Com um sistema de irrigação automático controlado por telemóvel, Almerindo Fernandes transforma a horticultura em Lautém, criando emprego e mostrando que a modernização do campo é o caminho para o futuro de Timor-Leste.
Almerindo Fernandes dos Santos Silva, jovem empreendedor de Lautém, está a mudar a forma como a horticultura é praticada em Timor-Leste. Recorrendo a tecnologia avançada e a ideias inovadoras, este agricultor e empresário está a transformar o setor agrícola e a criar impacto social na sua comunidade.
Licenciado em Construção Civil pela Universidade Nacional Timor Lorosa’e (UNTL) em 2016, Almerindo trabalhou durante sete anos na Organização Internacional do Trabalho (OIT), no programa Estradas Rurais para o Desenvolvimento. Apesar de ter um emprego estável, sonhava investir em algo que pudesse garantir o seu sustento a longo prazo. Quando o contrato terminou, decidiu arriscar na horticultura, fundando a sua empresa, Kewe-Ara, em 2017.
Investimento inicial e desafios
Com apenas 500 dólares americanos, Almerindo comprou uma bomba de água, tubos e mangueiras e pagou salários a trabalhadores para limpar ervas daninhas e operar tratores. A ideia era simples: produzir hortaliças para abastecer a crescente procura local.
Humilde e visionário, escolheu a horticultura porque percebeu que as pessoas precisam de alimentos diariamente, o que torna a agricultura um negócio sustentável. “Quando as pessoas comem, os agricultores ganham dinheiro. Este negócio está diretamente ligado à vida das pessoas e garante rendimento”, explicou.
Os desafios foram muitos. Inicialmente, a família não apoiava a sua decisão de voltar ao campo. “A ideia de que jovens licenciados só devem trabalhar num escritório está muito enraizada. Mas, em muitos países, os agricultores são os mais ricos porque fornecem alimentos às cidades”, disse. Além disso, enfrentou preconceitos de que a horticultura não era rentável.
“No começo, andava a pé, mas depois que o campo começou a dar resultados, consegui comprar um carro. Isso significa que trabalhar no campo pode ser tão produtivo quanto trabalhar num escritório. O importante é não trabalhar no campo como os nossos avôs faziam, de maneira rudimentar, mas sim modernizar e calcular a quantidade de sementes a serem plantadas e quanto lucro isso pode gerar”, afirmou.
Apesar das dificuldades, Almerindo permaneceu firme. Com resultados concretos, conseguiu convencer a família e expandir o negócio.
Outro desafio enfrentado por Almerindo é a manutenção da bomba de água que transporta o recurso hídrico da ribeira para o reservatório. “Sem esta bomba, tudo fica mais difícil”, confessou. Por isso, tem de incluir os custos de manutenção nos cálculos de produção para garantir que o equipamento se mantenha funcional e evite paralisações.
Apesar das dificuldades, o jovem agricultor não perde o foco. Reconhece que o sistema de irrigação ainda não cobre toda a área da sua propriedade devido à sua grande dimensão. “Sei que ainda não conseguimos irrigar todo o campo. Podemos tentar alargar a cobertura, mas para isso precisamos de mais investimento”, explicou, mostrando a sua determinação em continuar a melhorar.
Para Almerindo, o sucesso de um empreendedor depende da capacidade de enfrentar os desafios com coragem e inteligência. “Não podemos depender excessivamente do apoio do governo ou de outras entidades. Se o subsídio não vier, a empresa pode falir, e já vi isso acontecer a muitos. Temos de ser resilientes e gerir bem os nossos recursos”, destacou.
Mesmo com as limitações, Almerindo já colhe os frutos do seu esforço. A cada três meses, consegue gerar cerca de 500 dólares americanos com a venda das hortaliças, valor que reinveste no crescimento do negócio. “Prefiro investir na agricultura do que gastar em luxos desnecessários. Muitas vezes, as pessoas preocupam-se mais com o nosso estilo de vida do que com o que estamos a construir. Mas os resultados, com o tempo, irão falar por nós”, afirmou, com um sorriso confiante.
Este dinheiro não serve apenas para expandir o negócio. Almerindo utiliza também parte dos lucros para sustentar a sua família e financiar os estudos dos seus irmãos, garantindo um futuro melhor para todos. Ao explicar a sua estratégia de gestão, usou uma metáfora cheia de sabedoria: “É como criar uma galinha. Deixamo-la chocar os ovos e criar pintinhos para garantir o sustento no futuro. Não podemos matar a galinha que ainda põe ovos, porque isso seria destruir aquilo que construímos.”

