Hoje, 16 de outubro, Timor-Leste celebra o Dia Nacional da Liberdade de Imprensa, um tributo aos cinco jornalistas mortos em Balibó, em 1975. Esta data, que deveria celebrar o direito de informar e de ser informado, é marcada por uma série de episódios que revelam a crescente fragilidade da liberdade de imprensa no país. Em vez de se comemorar um ambiente de imprensa livre e seguro, assistimos a um preocupante aumento de ameaças, intimidações e abusos contra jornalistas, muitas vezes protagonizados por figuras que deveriam ser defensoras da democracia.
O próprio presidente do Conselho de Imprensa, Otélio Ote, em entrevista ao Diligente em outubro do ano passado, mencionou que, embora Timor-Leste ocupasse o 10.º lugar (agora desceu para o 20.º) no ranking da liberdade de imprensa, muitos jornalistas enfrentam ameaças de morte e discurso de ódio, especialmente nas redes sociais, quando tratam de temas sensíveis. O entrevistado chegou mesmo a questionar se há realmente liberdade de imprensa no país, já que os jornalistas se limitam a cobrir agendas institucionais e não se sentem livres para fazer um jornalismo mais investigativo.
A verdade é que a liberdade de imprensa raramente é posta à prova em Timor-Leste, pois os jornalistas evitam abordar temas que envolvam grandes instituições ou figuras influentes, tal como confirma um questionário realizado pelo Diligente a 48 jornalistas timorenses. Aproximadamente 44% dos jornalistas dizem ter receio de abordar temas sensíveis, como questões relacionadas com a Igreja.
Um exemplo claro disso foi o caso de Dom Ximenes Belo, ex-bispo de Díli, sancionado pelo Vaticano depois de alegações de que tinha abusado sexualmente de menores em Timor-Leste, na década de 90. Embora o assunto tenha sido amplamente noticiado por meios internacionais, a maior parte da imprensa timorense optou por não reportar o caso, evidenciando uma autocensura generalizada. Apenas a Lusa escreveu sobre o assunto, o que resultou em ataques xenófobos e intimidações contra o jornalista português.
Outro episódio que comprova que o receio dos jornalistas em escreverem sobre a Igreja Católica não é infundado, aconteceu no ano passado, quando o Diligente foi alvo de ameaças, depois de expor casos de maus-tratos no Seminário Menor Nossa Senhora de Fátima. A equipa foi atacada verbalmente nas redes sociais, com insultos que incluíram maldições proferidas por figuras religiosas. Um padre chegou a desejar a morte de um dos nossos jornalistas, afirmando que “não duraria muito tempo neste mundo”. Este tipo de intimidação não é apenas uma violação da liberdade de imprensa, mas também um reflexo de como algumas instituições se acham intocáveis e prontas a retaliar quem ousa questioná-las. Avaliar a autocensura é difícil, mas o problema é agravado pela recusa das instituições em reconhecer o papel dos jornalistas e em aceitar que os problemas sejam expostos. Quando os jornalistas ousam abordar temas sensíveis, os resultados estão à vista.
Na mesma altura, também a Hatutan foi notificada pelo Ministério Público após ter publicado uma notícia sobre o Procurador-Geral de Timor-Leste, Alfonso Lopes, e o seu assessor jurídico, Óscar Tavares, que terão alegadamente utilizado de forma indevida fundos públicos para realizar uma viagem privada a Portugal. A notificação foi vista como uma tentativa flagrante de intimidação à liberdade de imprensa.
No entanto, as agressões não se limitam ao ambiente virtual e a notificações. Em setembro deste ano, durante a cobertura de uma ação de despejo por parte da SEATOU em Díli, a jornalista Antónia Martins, do Diligente, e Suzana Cardoso, do Media One Timor, foram proibidas de gravar em locais públicos pela Polícia Nacional de Timor-Leste (PNTL) e pela Secretaria de Estado dos Assuntos da Toponímia e Organização Urbana (SEATOU), que forçaram a jornalista Suzana Cardoso a apagar uma transmissão ao vivo, ameaçando destruir o seu telemóvel caso não eliminasse o vídeo.
A jornalista do Diligente chegou mesmo a ser detida. Apesar de se identificar como jornalista, foi levada por elementos da Polícia Nacional de Timor-Leste (PNTL) para a esquadra, sob suspeita de usurpação de identidade. Detenções como esta demonstram um padrão de abuso de poder que pretende silenciar a imprensa e intimidar os profissionais que não cedem a pressões.
Outro exemplo foi o do Secretário de Estado para a Comunicação Social, Expedito Ximenes, que interferiu diretamente numa redação para alterar uma notícia crítica sobre o primeiro-ministro Xanana Gusmão, numa clara intervenção de censura.
O Chefe do Estado-Maior-General das FALINTIL-Forças de Defesa de Timor-Leste (F-FDTL), o Tenente-General Falur Rate Laek, insultou abertamente um grupo de jornalistas, referindo-se a eles como “magros, pretos, baixinhos”, numa tentativa de ridicularizar e desvalorizar o trabalho jornalístico. Comentários como estes, vindos de uma figura de autoridade militar, fomentam uma cultura de desrespeito pela imprensa e desencorajam o pensamento crítico.
