Milhares de pessoas agora desfrutam do bem essencial e já não precisam de caminhar grandes distâncias para ter acesso a água potável.
O suco Sagadate situa-se no município de Baucau e tem uma população de 3.414 habitantes, distribuídos por 11 aldeias, segundo o censo de 2022. Localizado numa zona montanhosa, a comunidade é muito dependente da agricultura e tem sofrido, ao longo dos anos, com a escassez de recursos hídricos. Contudo, em 2023, com a implementação do sistema da circulação de água pelo grupo Klibur Estudante Juventude do Suco Sagadate (KEJUSS), as nascentes foram revitalizadas e nove aldeias finalmente conseguiram ter acesso regular, através de torneiras, ao bem essencial.
Para isso, o coletivo conseguiu tirar proveito das condições geográficas para reaproveitar a água das chuvas. Numa primeira fase, o coletivo identificou as nascentes secas nas aldeias. Posteriormente, escavaram buracos a 100 metros de cada uma delas, com o intuito de acumular e conservar a chuva. Após um ano, com o líquido devidamente infiltrado no solo, as nascentes voltaram a ter água.
O grupo também implementou um sistema de represa chamado “travasaun kadalak” (expressão em tétum). Essa técnica visa bloquear a água nos ribeiros, forçando-a a penetrar na terra e, dessa forma, a alimentar as nascentes. O procedimento é bem simples: acumulam-se pedras, em camadas, no leito do ribeiro, para interromper o fluxo.
Existe ainda outra prática, conhecida como “terraço” (ou socalco), que consiste na divisão do terreno em plataformas planas, dispostas em forma de “degraus”. Isso permite o escoamento superficial da água das chuvas, que, pouco a pouco, perdem sua força, causando menos impacto sobre o solo (removendo menos sedimentos) – e sendo absorvida pela terra mais facilmente.
O objetivo principal dessas estruturas é transformar áreas íngremes e difíceis de cultivar em espaços utilizáveis para a agricultura.
Celestino Gusmão, um dos fundadores do grupo, mostrou-se feliz por ver que os esforços conjuntos libertaram as comunidades de um problema primário, a escassez de água, garantindo ainda a sustentabilidade do ambiente.
O jovem, que também é pesquisador na Organização Não Governamental (ONG) La’o Hamutuk, salientou que o KEJUSS tem planos para criar viveiros no centro de Sagadate, além de reabilitar as lagoas já existentes e criar novas, tudo através de sistemas de captação de água das chuvas.
Além disso, o KEJUSS almeja construir novos terraços, plantar mais árvores e produzir adubo orgânico. “Para que tudo isso seja possível, é necessário o envolvimento da população, uma vez que todas as pessoas são beneficiárias das iniciativas”, sublinhou.
Em conversa com o Diligente, o chefe da aldeia Selegua, Aleixo Belo Pereira, partilhou a sua impressão sobre a mudança “da insuficiência para a abundância”. A localidade, segundo o líder, estava há três anos a lidar com a seca. Durante esse período, informou, cerca de 300 pessoas precisavam de caminhar 3 km para ir buscar água a outra região.
“Temos duas nascentes que estiveram secas. Agora, com a ajuda do grupo, voltamos a ter água”, contou Aleixo Belo Pereira.
Já Domingos Gusmão Pereira, de 49 anos, da aldeia de Onebu’u, no mesmo suco, afirmou que, durante 30 anos, desde a ocupação indonésia, os habitantes tinham de percorrer 5 km para conseguir água. Em 2023, com o trabalho do KEJUSS e a implementação do sistema, conseguiram revitalizar três nascentes.
“Agora já não precisamos de andar para ter água, só precisamos ligar uma torneira que leva água das nascentes à nossa casa”, destacou o morador.
História do KEJUSS e a ideia do sistema
O KEJUSS foi fundado em 2014 com a missão de reunir jovens para discutir uma variedade de temas e contribuir para o desenvolvimento do suco de Sagadate. A sede do grupo está localizada no terminal de Becora, em Díli, com um centro operacional no próprio suco de Sagadate.
Alguns membros do KEJUSS tiveram formações na ONG Permacultura Timor-Leste (PERMATIL), fundada em 2000 pelo ativista Ego Lemos. A PERMATIL atua, essencialmente, em três áreas: na formação de jovens (atividades de aprendizagem ligadas à gestão da água, além de noções de agricultura, aquacultura e sistemas agroflorestais), no programa hortas escolares (cultivo de vegetais, compostagem, controlo de pragas naturais, utilização de sementes) e na gestão de recursos hídricos e naturais (recolha de águas pluviais, através da construção de lagos ou valas, que armazenam água, recarregam aquíferos e regeneram nascentes).
Inspirados pela experiência na PERMATIL, membros do KEJUSS tiveram a ideia de organizar e reunir jovens do suco Sagadate, para continuar a transmitir o que aprenderam no coletivo.