Conselho de Ministros da semana passada, a reincidência de casos de assédio sexual nas universidades timorenses e anunciou que o Governo está a preparar um decreto-lei para reforçar a prevenção.

“Estamos a preparar um decreto-lei para que docentes e estudantes conheçam claramente os seus papéis e limites. Já temos o esboço, mas ainda não foi discutido, porque o Governo está concentrado no debate do Orçamento Geral do Estado”, explicou.

O documento será trabalhado em conjunto com o Ministério da Justiça, a Secretaria de Estado da Igualdade e organizações parceiras como a JU,S e a UN Women. “O objetivo é prevenir situações em que professores usem palavras ou comportamentos inapropriados. Peço aos docentes que atuem sempre com ética, sensibilidade e respeito”, frisou.

José Honório lembrou que os docentes devem orientar monografias e trabalhos dentro das faculdades, e não em espaços privados como restaurantes. “A universidade é um espaço de aprendizagem, não de intimidação”, destacou.

O ministro acrescentou que recentemente surgiu outro caso semelhante noutra universidade e pediu vigilância constante às reitorias. “Peço que mantenham encontros regulares com os docentes para promover reflexão e exame de consciência. Devemos garantir que o ambiente académico seja seguro e digno”, disse.

O governante concluiu com um apelo direto à proteção das estudantes: “Se os professores dizem que têm dignidade, as alunas também a têm. Sem mulheres, não há futuro. Devemos respeitar as nossas estudantes — elas são o futuro do país.”

Nos últimos meses, multiplicaram-se denúncias de assédio sexual em várias universidades timorenses — entre elas a UNTL, a UNDIL e outras instituições. Estes casos representam realmente algo novo ou estamos apenas a ver expostas práticas que já existiam há anos?

Especialistas e entidades como a Provedoria dos Direitos Humanos e Justiça (PDHJ) lembram que o assédio sexual tende a prosperar em contextos onde há relações de autoridade e mecanismos internos frágeis. Se não existe ainda um tipo penal específico para este crime, como garantir regras claras, proteção efetiva para quem denuncia e respostas rápidas das instituições?

Será que o que mudou não foi a ocorrência dos abusos, mas sim a coragem de os denunciar? Cada voz que se levanta encoraja outras a fazer o mesmo. Poderá este efeito em cadeia ser o passo decisivo para quebrar o silêncio e acabar com a impunidade?

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