Tecnologia para modernizar a agricultura
Almerindo e o seu irmão, estudante de eletrónica na Indonésia, desenvolveram um sistema de irrigação automática controlado por telemóvel. Este sistema, conectado ao Google Assistente e ao dispositivo Water Bot, permite que as hortaliças sejam regadas remotamente, desde que haja acesso à internet.
A ideia de irrigação automática surgiu do seu irmão, cujo tema da tese incidiu na criação do sistema automático de irrigação. Almerindo, com a sua experiência em sistemas de irrigação, ajudou-o a desenvolver o sistema.
Para evitar que os dispositivos, que são caros e sensíveis, sejam roubados, Almerindo decidiu tomar precauções. “Só usamos os aparelhos, quando estamos no terreno. Se não tivermos cuidado, os equipamentos podem ser roubados, e isso representaria perda de dinheiro, para além de todo o esforço de baixar e instalar a aplicação”, explicou.
“Posso controlar a irrigação com comandos de voz ou remotamente pelo telemóvel, o que poupa tempo e esforço. A internet é a chave para tudo funcionar”, explicou. A tecnologia, apesar de já ser utilizada em muitos países, foi adaptada às condições locais.
A ideia valeu-lhe o primeiro lugar na competição de negócios inovadores organizada pelo Ministério do Comércio e Indústria em 2023. O prémio de 2.500 dólares foi complementado com 7.000 dólares do governo, permitindo-lhe expandir a produção e melhorar a infraestrutura.
“Ganhei porque apresentei uma ideia diferente. A minha empresa também tem um impacto social, já que oferece trabalho à comunidade e estágios aos estudantes. Além disso, garantimos o mercado e temos uma existência consolidada desde 2017, o que mostra a consistência ao longo do tempo”, defende.
O dinheiro foi reinvestido na propriedade, na aquisição de veículos para transportar as hortaliças para mercados tradicionais, e na melhoria do sistema de irrigação. “O sistema agora está a funcionar bem, então não estamos preocupados com isso. A nossa principal preocupação é com o solo, que determina a produtividade. Se o solo produzir bem, podemos ganhar dinheiro, caso contrário, é preciso ter paciência”, explicou.
Produção diversificada e impacto local
Almerindo cultiva hortaliças como alface, espinafre e mostarda durante a estação seca, e tomate, beringela e pimentão durante a época das chuvas. Atualmente, é o principal fornecedor do programa de merenda escolar para escolas em Lautém. Além disso, criou empregos para mulheres da comunidade e oferece estágios a jovens estudantes.
No entanto, o agricultor ainda enfrenta limitações na capacidade de produção. “Recebemos pedidos de entidades como as F-FDTL e o hospital de Lospalos, mas recusámos porque ainda não conseguimos garantir regularidade em grandes quantidades”, lamentou.
Outro desafio é a manutenção dos equipamentos e o impacto das alterações climáticas. “O calor extremo afeta as hortaliças, e durante a seca o volume de água nas ribeiras reduz significativamente. Ainda assim, nenhum desafio me faz desistir”, afirmou.
Planos para o futuro
Almerindo planeia especializar-se numa única variedade de produto agrícola para aumentar a produção e competir no mercado. “Queremos escolher uma variedade que se torne um ícone e que seja adaptável às condições locais, permitindo-nos produzir em grande escala”, explicou.
Além disso, deseja transformar a sua propriedade num centro de formação agrícola para jovens. “Muitos jovens evitam o campo porque pensam que não é digno. Queremos mudar essa mentalidade, mostrando que a agricultura moderna pode ser lucrativa e oferecer muitas oportunidades de emprego”, disse.
O jovem deixa um conselho: “Os terrenos abandonados podem ser transformados em fonte de rendimento. Não tenham medo de começar. Mesmo com pouco, é possível crescer. O importante é investir e acreditar.”
“Sou uma pessoa que acredita em factos, não em discursos”, continuou. Para ilustrar o seu ponto de vista, contou uma história da sua própria experiência. “Quando plantei feijão-de-corda em 60 canteiros, o meu pai disse-me que ninguém ia comprar. Eu respondi calmamente que era preciso esperar. Quando chegou a época da colheita, as pessoas compraram tudo rapidamente. Naquele momento, ele disse-me que eu devia ter plantado feijão em grande escala desde o início”, recordou com um sorriso.
Almerindo não vê os desafios como obstáculos, mas como oportunidades para inovar. “A agricultura, quando bem planeada e modernizada, pode ser tão valiosa quanto qualquer profissão. O importante é olhar para o futuro e não desistir”, concluiu.