Xanana Gusmão, o próprio primeiro-ministro, protagonizou episódios graves de desrespeito para com o trabalho jornalístico. Durante uma conferência de imprensa, o primeiro-ministro reagiu de forma hostil quando uma jornalista o questionou sobre a nomeação do novo Comissário da Comissão Anticorrupção (CAC). Visivelmente irritado, Xanana interrompeu a jornalista com gritos de “nonok, nonok” (‘cala-te, cala-te’ em tétum), impedindo que esta continuasse a sua pergunta. O episódio foi registado em vídeo e rapidamente se tornou viral nas redes sociais, gerando uma onda de críticas à sua postura.
Além disso, em dezembro do ano passado, a jornalista Remisia Boavida foi vítima de um gesto ainda mais condenável, ao receber uma palmada por parte de Xanana Gusmão enquanto gravava uma peça em Taibesi. Este ato foi amplamente criticado por organizações como a Rede Feto e o Movimento Rosas Mean, que denunciaram a perpetuação do machismo e do patriarcado em Timor-Leste, onde as mulheres, especialmente jornalistas, continuam a ser tratadas de forma desrespeitosa.
Estes incidentes não só refletem um preocupante desrespeito pelos direitos das mulheres, como também comprometem seriamente a liberdade de imprensa, fundamental para qualquer democracia. O comportamento do primeiro-ministro e de outras figuras públicas demonstra uma inaceitável tentativa de silenciar e intimidar jornalistas que cumprem o seu dever de questionar e informar a população.
No entanto, as instituições públicas e privadas também condicionam o trabalho dos jornalistas. A burocracia excessiva e a recusa sistemática em fornecer informações públicas são barreiras que dificultam o trabalho da imprensa. É paradoxal que, num país que ocupa o 20.º lugar no ranking da liberdade de imprensa, os jornalistas ainda sejam obrigados a submeter pedidos formais para aceder a dados que deviam ser públicos, e muitas vezes esses pedidos são ignorados ou recusados. Esta realidade contrasta fortemente com a classificação “relativamente boa” atribuída a Timor-Leste.
A liberdade de imprensa e o respeito pelos direitos humanos não podem ser desvalorizados, independentemente de quem cometa as infrações. É irónico e trágico que Timor-Leste, um país cuja libertação foi em parte conseguida graças ao trabalho corajoso de jornalistas, agora reprima os seus próprios profissionais de comunicação. Recorde-se que o jornalista Max Stahl, que filmou o Massacre de Santa Cruz, ajudou a expor ao mundo as barbaridades da ocupação indonésia. Hoje, são as figuras timorenses, que outrora lutaram pela liberdade, que ameaçam silenciar os jornalistas que cumprem o seu dever de informar.
Neste Dia Nacional da Liberdade de Imprensa, o Diligente apela a todas as autoridades timorenses para que protejam o trabalho dos jornalistas e garantam um ambiente em que a imprensa possa operar de forma livre e segura. Sem liberdade de imprensa, não há verdadeira democracia. E sem respeito pelo trabalho jornalístico, o direito à verdade e à justiça torna-se cada vez mais frágil. O jornalismo timorense não pode ser intimidado ou silenciado.
Mesmo sendo pressionado, ameaçado e deliberadamente privado de informação apenas por ser o Diligente — com instituições a negarem dados e a ser excluído de eventos da Secretaria de Estado da Comunicação Social e de reconhecimentos do Governo —, o nosso órgão continuará a trabalhar com responsabilidade social, investigando e reportando os factos.
Acreditamos que o jornalismo tem o poder de mudar a sociedade, e é nossa obrigação garantir que as vozes mais vulneráveis sejam ouvidas, que os abusos de poder sejam expostos e que os direitos humanos sejam defendidos. Este é o verdadeiro espírito da liberdade de imprensa, um direito fundamental que não pode ser negociado.
Parabens equipa do Diligente.
A liberdade de imprensa esta revestida de verniz e com o calor torrido de TL, estala muitas vezes.
A liberdade de imprensa cagueja.
A liberdade de imprensa e uma curtina de fumo.
A educacao anda aos solucos a saude esta morribunda e a liberdade de imprensa nao pode pegar no megafone ou fazer soar as trombetas.
Oh meu querido Povo de Timor, a Luta Continua!
Grande mulher esta jornalista! Parabéns pelo vosso trabalho, Diligente. Um óasis num deserto.
No tempo portugues tinhamos a Pide e depois a DGS. Havia a censura, tinhamos de por a tabela,
olhar constantemente para tras e nao confiar em muita gente.
No tempo indonesio era a famosa Intel. E havia muitos bufos.
Hoje, mudou apenas quem faz esse papel. Liberdade de expressao propriamente dita nao existe. Em paises desenvolvidos com educacao existe um pouco mais de liberdade de expressao.
Na minha mais modesta opiniao o nosso querido TL nunca la chegara.
Quem nao deve nao teme!